O volume embarcado de soja e milho pelo Brasil no primeiro semestre de 2023 foi o maior da história, recorde que deve ser confirmado também quando terminar o ano, estima a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec).
Em entrevista ao AgFeed, o diretor geral da entidade, Sérgio Mendes, alertou, no entanto, que alguns temas começam a preocupar o setor e o principal deles é o atraso que tende a crescer na emissão dos certificados fitossanitários para a exportação dos cereais nos portos.
"Processos que deveriam ser feitos em 24 horas, em períodos de maior demanda, chegaram a ter atraso de 3 dias e temos relatos de empresas que demoraram até 10 dias para conseguir o certificado, em safras anteriores”, afirmou Mendes.
O diretor da Anec diz que encaminhou uma carta ao Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) pedindo que, na próxima contratação de fiscais agropecuários, uma parte das vagas seja reservada ao setor que emite os certificados de cargas vegetais, como soja, milho, trigo e algodão.
"Estamos tentando também um encontro presencial com o ministro Carlos Fávaro, para explicar a importância deste tema e o impacto financeiro para as empresas e para o país", disse.
Segundo ele, na última vez que o Mapa contratou fiscais nenhum foi alocado na área vegetal, todos foram direcionados aos controles de produtos de origem animal.
Mendes acredita que o problema poderá voltar – e de forma mais grave – especialmente no porto de Santos devido à maior concentração esperada de soja e milho este ano e também ao aumento dos embarques de algodão.
Uma estimativa feita pela Anec, com base na média das exportações diárias de soja, indica que, no caso de um atraso de 10 dias na concessão do certificado fitossanitário, o valor que deixa de ser recebido pelo exportador é de cerca de US$ 1,46 bilhão, considerando as cotações atuais da oleaginosa.
Mendes explica que o exportador somente recebe o valor pago pela soja após a entrega do certificado ao comprador, o que gera “um desencaixe fenomenal”, quer dizer, a receita em determinado momento chegará na empresa, mas enquanto isso não ocorre, ela precisa cobrir com o próprio caixa.
No documento que foi enviado ao Mapa, a Anec também alerta para problemas no porto de Itacoatiara, no Amazonas.
“Lá os fiscais mais próximos ficam a 300km de distância de estrada de terra do porto, com isso há atrasos reais não apenas na emissão do documento, mas também na saída do navio, que fica esperando a finalização dos processos", afirmou Mendes.
O AgFeed procurou o Ministério da Agricultura para falar sobre o tema mas não teve reposta até a publicação desta reportagem.
Recordes garantidos
Apesar dos entraves, o Brasil deverá alcançar um volume recorde de 99 milhões de toneladas de soja exportada em 2023, apontam as estimativas da Anec, comparado com um embarque de 77 milhões de toneladas no ano passado.
O primeiro semestre já foi o melhor da história, com 65,3 milhões de toneladas embarcadas, 10 milhões a mais que o mesmo período do ano passado. O melhor primeiro semestre registrado até hoje havia sido em 2020, com 61,7 milhões de toneladas.
"Os embarques este ano tiveram um atraso de cerca de dois meses, mas, apesar das dificuldades logísticas, pela primeira vez teremos recorde tanto na soja quanto no milho também neste segundo semestre", destacou Sérgio Mendes.
O diretor da Anec não acredita que o "gargalo logístico” – falta de armazéns e limite nos portos – possa atrapalhar este resultado.
“O risco que temos é o clima. Se chover muito, o que costuma paralisar os embarques nos portos, aí sim poderemos ver números diferentes”, ponderou.
Para o milho, a previsão é fechar o ano em 53 milhões de toneladas, também recorde e acima das 44,7 milhões de toneladas embarcadas em 2022.
De janeiro a junho, foram exportadas 9,5 milhões de toneladas de milho, acima das 6,4 milhões de toneladas embarcadas no mesmo período do ano anterior.
O principal motivo do aumento foi a abertura do mercado chinês que desde o último trimestre de 2022 fez um acordo com o Brasil e passou a comprar o cereal.
Em julho, a Anec prevê embarques históricos tanto para a soja quanto para o milho, devido a este atraso na janela de embarques.
Já no trigo, a exportação este ano poderá fechar abaixo das mais de 3 milhões de toneladas embarcadas em 2022, em função de uma maior demanda interna.
Para 2024, Sérgio Mendes admite que não será possível manter os mesmos níveis de crescimento. “Se repetirmos os 99 milhões de toneladas na soja, será ótimo", afirmou.
A explicação seria a dificuldade de repetir o ritmo de crescimento da produção brasileira e um descasamento em relação à demanda mundial, embora, na visão da Anec, os chineses seguirão comprando cerca de 72% da soja que o Brasil exporta.