De olho em ter mais espaço nas discussões da COP 30, a conferência sobre clima da Organização das Nações Unidas (ONU) que será realizada em Belém (PA) em novembro, os principais representantes do agronegócio brasileiro vão manter estruturas fixas, verdadeiras “casas do agro” na capital paraense, ao longo de toda a realização do evento.
O objetivo é influenciar as decisões dos negociadores climáticos e representantes dos países que vão participar da COP, apresentando as soluções desenvolvidas pelo setor, conciliando a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e a manutenção da segurança alimentar global e demonstrando que o agro brasileiro é sustentável.
A principal dessas instalações será a AgriZone, uma estrutura que vai funcionar na sede da Embrapa Amazônia Oriental, localizada a cerca de dois quilômetros do Parque da Cidade, onde a COP será realizada na capital paraense.
O nome da estrutura da Embrapa faz uma alusão proposital às áreas Green Zone, espaço da COP aberto ao público em geral, e Blue Zone, restrita às autoridades, negociadores climáticos e imprensa. “A AgriZone será a casa das agriculturas sustentáveis brasileiras”, resume Walkymario de Paulo Lemos, chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental.
A ideia é oferecer um ambiente de imersão para diferentes públicos – autoridades, negociadores internacionais, organizações não governamentais, pesquisadores, agricultores familiares e também a população em geral. O acesso será gratuito e a expectativa da Embrapa é de receber entre 2 a 3 mil pessoas por dia no local.
“A AgriZone será um espaço imersivo e inclusivo, que mostrará de que forma a ciência brasileira tem contribuído, nos últimos 50 anos, não apenas para a produção de alimentos de qualidade, mas também para a sustentabilidade e a transição climática”, afirma Lemos.
O espaço, instalado dentro da unidade da Embrapa na capital paraense, foi concebido como um grande pavilhão de debates, demonstrações e vitrines vivas. A programação da AgriZone será extensa: auditórios abrigarão painéis e seminários promovidos pela Embrapa e por mais de 350 parceiros nacionais e internacionais selecionados por edital.
Entre os apoiadores estão entidades como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), empresas como Nestlé, Bayer e Caixa Econômica Federal, além de organizações da sociedade civil. Cada parceiro terá espaço para expor projetos, tecnologias e soluções ligadas à agropecuária de baixo carbono.
Outro destaque da AgriZone será a realização de uma feira da agricultura familiar, com produtos de cooperativas, oferta de alimentação, exposições e até apresentações culturais. “Queremos mostrar que diferentes modelos de agricultura, do empresarial ao familiar, podem conviver e contribuir para um futuro mais sustentável”, explica Lemos.
As chamadas “vitrines vivas” prometem ser o grande diferencial do espaço. Os visitantes poderão percorrer trilhas em fragmentos de matas de 60 anos, conhecer sistemas agroflorestais com cacau, açaí e café robusta, visitar um meliponário com abelhas nativas sem ferrão e explorar uma fazenda-modelo nas instalações da Embrapa, convertida em laboratório a céu aberto.
No local, serão apresentadas práticas de recuperação de áreas degradadas, cultivos de soja, milho e trigo carbono neutro, além de 45 materiais genéticos desenvolvidos pela Embrapa.
Segundo Lemos, a expectativa da instituição é que a AgriZone deixe um legado duradouro, valorizando também o trabalho dos pesquisadores nacionais.
“Enquanto corporação, a Embrapa quer demonstrar para o mundo que a ciência gerada pela pesquisa agropecuária brasileira, com seus parceiros, é pautada em ciência e apresenta indicadores que demonstram que produzimos alimentos, energia e fibra com qualidade e de forma sustentável. Nada melhor do que mostrar isso dentro da COP”, avalia o representante da Embrapa.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) também está indo para a COP com um discurso semelhante. A entidade vem se preparando há mais de um ano para a realização da conferência climática em Belém por entender que o evento traz uma oportunidade única de reconhecimento para o agro brasileiro.
“O agro realmente precisa sair desta COP com o indicativo de ser um setor solução para as mudanças climáticas, atendendo aos pré-requisitos que estão acordados no Acordo de Paris: mitigar e adaptar com co-benefícios”, afirma Nelson Ananias, gerente de sustentabilidade da CNA, em entrevista ao AgFeed.
Na intenção de demonstrar do que o agro brasileiro é capaz, a CNA terá presença em diferentes locais de Belém.
O maior espaço deve ser justamente na Agrizone, onde, durante os 11 dias da conferência, a entidade vai realizar debates temáticos diários por cadeia produtiva – soja, café, frutas, pecuária de corte, aves, suínos, energia limpa, entre outros, reunindo os representantes das respectivas associações representativas de cada cultura.
Além disso, a CNA pleiteia um estande também na chamada Blue Zone, área oficial de negociações da ONU. Nesse espaço, a pauta será mais técnica, com discussões sobre instrumentos do Acordo de Paris, adaptação, mitigação e financiamento climático.
“É lá que nós vamos concentrar a representação do setor agro, tanto negociadores, como congressistas, senadores e deputados”, explica Ananias.
Outro eixo de atuação está fora das imediações da COP e engloba uma série de visitas técnicas a propriedades rurais na Amazônia, mostrando na prática como funcionam sistemas sustentáveis como agroflorestas, fruticultura e pecuária de baixa emissão.
As viagens terão como público-alvo formadores de opinião, diplomatas, parlamentares e jornalistas, para que possam conhecer na prática a produção agrícola integrada à floresta.
