Historicamente, o crédito concedido para o agronegócio é muito seguro para os bancos. A inadimplência é baixa, até pela necessidade de capital dos produtores para financiar o custeio e os investimentos em suas propriedades.

No Banco do Brasil, que é o maior agente financeiro do setor, o índice de atrasos acima de 90 dias nas operações de crédito rural sempre ficou próximo de 0,50% da carteira, tendo o melhor comportamento em relação aos outros dois segmentos, de Pessoa Física e Pessoa Jurídica.

Nessa comparação, o cenário não mudou. O agro continua com a menor inadimplência dentro do BB. Mas em 2023, ela aumentou muito.

Depois de bater 0,60% ao final do primeiro trimestre de 2022, a inadimplência do agronegócio começou a cair e fechou o ano em 0,52%, com uma cobertura, ou seja, um colchão de provisões para cobrir as operações mais arriscadas, de quase 250%.

Em 2023, a proporção de atrasos superiores a 90 dias voltou a ficar próxima de 0,60% da carteira no primeiro semestre. A partir do início da safra 2023/2024, a situação piorou e, em dezembro, a inadimplência atingiu um pico de 0,96%.

Trata-se da pior marca do BB desde o fim do período mais crítico da pandemia de Covid-19. Em 2020, os atrasos chegaram a ficar acima de 3% da carteira. Esse índice foi se normalizando ao longo de 2021 e, ao final daquele ano, voltou para 0,60%.

A direção do banco não trata esse momento como uma “crise” e ressalta que boa parte das contratações contam com garantias. Mas nesse aspecto, o cenário também já não é tão bom quanto.

Segundo o balanço divulgado pelo BB na quinta-feira, dia 8 de fevereiro, e apresentado à imprensa e aos investidores nesta sexta-feira, dia 9, a safra 2023/2024, até dezembro, tem quase R$ 48 bilhões em crédito liberado para custeio agrícola.

Desse total, pouco mais da metade, ou 53%, contam com algum tipo de mitigação de risco. O seguro agrícola cobre um total de 43% das operações, e os outros 10% contam com proteção do Proagro, que é um programa governamental de garantias.

Na safra 2022/2023, as operações com garantia respondiam por quase 58% do total e em 2021/2022 esse índice ficou próximo de 60%.

Ao mesmo tempo em que a inadimplência está em trajetória de alta, o índice de cobertura da carteira mais arriscada no agro caiu significativamente.

Em setembro de 2023, essa cobertura estava em 214,5% e, em dezembro, recuou para pouco mais de 186%.

Essa cobertura tem um patamar mínimo exigido pelo Banco Central, mas geralmente as instituições financeiras trabalham com uma grande folga em relação a essa exigibilidade. Mesmo assim, é a primeira vez que o BB tem cobertura abaixo de 200% desde setembro de 2020.

A carteira de crédito continua crescendo, mas em 2023 o ritmo foi mais modesto. O saldo chegou a R$ 355,3 bilhões em dezembro, um avanço anual de 14,7%.

Segundo Luiz Gustavo Lage, vice-presidente de Agronegócios do BB, a carteira do banco vinha de alguns anos com crescimento muito forte. “Fica mais difícil manter aquele ritmo quando se chega ao patamar que temos hoje”, afirma.

Em 2021, a carteira de crédito ampliada do BB, que inclui CPR e outros títulos, cresceu quase 30%. Em 2022, o avanço foi de quase 25%.

“Agora, o crescimento da carteira voltou a um ritmo que pode ser considerado ‘normal’. E quanto à inadimplência, o volume que temos de provisões nos deixa bem protegidos”, afirma Marco Geovanne, vice-presidente de Gestão Financeira e de Relações com Investidores do BB.

Para Lage, o agronegócio brasileiro passa por uma “reacomodação de preços das commodities”, além dos impactos dos eventos climáticos provocados pelo El Niño.

“A previsão da Conab ainda é de uma das maiores safras da história. Nós vamos continuar monitorando as colheitas. Vemos problemas localizados e pontuais, mas não acho que dá para chamar de crise”, afirma o VP de agro do BB.

Ele lembra que, na maioria dos casos, as margens para os produtores rurais ainda é positiva. “Os custos de produção ficaram 25% abaixo da safra anterior, em média. O setor se modernizou muito nos últimos anos, e está mais resiliente para enfrentar dificuldades”, afirma Lage.

Um ponto destacado pela presidente do BB, Tarciana Medeiros, é o aumento da carteira de negócios sustentáveis dentro do agronegócio.

Na categoria Boas Práticas Socioambientais, a carteira bateu os R$ 91 bilhões, com crescimento de 11,5% em um ano. Para Agricultura de Baixo Carbono, foram R$ 66 bilhões, com queda de 2,5% em relação a 2022.