O fogo que consumiu parte do pavilhão da Blue Zone, a área onde se concentram as negociações oficiais dao COP 30, em Belém, parece ter queimado também as pontes que poderiam levar a um consenso em torno de avanços na agenda de implementação de medidas para redução de emissões e contenção das mudanças climáticas.

Interrompidas por conta do incêndio na tarde da quinta-feira, as conversas foram retomadas na manhã desta sexta, 21 de novembro, aquele que, em tese, seria o dia final da conferência. Mas então, a quebra do ritmo fez com que as diferenças se sobrepusessem e as possibilidades de a conferência ter um documento consensual dentro do prazo passaram a ser mínimas.

Elogiado por sua condução das negociações até então, o embaixador André Corrêa do Lago, CEO da COP, teve um dia de maior tensão. Logo no início da manhã, um rascunho do documento final da conferência, amarrado por ele, circulou pela Blue Zone indicando uma virada quase que previsível: não constava nele o “mapa do caminho” para acelerar a redução do uso dos combustíveis fósseis e assegurar uma transição energética justa.

Um desejo do presidente Lula – que fez uma defesa enfática do assunto como uma possível marca da COP da Amazônia –, a proposta foi citada de forma genérica após forte oposição de países ligados à indústria do petróleo ou alinhados aos Estados Unidos, influente ausente do evento.

Diante das críticas das nações que desejavam ver o mapa incluído de forma mas incisiva no documento, como as da União Europeia e da América Latina, Corrêa do Lago convocou uma assembleia informal dos delegados nacionais e, nele, trocou o tom conciliador por um enfático discurso apelando para que os países buscassem um mutirão para encontrar saídas em temas polêmicos.

Pouco antes, um grupo de países liderados pela Colômbia, chegou a declarar que elaboraria um documento paralelo, em protesto pela exclusão do mapa da “desfossilização”.

No discurso, o presidente da COP fez até uma rara citação pública aos Estados Unidos, cujo papel no boicote aos entendimentos manteve-se no ar, de forma velada, durante toda a conferência.

Ainda assim, até a tarde da sexta-feira tudo indicava que as conversas se estenderiam pelo fim de semana, com remotas chances de a proposta brasileira ser retomada. Belém repetiria, assim, o mesmo roteiro das edições anteriores da COP.

Da mesma forma, mais uma vez o único recado claro de uma COP acaba sendo o de que ainda falta coragem para enfrentar temas mais estruturais, especialmente a transição energética global, o que exigirá pressão contínua.

O povo na COP

Ma há outra marca, essa positiva, que os visitantes levarão de Belém. Se ainda não mobilizou nações desenvolvidas no compromisso de elevar o volume de aportes financeiros para conter as mudanças do clima – as estimativas apontam que são necessários US$ 1,3 trilhão, mas nem os US$ 300 bilhões prometidos na COP 29, em Baku, foram de fato aplicados até agora – a COP 30 ficará lembrada pela participação popular, com povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos e outros representantes da sociedade civil, presentes nas discussões.

Nesta sexta, a distância de engajamento ficou ainda mais evidente nas diferentes áreas da COP. Enquanto na área aberta à população, a Green Zone, havia filas nos estandes e nas barracas de alimentação, na Blue Zone o movimento se concentrou na sala de imprensa e nos corredores onde estão as salas de negociação.

O Pavilhão dos países, onde ocorreu o incêndio da quinta-feira, tinha acessos bloqueados e clima de fim de festa, com programação suspensa na maioria das áreas.

Os esforços, agora, ficarão cada vez mais a portas fechadas e mais distante do povo.

Com reportagem de Elaine Cotta, em Belém (PA).

Resumo

  • Divergências voltaram a se revelar no último dia da COP 30, reduzindo quase a zero a chance de consenso sobre o documento final
  • “Mapa do caminho” da eliminação dos combustíveis fósseis perdeu força após resistência de países ligados ao petróleo e postura velada dos EUA.
  • Enquanto a transição energética emperra, a COP30 se destaca pela forte participação da sociedade civil na Green Zone.