A 15 quilômetros, por asfalto, da cidade de Luís Eduardo Magalhães, no Oeste baiano, um projeto ambicioso tem ajudado a mudar a capital dos grãos do Matopiba.

Ali, em uma área total de 220 hectares, esses grãos são transformados em proteína animal no maior confinamento do Nordeste, hoje com capacidade estática para receber 65 mil cabeças de gado.

Até 2030, o mesmo local deve sediar também a maior planta frigorífica da região, com um frigorífico integrado em um megacomplexo agroindustrial, que demandará, nos próximos cinco anos, investimentos totais da ordem de R$ 1,2 bilhão.

O responsável pela ousadia é Almir Moraes Filho, dono da Captar Agrobusiness, holding que controla negócios que envolvem recria e engorda de bois, produção de rações para nutrição animal e de fertilizantes, logística e, em breve, energia. Sempre começando na pata do boi.

Engenheiro, com atuação também em construção civil, Moraes é de uma família de pecuaristas do semiárido e, com seu projeto, espera mostrar que aquele pedaço do Brasil que se transformou em uma nova fronteira agrícola pode ser um centro de excelência também na pecuária de corte.

Ele iniciou a operação do confinamento em 2010. “Mas a gente decolou mesmo a partir de 2020”, afirma José Roberto Bischofe Filho, diretor executivo da Captar, ao AgFeed.

Foi nesse período que o grupo refinou seu modelo de ser, nas palavras de Bischofe, “mais que um confinamento” e começou a desenhar a estratégia que o levará a ter a própria estrutura de abate, com a marca Captar Beef.

Os investimentos têm sido feitos anualmente para ir preparando o terreno para que a oferta de gado esteja garantida para a futura indústria. Nos últimos anos, a capacidade estática do confinamento, por exemplo, saltou de 40 mil para 65 mil animais. Até 2030, o projeto prevê dobrar essa capacidade.

No ano passado, a Captar entregou para os frigoríficos mais de 100 mil bois para abate. Este ano, serão em torno de 150 mil, com faturamento estimado em R$ 750 milhões. E, quando chegar o momento de fazer tudo dentro de casa, essa entrega deve atingir mais de 400 mil cabeças.

Os R$ 1,2 bilhão previstos no plano de negócios incluem aportes em todas essas áreas. O maior investimento, é claro, será na construção do frigorífico, orçado em R$ 500 milhões.

Ali, a Captar pretende replicar o modelo adotado pelo SuKarne, maior grupo frigorífico mexicano, que implantou a unidade de abate em uma área anexa ao confinamento.

“Os bois vão caminhando até lá”, explica Bischofe. Os ganhos de eficiência parecem óbvios, já que há uma grande economia com fretes e menor perda de peso e menos estresse do gado com o transporte.

Atualmente, 95% dos animais terminados no confinamento da Captar precisam viajar mais de 1,1 mil quilômetros até a planta da JBS em Ituiutaba, Minas Gerais – é a mais próxima do local com licença para exportação.

“Aqui só produzimos boi China”, diz Bischofe, referindo-se à qualidade do rebanho, que atende às especificações superiores de idade, peso e carcaça exigidas pelos importadores chineses.

A previsão do grupo é abater 1,5 mil animais por dia na futura planta. “Esse figorífico tem que nascer para exportação, porque dentro do mercado interno o projeto não viabiliza”.

Para atender à demanda da indústria, o segundo principal item em volumes de investimento é justamente a ampliação do confinamento.

São R$ 200 milhões previstos para essa rubrica, seguindo o modelo de multiplicação de baias que recebem os animais para a engorda.

Hoje, o confinamento é formado por 394 baias, todas elas gerenciadas por um sistema automatizado, o Feed Manager, desenvolvido pela parceira Cargill, que permite o controle remoto de toda a operação, desde a retirada do alimento na fábrica de rações até a sua distribuição em cada cocho, identificado por tags.

A nutrição animal, por sua vez deve receber um aporte estimado em R$ 150 milhões. A fábrica de rações, por exemplo, produz atualmente 750 toneladas diárias, mas também terá de ser adequada à demanda futura, interna e para fornecimento para parceiros fornecedores de bois para o confinamento. Quando estiver concluída, produzirá 1,5 mil toneladas por dia.

Segundo Bischofe, as obras da fábrica de rações estão praticamente prontas, assim como a estrutura de armazenagem para os grãos que vão alimentá-la, que deve ser concluída até o fim do ano.

O projeto prevê uma capacidade para armazenar 2,5 milhões de sacas de grãos, o que corresponde a 150 mil toneladas. “Só de grãos, fora caroço de algodão e casca, que a gente armazena também”, afirma.

Na logística, a empresa investiu na modernização da frota, que hoje conta com 60 caminhões, 48 para transporte do gado e doze caçambas para grãos.

O projeto reserva R$ 100 milhões para essa rubrica, sobretudo para a troca de caminhões por modelos mais modernos e com menor nível de emissões.

Há também outros R$ 165 milhões a serem destinados à Captar Energia, divisão do grupo que engloba a autogeração com uma “fazenda” fotovoltaica e também com biodigestores, que utilizarão o esterco recolhido nas baias para a produção de biogás. Os resíduos dessa operação serão transformados em fertilizantes.

Hora de buscar investidores

Os detalhes do plano de negócios da Captar Agrobusiness serão revelados por Almir Moraes no próximo sábado, 19 de julho, durante o Captar Conecta, tradicional evento realizado pela empresa na área da fazenda e que deve reunir cerca de 400 pessoas.

O empresário já tem avançado em negociações com o governo da Bahia em busca de incentivos para o projeto, que, segundo dados da companhia, deve gerar um total de 4,6 mil empregos em sua execução.

