O argentino Gerardo Bartolomé teve uma vida dedicada à soja. Filho de uma dona de casa e de um especialista em comércio exterior, ele se formou em 1980 em engenharia agrícola pela Universidade de Buenos Aires e em 1982 fundou a “Asociados Don Mario” junto com outros quatro sócios.
O objetivo era desenvolver uma semente de soja que fosse própria para as qualidades do solo argentino - o que até então não existia. Bartolomé foi autor até de um livro sobre soja, o “La soja y el agrónomo, vidas paralelas” (A soja e agrônomo, vidas paralelas), de 2021.
O que ele não imaginava é que a empresa daria, recentemente, um grande salto para outra cultura, a do milho.
“Queremos fazer com o milho o mesmo que fizemos com a soja”, disse Andre Gradowski de Figueiredo, diretor de pesquisa e desenvolvimento da GDM no Brasil, em entrevista ao AgFeed.
A empresa calcula que cerca de 45% da soja plantada no mundo tem a genética da GDM e 50% do trigo produzido na América do Sul provém de sementes desenvolvidas pela companhia. No Brasil, esse percentual sobe para 80% nas lavouras de soja.
“Há 25 anos, colhíamos 40 sacas por hectare. Hoje, são de 90 a 100 sacas”, conta Figueiredo.
O passo mais importante da GDM para avançar nos milharais aconteceu no ano passado, com a aquisição da KWS na América do Sul, especializada no desenvolvimento de sementes de milho e sorgo e rebatizada como Supra Sementes.
“Foi um grande passo. Compramos uma empresa quase do mesmo tamanho que a nossa”, disse, à imprensa, na época, Ignacio Bartolomé, no comando do GDM desde 2022, quando seu pai, Gerardo, se aposentou.
Figueiredo foi para a GDM junto com a aquisição da KWS. A estratégia é simples: no Brasil, atualmente o maior mercado do grupo, o uso do etanol feito a partir do milho saltou 30,7% em 2024/25, para 8,19 bilhões de litros, segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica).
O milho é usado nos Estados Unidos para produção de álcool desde o século 19. No Brasil, o uso do grão para fazer biocombustível ganhou força em 2012, quase 90 anos após o início da produção de etanol de cana, diante da alta disponibilidade do produto.
Em 2024 o milho já representava 19% de toda a produção de etanol do país. “A demanda de milho para geração de energia é o novo ‘drive’ de crescimento de nossa empresa. Com nossa tecnologia, a mesma tonelada de grão já está produzindo mais litros de combustível”, disse ao AgFeed Ignacio Bartolomé.
Mas como isso é possível, se a aquisição da KWS aconteceu há pouco mais de um ano? “O desenvolvimento de uma nova semente leva de sete a dez anos”, explica Figueiredo. Mas o trabalho nos laboratórios da GDM, adquiridos da KWS, em Patos de Minas, no interior mineiro, é escalonado em sete estágios de pesquisas diferentes.
Cada equipe de engenheiros e pesquisadores de desenvolvimento trabalha num projeto. “Assim, conseguimos um ganho de melhoria nas sementes de milho entre 1,5% e 2% ao ano - é uma verdadeira linha de produção”, diz o diretor, que comanda uma equipe de 50 melhoristas, como são chamados os especialistas.
Modificando genes da própria planta com precisão cirúrgica, sem necessidade de inserção de DNA externo, a GDM consegue que o milho se desenvolva mais rápido, seja mais tolerante a doenças, e produza mais.
Além disso, a vantagem para o produtor é que, ao contrário de outros itens geneticamente modificados com DNA externo, a aprovação do uso dessas sementes tem trâmites mais flexíveis em diversos mercados, por não ser considerada transgênica.
A GDM está presente no Brasil há 20 anos e, desde 2015, o país tornou-se o maior mercado da companhia.
“No Brasil, realmente, o produtor, tem hoje a melhor combinação desses dois mundos: tecnologia, melhoria da produtividade, e um solo rico. Para nós, então, o Brasil é o melhor lugar do mundo. O faturamento da nossa empresa cresce porque cresce a demanda de sementes, porque cresce a área plantada no Brasil”, diz o presidente.
No ano passado faturou algo em torno de US$ 950 milhões (a empresa não divulga balanço). A meta é chegar a US$ 1 bilhão, graças ao milho.
No início de setembro, o grupo completou a compra a AgReliant Genetics, que comercializa sementes de milho e soja nos Estados Unidos e no Canadá. A aquisição faz parte do plano de R$ 1 bilhão para encampar novas companhias e criar novos produtos nos próximos cinco anos na América do Sul.
“Por enquanto não devemos fazer novas compras, queremos fazer a consolidação desses novos negócios que entraram para o grupo agora”, disse Bartolomé, que antes de trabalhar na companhia da família, fez carreira na Louis Dreyfus Company, centenária empresa global de agronegócio, líder no comércio e processamento de produtos agrícolas.
A produção brasileira de milho na safra 2024/25 foi estimada em cerca de 128,3 milhões de toneladas, com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), um crescimento de 9,9% em relação à temporada anterior.
A expectativa de produção brasileira de sementes de milho pelo GDM no ano que vem é de algo entre 120 mil e 150 mil sacas de sementes. Em cinco anos, a meta é chegar a 1 milhão.
E a soja?
“Também estamos, por exemplo, pesquisando e lançando sementes de soja que produzem mais óleo. Ou seja, com a mesma tonelada de grão, se produz mais litros de combustível”, diz Ignacio, presidente do GDM. Tudo isso focado na produção de biocombustível.
A GDM consegue essa maior produção de óleo - tanto de soja quanto de milho -- de uma maneira simples: Por meio do melhoramento genético das sementes de soja, a companhia consegue que o grão seja mais sadio, o que rende mais óleo.
Além disso, o ciclo de desenvolvimento da planta é mais rápido. Tão rápido que chega a ser 30 dias mais curto do que com a semente tradicional de soja, segundo a empresa. Isso possibilita que o produtor faça a troca de cultura - de soja para o milho - um mês mais cedo no ano.
“Encurtando esse ciclo da soja e adiantando o plantio do milho, ele aumenta a produção da safrinha porque aproveita um período mais úmido, antes da seca e acaba produzindo mais, o que também gera mais óleo”, explica Figueiredo.
Resumo
- Com presença na genética de sementes de 80% da soja brasileira, a argentina GDM está aumentando investimentos no milho.
- A previsão da empresa é produzir entre 120 mil e 150 mil sacas de sementes de milho em 2026, de olho no crescimento do etanol de milho.
- GDM está investindo ainda no desenvolvimento de sementes de soja com maior teor de óleo, para atender a demanda por biocombustíveis.