Uma conversa com Fernando Degobbi, CEO da Coopercitrus, pode ter muitos caminhos. São tantas as frentes de negócios abertas pela cooperativa – a maior do País em número de associados – que é possível, em pouco tempo, percorrer uma infinidade de segmentos do agro, seus desafios e oportunidades, em um curto espaço de tempo.

Como bom gestor, Degobbi administra o tempo e fala sem pressa. O tom é otimista, quase um antídoto ao mau humor que o setor tem vivido nos últimos meses e que, se passou na porta da sede da Coopercitrus, em Bebedouro, no interior de São Paulo, não se instalou por lá.

“Temos um crescimento já bastante importante no primeiro trimestre”, explica ele, ao AgFeed, logo de início. “Pelos números que já fechamos, de janeiro até março, acumulado, crescemos 22% em faturamento”.

Enquanto boa parte do agro andou de lado – e alguns até para trás – a estratégia bem-sucedida da cooperativa foi ocupar espaços que foram surgindo em suas áreas de atuação, sejam de mercado, sejam geográficas.

Com isso, segundo Degobbi, a Coopercitrus avançou em áreas que pertenciam a concorrentes em dificuldades em segmentos como a distribuição de insumos e na venda de máquinas agrícolas, dois setores em que a cooperativa também se posiciona entre as maiores do País.

“Essa instabilidade que aconteceu com alguns grupos, principalmente revendas, abriu espaço para a gente poder também participar mais dos negócios na nossa região. Nós não fechamos loja. Pelo contrário, contratamos mais profissionais e seguimos o nosso plano de crescimento orgânico”, afirma.

No começo de maio, durante a Agrishow, o estilo Coopercitrus de fazer negócio fica mais claro. Sem estardalhaço, a cooperativa revela seus tentáculos em um estande de 4,3 mil metros quadrados onde, mais que exibir seu poder, acolhe cerca de 60 marcas parceiras em uma espécie de shopping center do agro.

Ali, o movimento é intenso ao longo de todo o evento e se encontra de tudo, desde espaços para grandes multinacionais de insumos, fertilizantes e máquinas a bancadas de startups apresentando novas tecnologias de agricultura digital.

A cooperativa garante que a clientela estará por lá. Este ano, comprou e distribuiu cerca de 13 mil convites a uma boa parte de seus 36 mil associados e até fretou ônibus para levá-los a Ribeirão Preto.

E promove uma campanha, que dura até uma semana depois da feira, para o fechamento de negócios iniciados lá.

Mais uma vez, o termômetro da Coopercitrus mostra um agro reaquecendo nos diferentes mercados. Segundo Degobbi, a campanha de 2025 resultou em cerca de R$ 2 bilhões em negócios – 20% acima dos R$ 1,6 bilhão do ano passado e mais ou menos no mesmo ritmo de crescimento apresentado pela cooperativa no primeiro trimestre.

“Vamos fechar o ano com um crescimento muito forte”, reafirma Degobbi.

O otimismo do executivo vem, segundo ele, da observação da movimentação dos agricultores. Ali, ele constata um cenário de recuperação de margens, com as colheitas mais fartas em uma safra quase sem problemas climáticos, pelo menos nas áreas de atuação da Coopercitrus.

“Se a base da cadeia vai bem, a gente vai consertando pra cima”, afirma. “Quando o produtor vê uma perspectiva melhor, ele investe, paga as contas e isso começa a se refletir na distribuição de insumos e de máquinas e, consequentemente, nas indústrias”.

Degobbi sabe, entretanto, que essa base encara o desafio de investir e plantar em um momento de crédito escasso e caro, com as taxas de juros em patamares quase proibitivos. “É difícil pensar em começar uma safra com juros a 15%”, reconhece.

Do lado da cooperativa, ele tem buscado alternativas para aliviar esse fardo para os seus associados. No ano passado, durante a Agrishow, ele anunciou ao AgFeed, em primeira mão, a criação da Fincoop, uma fintech para conectar, com o apoio de uma plataforma tecnológica, os cooperados com as diferentes opções de financiamento existentes no mercado.