A Captar foca seu discurso no fato de que há espaço para criar um modelo econômico moderno para a pecuária no estado, que possui hoje o terceiro maior rebanho do País, com mais de 13 milhões de cabeças.

Porém, quase 95% dos mais de 300 mil estabelecimentos dedicados à bovinocultura na Bahia possuem menos de 100 animais e baixo índice de adoção tecnológica, enquanto que mais da metade do rebanho está nas mãos de apenas 6% dos pecuaristas, segundo dados da Agência de defesa Agropecuária da Bahia (Adab).

Além do apoio do governo, Moraes deve iniciar a busca de investidores para o projeto. Segundo Bischofe, parte do investimento necessário para a implantação do frigorífico e todas as demais estruturas necessárias para a formação do que o grupo chama de “cluster agropecuário” deve vir da própria empresa.

Se até agora Moraes bancou sozinho o avanço da Captar, ele entende que, diante da dimensão do novo empreendimento, o momento é de atrair recursos de terceiros para realizá-lo.

“Vai haver, sim, aportes de terceiros”, afirma Bischofe. “A gente está em negociação com alguns players, capital interno e capital externo, para participar desse processo. Temos que ter sócios”.

O modelo de participação desses investidores ainda não está definido e, de acordo com o diretor do grupo, vai depender do interesse dos potenciais parceiros. A princípio, a intenção de Moraes seria trazer sócios para a holding, ajudando a financiar as diferentes frentes do projeto.

De onde vem tanto gado

À medida em que o sonho e o confinamento crescem, aumenta o desafio da Captar de manter om fornecimento para ser engordado ali e, posteriormente, encaminhado ao abate.

Por isso, a estrutura atual da Captar inclui, além do complexo de Luís Eduardo Magalhães, outras seis fazendas para recria, somando 5 mil hectares – quatro na Bahia e duas em Tocantins.

Como o grupo não atua, entretanto, na etapa de cria, há um intenso trabalho de captação de animais, que hoje acontece em sete estados. Além de Bahia e Tocantins, a empresa origina garrotes no Maranhão, Piauí, Pará, Goiás e Minas Gerais.

Segundo Bischofe, cerca de 350 produtores possuem um relacionamento mais constante com a Captar, entregando seus animais regularmente.

Mas com a demanda crescente, a empresa tem investido em um modelo de integração, em que esse relacionamento é ainda mais próximo, com a Captar entregando tecnologia – como proteinados produzidos em sua fábrica de ração – e recebendo um animal de melhor qualidade.

“A gente tem esses parceiros estratégicos na Bahia, no Piauí e no Tocantins também”, conta Bischofe. “Além da nutrição, levamos até eles toda assistência técnica nossa através da Cargill, com um profissional que vai lá, visita e faz o estudo do melhor aproveitamento e de desempenho dentro da condição que eles têm”.

Assim, de acordo com o executivo, o criador que comprou um bezerro de 6 a 8 arrobas, recria esse animal na fazenda até atingir as 12 arrobas. Na etapa seguinte, já no confinamento, ele deve ganhar mais 8 arrobas, para então seguir para o abate, atingindo as 20 arrobas no gancho do frigorífico.

O processo de eficiência desejado pela Captar visa a reduzir o prazo em cada uma dessas etapas, de forma que o boi atinja as 20 arrobas antes dos 24 meses de idade. No sistema tradicional a pasto, isso pode demorar cinco anos.

Todo o gado adquirido pela Captar é checado, para verificação se não carrega nenhum passivo ambiental ou de trabalho escravo na sua origem. E é rastreado a partir de sua entrada no confinamento. A própria empresa banca o sistema, que ainda não é obrigatório no estado da Bahia.

Segundo Bischofe, a rastreabilidade total, a partir do nascimento, já começou a ser feita com alguns parceiros que atuam com fazendas de cria.

Parceiro da soja

A empresa também tem estimulado a evolução da integração lavoura-pecuária (ILP) no próprio Oeste da Bahia, região que, pela grande produção de grãos, base da alimentação bovina, possui potencial para desenvolver ainda mais confinamentos.

“A integração da agropecuária aqui tem trazido ganhos também para a soja”, afirma Bischofe. Segundo ele, há propriedades em que a produtividade média de algumas áreas em que houve a rotação entre a oleaginosa e pastagens, com a introdução de gado, subiu de 55 sacas para 75 sacas por hectare.

Um estudo da Embrapa Cerrados mostrou que essa alternância de soja e capim como a braquiária pode gerar aumento médio de 12,6% na produtividade do grão.

“O foco é a soja, mas o animal entra complementando. E, com isso, tem aumentado bastante a oferta”.

Bischofe vê ainda outro ponto jogando a favor da atividade pecuária intensiva na região: a chegada de indústrias de etanol de milho, que geram, como subproduto, o DDG, insumo com alta concentração de proteína para a nutrição animal.

A Inpasa, maior produtora de etanol de milho do País, por exemplo, já iniciou a construção de uma usina em Luís Eduardo Magalhães, um investimento de R$ 1,2 bilhão. A planta deve entrar em operação em março de 2026.

“Aqui vai ser um polo concentrador de gado”, profetiza Bischofe.

Resumo

  • Com sede em Luís Eduardo Magalhães (BA), Captar Agrobusiness vai investir R$ 1,2 bilhão até 2030 para construir o maior frigorífico do Nordeste
  • Empresa pretende dobrar confinamento, hoje com capacidade estática de 65 mil cabeças, e criar um complexo agroindustrial com foco em exportação e eficiência logística
  • Projeto inclui fábricas de ração, modernização da frota e geração própria de energia com fontes renováveis (solar e biogás)

Estruturas de armazenamento e fábrica de rações no complexo da empresa

Visão interna da fábrica de ração, com caçambas sendo carregadas