A safra brasileira vai crescendo e, a reboque, aumenta a demanda por transporte, principalmente rodoviário, fazendo com que o gerenciamento do frete se torne um fator crítico nas operações do setor.

De olho nesta “dor do agro”, foi criada há seis anos,a startup goFlux, que no primeiro momento tinha foco principal em um marketplace para que empresas do agronegócio e transportadoras fizessem a contratação do frete, com mais eficiência.

O negócio da logística segue crescendo na goFlux, mas nos últimos dois anos, a empresa passou a atuar em soluções financeiras, por isso agora se denomina uma “logfintech”.

Um FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios) de R$ 30 milhões lançado no início de 2024 foi o primeiro passo nesta direção. A goFlux identificou uma forte demanda entre as transportadoras, que estão entre seus principais clientes, para antecipação de recebíveis e começou a financiar as empresas.

Agora, a startup está pronta para um passo ainda maior. Está lançando no mercado um novo FIDC, desta vez com outra gestora, no valor de R$ 80 milhões.

Em entrevista exclusiva ao AgFeed, o CEO da goFlux , Rodrigo Gonçalves, disse que a expectativa é financiar R$ 1 bilhão no próximo ano, com o impulso do novo fundo.

Em 2025, Gonçalves calcula que a goFlux deve chegar a R$ 370 milhões em volume de crédito. No ano anterior, havia sido de R$ 240 milhões.

Ele diz que tem observado o avanço de novas fontes de financiamento para a produção agrícola, que conta com o Plano Safra do governo, mas cada vez mais com agentes do setor privado.

“Mas a gente vê um gap, uma distância muito grande disso, numa perna muito importante do agronegócio, que é o transporte. Então pensamos: como é que a gente constrói um plano em paralelo de soluções, que se transforme num plano safra para transportadoras?”, indagou.

A resposta será apresentada nesta terça-feira, 18 de novembro, durante um evento realizado em parceria com a XP, para as principais transportadoras do País.

O primeiro pilar do “plano” é o lançamento do banco goFlux, que passará a oferecer uma conta corrente para quem for cliente da plataforma.

Por lá a transportadora pode receber o empréstimo e também fazer outras operações, como pagar o motorista, impostos, inclusive um “débito em conta” de outros serviços que também estão sendo lançados.

A goFlux tem o Banco Rendimento entre seus investidores, o que dá suporte para a atuação financeira, mas funcionará como White Label. No futuro, poderá avançar mais, solicitando a condição de instituição financeira junto ao Banco Central.

“É um FIDC de R$ 80 milhões, que gira uma vez por mês, ou seja, a gente entra a próxima safra com capacidade de financiar um bilhão de antecipação de recebíveis para as transportadoras conectadas nessa conta corrente”, reforçou.

A rapidez na liberação do dinheiro, diz ele, será o diferencial para um setor que não pode esperar. “Hoje, uma transportadora leva 48 a 72 horas para liberar recursos no banco tradicional. No nosso modelo, a aprovação sai em até 40 minutos e o dinheiro cai no mesmo dia”.

A operação será totalmente integrada ao ecossistema da logfintech, com análise automatizada dos contratos de frete negociados dentro da plataforma.

Com esse cenário à frente, o CEO adiantou ao AgFeed que está no planejamento para 2026 fazer uma rodada série B para captar em torno de US$ 50 milhões com foco nessa estrutura financeira.

Parceria com Pirelli e Localiza

Um segundo pilar do plano são as parcerias. Uma delas foi fechada com a Prometeon, que é a divisão de pesados, que comercializa pneus de caminhões, da marca Pirelli. Está sendo criado um modelo considerado inédito de “pneu por assinatura”.

Rodrigo Gonçalves alega que uma transportadora que tem 80 caminhões por exemplo, precisa trocar quase 300 pneus por ano, uma despesa milionária.

Os pneus da Pirelli serão comercializados dentro da plataforma e haverá a oferta de crédito específico para esse fim. O pagamento será feito em parcelas mensais na forma de débito na conta junto à goFlux. Assim, a ideia é ajudar no fluxo de caixa, evitando que a despesa pese de uma só vez no orçamento das transportadoras.

A startup também fechou acordo com a Localiza para ampliar o acesso a caminhões seminovos e modelos de locação na linha pesada. A ideia é permitir que frotas envelhecidas — hoje com média superior a 19 anos no Brasil — sejam renovadas de forma mais acessível, ancoradas no volume de carga movimentado dentro da própria goFlux.

O CEO da goFlux lembra que um caminhão novo, considerando o conjunto de cavalo, carreta e graneleira, chega a custar R$ 1,6 milhão. No atual cenário de juros altos e finanças apertadas, estaria difícil para as empresas fazer essa renovação de frota.

“Com esse modelo, você pode trocar um caminhão de 15 anos, por um caminhão com 3 anos de uso. Você melhorou a idade média da frota, melhorou a eficiência energética, reduziu o custo e ela consegue financiar isso com os mecanismos dela”, explicou.