“A pessoa que está na COP e quer ver de perto o que é uma produção agropecuária na Floresta Amazônica, pega uma van, passa o dia lá e volta no final do dia com todo esse conhecimento”, explica Ananias.
Iniciativa privada
Além das entidades e organizações governamentais, a iniciativa privada também se mobiliza para marcar presença na COP 30 com espaços próprios em Belém.
Na famosa Avenida Nazaré, uma das principais vias do centro da capital paraense, um casarão centenário ganhou vida nova com uma reforma coordenada pela multinacional de insumos Bayer, que vai instalar ali sua base para a COP na cidade – além de também estar presente na Agrizone.
O prédio, que está completando 100 anos de construção neste ano, passou por uma obra de restauração entre julho e agosto passado coordenada pela Bayer, parceria com a Empresa Brasileira de Produtos e Serviços Culturais (Embrasesc) e o Centro Cultural e Esportivo do Pará (CCESP).
As obras não alteraram as características físicas da casa e envolveram a restauração da estrutura do imóvel, rede elétrica para maior segurança, melhorias de iluminação, pintura, ampliação de um banheiro, além de reparos e doação de aparelhos de ar-condicionado.
Ao longo da semana em que será realizada a COP, a Bayer planeja realizar no Casarão painéis de discussão e mesas redondas com organizações como Atlantic Council, Leaf Coalition e Clim-Eat, além de outros eventos. A expectativa da companhia é de que os seus principais executivos participem da programação, que ainda está sendo finalizada.
Além disso, a companhia espera que a casa simbolize um legado da companhia para Belém, como explicou recentemente Maurício Rodrigues, presidente da divisão de Crop Science da Bayer para a América Latina, em entrevista ao AgFeed.
“É um projeto bastante interessante, porque além de participar da COP e do diálogo global, queremos deixar uma contribuição concreta para a cidade”, disse Rodrigues, que confirmou à reportagem que estará em Belém durante o evento.
O executivo já esteve em três edições da conferência – nas COPs de 2021, 2022 e 2023. “Vou para minha quarta COP”, disse o executivo da Bayer, animado.
Outro veterano desses encontros é Ricardo Mussa, ex-CEO da Raízen e atual líder da SB COP 30, iniciativa do setor privado coordenada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e que representa cerca de 40 milhões de empresas espalhadas pelo mundo.
A meta da SB COP é de influenciar in loco os negociadores climáticos a levar em consideração as demandas do setor privado.
Primeiro, a coalizão do setor privado entregou 23 recomendações ao presidente da COP 30, André Corrêa do Lago, em um evento em Nova York.
Em novembro, durante a COP, com sua "casa" em um estande na Blue Zone, além de reforçar a influência sobre os influenciadores, a SB COP pretende apresentar os resultados de um concurso chamado SB COP 30 Awards, para selecionar projetos já em andamento das 40 milhões de empresas representadas pelas entidades de indústria e comércio que participam da SB COP.
A ideia é apresentar as 40 melhores iniciativas recebidas pelo evento no estande da SB COP 30 na Blue Zone.
"Quando alguém de algum governo estiver passando por ali, queremos dizer: 'Deixa eu te mostrar por que, na sua política pública, você tem que falar de etanol'. Ou 'deixa eu te mostrar esse projeto aqui, que está dando retorno financeiro, está reduzindo emissões'", diz. "A melhor forma de influenciar o setor público é através do exemplo”, avalia Mussa.
O CEO da SB COP sabe, no entanto, que o desafio de influenciar as discussões é grande. “No G20, são 20 países. Na COP, são 197. E o modelo de negociação do G20 não é por consenso. O da COP é. Se você tiver um país, por menor que ele seja, uma ilha do Caribe, que falar ‘não estou de acordo’, não sai o documento”, afirma.
Apesar das dificuldades, ele também avalia que o Brasil tem uma oportunidade "única" de liderança na COP, podendo apresentar suas soluções ambientais, inclusive no agro. “A gente está na parte da solução, não do problema. Tem país que é problema. O Brasil é a solução.”
Além da SB COP, também está prevista a participação de uma coalizão de cinco empresas - Bradesco, Itausa, Itaú, Natura, Nestlé e Vale - chamada C.A.S.E. (sigla para Climate Action Solutions & Engagement, ou Soluções e engajamento para ações climáticas, numa tradução livre).
O grupo de empresas irá selecionar histórias de soluções climáticas e socioambientais brasileiras da iniciativa privada que estejam alinhados com os debates prioritários da COP30, como Financiamento Climático, Bioeconomia, Transição Energética, Sistemas Alimentares, Economia Circular, Infraestrutura e Transição Justa.
A ideia da coalizão é apresentar as soluções climáticas em Belém e ganhou o apoio inclusive do presidente da COP 30, o embaixador André Corrêa do Lago. “A iniciativa da C.A.S.E. será uma grande contribuição para avançar nos objetivos da COP 30”, disse.
Resumo
- O agronegócio brasileiro vai montar estruturas próprias em Belém durante a COP 30, com destaque para a Agrizone, organizada pela Embrapa Amazônia Oriental
- CNA terá presença forte na Agrizone e também na Blue Zone, promovendo debates diários por cadeia produtiva e defendendo o agro como parte da solução climática
- A iniciativa privada também vai marcar presença com casas e pavilhões, como o casarão reformado pela Bayer e a SB COP 30