Um ano depois, todos os principais bancos estão conectados na plataforma, que ajuda a filtrar as alternativas mais adequadas para cada produtor.

Nessa conexão, entra em campo também o conhecimento que a cooperativa tem do histórico dos agricultores, permitindo que as instituições financeiras façam uma análise de risco mais criteriosa e, em contrapartida, possam oferecer condições mais favoráveis.

A Fincoop não atua como um banco, mas com os bancos. Hoje, quase 100% dos recursos obtidos pelos associados da Coopercitrus para custeio de suas lavouras passa, segundo Degobbi, pela Fincoop.

Além disso, a plataforma consegue acessar qualquer tipo de linha de crédito disponível, inclusive as incentivadas ou subsidiadas por programas especiais, como Finame, para financiamento de máquinas, e ProIrriga, para equipamentos de irrigação, que são os ativos de maior valor agregado, que precisam de mais prazo, juros fixos.

Outro exemplo recente são linhas oferecidas pela agência de fomento paulista Desenvolve SP, em que a cooperativa assinou um convênio e tornou-se parceira em um plano específico para tecnologia, drones, irrigação.

“Nós fomentamos esse acordo. Faz dois anos que nós estamos construindo com o governo”, conta Degobbi.

“O que a Fincop tem feito de diferent do mercado?”, ele pergunta. E em seguida responde: “Em vez de ter que pegar o dinheiro sempre no limite da cooperativa, estamos agora conectando as soluções que alguns bancos têm direto com o nosso cooperado”.

O caso da Desenvolve SP é, para ele, o melhor exemplo desse modelo. “Eles têm recurso, querem fomentar tecnologia e às vezes têm a dificuldade de entender como dar o crédito, não tem o conhecimento da operação”, diz. “Então, a Coopercitrus se responsabiliza pelo crédito, se responsabiliza pelas perdas, inclusive, se houver”.

Oferecendo-se como garantidora do crédito, a cooperativa afirma poder oferecer, nesse caso, taxas entre 7 a 9% ao ano para os financiamento, quase metade da Selic.

“Esse é um exemplo do que é possível fazer quando você consegue ter controle, estrutura, tecnologia. Você já tem histórico do cooperado, a análise de risco é muito mais rápida e eficiente, que é a grande dificuldade hoje dos bancos”.

A “base forte” da cooperativa é boa pagadora. Segundo o executivo, a taxa de inadimplência entre os seus cooperados está em 0,5%, dentro dos seus níveis historicamente baixos e bem aquém dos 7,6% apresentados pela média nacional dos produtores rurais, segundo levantamento divulgado esta semana pela Serasa Experian.

O processo de análise interna da cooperativa é rígido e, de acordo com Degobbi, reconhecido pelos bancos e, agora, também pelas seguradoras, já que a Fincoop passou a conectá-las também na plataforma, através da corretora da Coopercitrus.

Além disso, a Fincoop tem criado frentes de consultoria aos cooperados, para ajudá-los na gestão de questões complexas para a maioria, como a sucessão e a organização financeira.

No caso da sucessão, Degobbi afirma que existe muita dificuldade dos produtores em organizar um processo claro de transição para os herdeiros, em entender as alternativas existentes e preparar suas propriedades juridicamente para esse passo.

Hoje, esse programa já atende a 18 famílias de cooperados com o serviço, lançado há seis meses. A Fincoop buscou a ajuda de escritórios especializados no assunto e trata esse projeto como um piloto.

“É um projeto que tem propósito. Queremos criar algo novo para o agro”, diz.

Na outra frente, a Fincoop fechou uma parceria com a consultoria Deloitte para ajudar cooperados a organizar suas demonstrações financeiras. A ideia é que eles tenham uma espécie de DRE (demonstrativo de resultados), com a assinatura de uma empresa especializada.