No evento desta semana, também será apresentada uma parceria com a Acrox, empresa especializada em créditos tributários e PIS/Cofins.

Metas financeiras

O CEO da goFlux lembra que chegou a fazer projeções de R$ 1 bilhão em crédito anos atrás, em entrevista ao AgFeed.

Porém, segundo ele, isso acabou não se concretizando em função de questões macroeconômicas, principalmente os juros que ficariam muito elevados para a transportadoras.

O FIDC novo, que está sendo lançado com reformulações em relação ao anterior, deve oferecer taxa de 1,69% ao mês.

“A gente poderia ter escalado esse ano para fazer R$ 600 milhões, até poderia ter feito, mas a gente já está falando de taxas acima de 2,5%. E isso para o transporte rodoviário, embora aconteça no mercado como um todo, não é mais sustentável. Eu quero a transportadora operando com a gente no longo prazo”, frisou.

Agora, a expectativa é oferecer, via FIDC, crédito sempre com taxa inferior a 2% ao ano.

“Esse dinheiro, ele gira uma vez, às vezes mais de uma vez por mês. Com R$ 80 milhões no fundo, eu faço R$ 100 milhões por mês de antecipação de recebíveis, porque é muito rápido”, explicou. Está aí a justificativa para que novamente haja uma projeção de R$ 1 bilhão em crédito.

A “tese” atual da goFlux se assemelha ao modelo adotado para o varejo pelo Mercado Livre, que criou o Mercado Pago e hoje tem como principal receita o financiamento aos lojistas e não o marketplace em si.

Segundo o executivo, até mesmo o iFood, que na primeira onda apenas conectava restaurantes e clientes para pedir comida, também estaria migrando para o modelo de soluções financeiras a estes estabelecimentos.

Esse seria um diferencial da goFlux na hora de ofertar crédito, na comparação com bancos tradicionais.

“A gente conhece profundamente o risco de crédito da transportadora, porque ela opera aqui dentro. Eu sei de com quem ela opera, ela ganha as cargas aqui dentro. É muito semelhante ao Mercado Livre e o Mercado Pago. O iFood, por exemplo, com os restaurantes, conhece profundamente a dinâmica de receita dos lojistas, para quem que ele vende, com que frequência”, explicou.

“Isso permite com que a gente consiga ter uma captação de recursos para esses fundos com mais competitividade e transferir esse valor para a conta da transportadora no mesmo dia, que já faz um pix para o motorista poder abastecer”.

Gonçalves diz que nos Estados Unidos, por exemplo, o financiamento do agro é feito, majoritariamente, por quem opera localmente. Seria também a explicação para a forte presente das cooperativas de crédito no interior do Brasil.

À medida que a transportadora for usando a conta na goFlux para mais serviços, como aluguel de pneus, por exemplo, a ideia é que o histórico maior reflita em mais lastro financeiro, dando mais facilidade para fechar novas operações.

Nesse cenário, a goFlux garante “que não vai virar uma fintech”, porém nos próximos anos a tendência é de que a receita do serviço financeiro supere o negócio de logística.

Na parte de logística, quando se fala em fretes transacionados via plataforma, a expectativa é fechar 2025 com R$ 12 bilhões. Para 2026, a projeção é de R$ 20 bilhões. Uma parte desse crescimento ocorreu em função do aumento no preço do frete, que vem se intensificando.

“A gente estima o mercado de frete no ano que vem em quase R$ 400 bilhões. Então, a gente pode capturar 2% de share do mercado brasileiro e talvez um pouco mais. Vamos ver como isso vai acontecer, mas a gente está muito confiante”, afirmou.

Em volumes, 2025 deve fechar com a movimentação de 62 milhões de toneladas de cargas, especialmente produtos soja, milho, fertilizantes, açúcar, biocombustíveis e itens de mineração. Para o ano que vem, a empresa prefere não fazer projeção em volume.

A goFlux não divulga dados de receita anual, informa apenas que o faturamento teria crescido 90% em 2025, na comparação com o ano anterior. “A perspectiva para 2026 é exponencialmente maior em função do crescimento dessas soluções financeiras”.

Atualmente, cerca de 85% da receita vem da logística e o restante do serviço financeiro. No ano que vem, o CEO prevê uma fatia de 40% vindo do banco goFlux. Já na “maturidade”, espera uma relação de 70/30, com a maior parte oriunda do financeiro. “Com isso vai baratear serviço na parte logística e conseguiremos atender clientes menores”.

Resumo

  • Com novo FIDC de R$ 80 mi, goFlux deve financiar R$ 1 bi em antecipação de recebíveis em 2025, com aprovação em até 40 minutos
  • “Plano safra do frete” inclui banco goFlux, com conta corrente integrada de transportadoras, e parcerias com Pirelli (pneu por assinatura) e Localiza (renovação de frota)
  • Plataforma projeta transacionar R$ 12 bi em fretes em 2025 e prevê receita financeira superior à da logística nos próximos anos