“A gente vê que às vezes o produtor paga juros mais caros porque ele não tem isso e o banco não consegue ter essa visão da operação dele”, diz Degobbi.

Os rumos da expansão

Um dos trunfos da Coopercitrus para os momentos de maior dificuldades é a diversificação de culturas entre os seus associados e de negócios da cooperativa.

O que nasceu, como nome diz, como uma associação de citricultores, hoje é uma potência com cooperados de diversos portes – inclusive grandes produtores – também na cana-de-açúcar, café, grãos, hortifrutis e, mais recentemente, na pecuária, com um investimento de R$ 100 milhões anunciado em fevereiro passado em um complexo para confinamento.

O crescimento é forte, mas controlado. Degobbi diz que a expansão das lojas da Coopercitrus deve se manter na média de duas a três novas por ano, resistindo à tentação de avançar ainda mais sobre áreas hoje desatendidas pela crise no setor de distribuição de insumos.

“Esse sempre foi nosso plano, independente do momento”, diz. “Mesmo quando houve aquele boom na pandemia, com revendas abrindo 20, lojas no ano e fundos de investimento abrindo ou comprando 30, 40. É impossível você trabalhar com organização nessa escala”, pontua.

A Copercitrus hoje tem presença física em 70 municípios, a começar por uma atuação tradicional em São Paulo e Minas Gerais. Há oito anos, abriu operações em Goiás, onde já está em seis municípios.

No ano passado, a cooperativa estreou no Mato Grosso, com uma unidade em Primavera do Leste, e ocupou posições também no sul de Minas, em que ainda não atuava.

A expansão para novos estados ainda não está definida, mas é avaliada, segundo Degobbi.

Ele ressalta que a experiência em Primavera do Leste tem sido positiva, abrindo as portas para a cooperativa começar a trabalhar com outra cultura, a do algodão.

Lá, a primeira iniciativa foi levar o modelo da Campo Digital, uma revenda focada em produtos e serviços de tecnologia de agricultura digital. Mas logo foi adotado o modelo tradicional, que compreende originação e revenda com o pacote quase completo da cooperativa, incluindo insumos, uma concessão de irrigação e até capacitação para operadores de drones, uma demanda crescente no País.

“Até a nossa ida para lá, esse serviço de drones de pulverização não estava ainda muito compreendido pelo produtor. Então, a gente abriu a revenda e também o treinamento, a formação de operadores certificada pelo Ministério da Agricultura para emitir o CAR, que é a certificação de operação.

Degobbi se entusiasma com o potencial desse mercado. Ele diz que tem visto uma procura muito grande de mulheres por esses cursos. E, no campo das vendas de aparelhos, as vendas tem crescido desde para pequenos produtores até para grandes grupos, sobretudo no Mato Grosso.

No ano passado, segundo o executivo, as revendas da Coopercitrus comercializaram perto de 500 unidades. “Neste ano, nossa meta é vender 700 drones”, diz. Somente na Agrishow, foram mais de 80.

A adoção das tecnologias digitais tem sido tão rápida e intensa que a cooperativa reviu seu plano de abrir lojas específicas da iniciativa Campo Digital. Agora, esse projeto está incorporado como espaços dentro de todas as revendas Coopercitrus.

“A gente conseguiu escalar. Hoje são 145 profissionais dentro do Campo Digital”, diz. As lojas abertas, como a de Primavera do Leste e a de Cristalina, em Goiás, acabaram servindo como piloto para o que hoje é um ecossistema que hoje reúne mais de 36 empresas.

Resumo

  • No primeiro trimestre, Coopercitrus fechou com desempenho 22% superior ao do mesmo período ano passado
  • Somente na Agrishow, vendas atingiram R$ 2 bilhões, crescimento de 20% sobre o ano anterior
  • Fintech Fincoop, criada há um ano, é um dos trunfos da cooperativa na oferta de crédito aos cooperados, com conexão aos principais bancos e linhas especiais, como a fechada junto à Desenvolve SP