A rotina de João Paulo Luque, CEO da AFS Capital, tem sido agitada. Mesmo sendo um “faria limer”, seu local de trabalho tem se dividido entre aeroportos e cidades distantes do centro financeiro paulistano e espalhadas pelo País.
A AFS Capital é uma holding que distribui serviços financeiros de mais de 60 instituições financeiras, locais e estrangeiras, como wealth management, crédito e câmbio, para clientes variados. Atende empresários e companhias de setores como óleo e gás e até mesmo jogadores de futebol aposentados.
O negócio, que recebeu investimento do BTG Pactual, foi criado em 2021 e no começo do ano seguinte começou a atuar com clientes do agro. Hoje o segmento representa 70% do faturamento da empresa.
“Tenho rodado pelo Mato Grosso, Pará, Matopiba e até Roraima, que vejo como uma nova fronteira agrícola. Conseguimos criar uma tese legal e costumo brincar que, se eu pudesse, deixava de fazer tudo e faria só agro. É muita oportunidade”, conta Luque ao AgFeed.
A ideia do negócio, segundo afirma o CEO, é ser uma espécie de Uber ou Airbnb dos serviços financeiros por aqui. Da mesma forma que essas gigantes atuam em serviços sem ter frota ou edifícios próprios, a AFS Capital quer trazer esse “cardápio” de alternativas financeiras para os empresários.
“É quase que um marketplace de bancos e fundos. Através de nós, esse cliente pode acessar todo o mercado”, explica Luque.
Apesar de ter o BTG como parceiro, a holding oferece serviços de bancos pequenos, médios, locais e estrangeiros, além de fundos de investimento e fintechs que atuam com crédito. Além disso, atua com linhas de financiamento público e, no ano passado, passou a operar com linhas de crédito do Plano Safra.
De acordo com João Paulo Luque, a expectativa é fechar o ano de 2024 com um faturamento próximo aos R$ 50 milhões, o que, segundo ele, dobraria a receita do ano passado.
No modelo de negócio, a AFS ganha uma porcentagem dos negócios fechados que ela intermediou. No ano passado, foram originados R$ 3,2 bilhões em operações que envolvem crédito, dos quais R$ 780 milhões foram aprovados.
A ideia é originar, neste ano, R$ 5 bilhões em crédito. A carteira de Wealth Management deve dobrar, indo de R$ 1,5 bilhão sob gestão para R$ 3 bilhões, segundo Luque.
O braço de Wealth da AFS é 65% agro. Nas operações de câmbio, 55% vêm do segmento e no crédito, 60%. As três operações são as mais relevantes da holding.
Dentre os clientes do agro, Luque conta, sem citar nomes, que a AFS atende revendas agrícolas, indústrias de insumos e produtores de todos os patamares. Além disso, artistas ligados ao mundo sertanejo também estão na carteira.
Em 2024, a empresa ainda pretende criar uma plataforma digital, que irá aglutinar todos os serviços da empresa. “Temos o objetivo de chegar até o final de 2026 faturando R$ 100 milhões”, declara.
Luque revela ao AgFeed que a AFS quer passar a atuar com produtos financeiros próprios esse ano, deixando de ser apenas uma distribuidora de terceiros.
“Temos um plano de ter, no segundo semestre, uma gestora, para consolidar portfólio. Queremos ter nosso próprio Fiagro, fundo de fazenda e fundo de distressed (que atua com empresas em RJ). Dessa forma, internalizamos o risco”, acrescenta.
De muambeiro a banqueiro
O presente metade faria limer e metade viajante disfarça, contudo, a origem de Luque. “Sou um cara improvável”, declarou.
Nascido e criado em São Bernardo do Campo, próximo da capital paulista, ficou órfão de pai aos dois anos, quando passou a ser criado apenas pela mãe, empregada doméstica.
Entre o ensino em escola pública e o sonho de ser jogador de futebol, ele acabou se formando num curso técnico em gestão comercial. Com poucas alternativas de trabalho, o “bom vendedor”, como ele se considera, passou a viajar ao Peru para trazer mercadorias. “Fui muambeiro, buscava roupa, relógio e roupas para revender, até que fui pego na alfândega e perdi tudo”, conta.
Seu caminho, ainda como muambeiro, se cruzou com a mulher de um diretor do HSBC. Luque revendia os produtos que ela trazia dos EUA. O diretor então decidiu dar uma oportunidade para Luque no banco. “Tu é um bom vendedor”, teria dito o banqueiro ao jovem João Paulo Luque.
Então, conta, ele entrou no banco com uma missão de abrir 50 contas por mês. “Minha essência sempre foi essa de andar muito e ir atrás dos clientes. Ou eu fazia isso ou estava ferrado”.
Em quase oito anos no banco, época que Luque trata com saudosismo, foram seis promoções, que o levaram para o Bradesco, onde ficou cerca de um ano.
Em 2017, com o sonho de ser banqueiro, conheceu a XP e o sistema de agentes autônomos e virou sócio na Monte Bravo, um dos maiores escritórios associados à empresa. Na época, a empresa tinha R$ 1,5 bilhão sob gestão. Hoje, são mais de R$ 30 bilhões.
A experiência na Monte Bravo foi curta e, em 2018, ele e outros cinco sócios montaram uma boutique de investimentos chamada High Capital, que acabou mudando o nome para HCI Invest. “Em 11 meses captamos R$ 1 bilhão”, conta.
A AFS Capital entrou na jogada em 2021, quando Luque foi procurado pelo BTG. O banco é o único sócio-investidor da empreitada e tem um acordo de exclusividade nos serviços de investimento que a empresa presta. No restante, a holding opera com autonomia, conta Luque.
A ideia de partir para o agro chegou em 2022 e, ainda sem uma expertise prévia no setor, Luque traçou uma agenda com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e com associações como Abrapa, Aprosoja, Abramilho e Abipesca.
“Sentei com diretores, presidentes e executivos para entender a demanda de cada cultura e os serviços que eles não conseguiam encontrar no mercado financeiro. Foi ali que construí essa tese de múltiplos bancos”, conta.
Nesse meio do caminho, além de bancos e fundos, a AFS fez contratos também com instituições públicas como o Banco do Brasil e com a Caixa, para atuar com linhas do Plano Safra.
Além disso, a holding criou uma nova subsidiária nos últimos meses, a Amazônia Finance. A ideia dessa vertente é estruturar projetos para captar recursos subsidiados do BNB (Banco do Nordeste) e do BASA (Banco da Amazônia), que envolvem também projetos de inovação do Finep.
Em 2022, ele apresentou a AFS Capital numa sabatina do Mapa feita na Escola Nacional de Gestão Agropecuária e, a partir daí, criou o braço da AFS voltado para o agro, a AFS Agro.
Para ver se o negócio funcionaria na prática, decidiu implantar uma loja física da AFS na cidade de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, um polo do agro na região.
Em seis meses, diz, todas as linhas de negócio - crédito, câmbio, M&A -. apresentaram resultados positivos, o que fez a empresa começar a “subir o mapa” – hoje a matriz da AFS Agro fica em Maringá (PR).
O avanço seguiu para o estado de São Paulo, na região de Viradouro e Bebedouro, e depois a AFS passou a desbravar o Centro-Oeste. Primeiro em Brasília, onde montou um escritório, e posteriormente nos outros estados produtores.
“Começamos no Mato Grosso do Sul, em Dourados, depois fomos para o Mato Grosso, em Sorriso e Primavera do Leste. Estamos conversando para atuarmos em Rondonópolis, na Região do Araguaia e também em cidades do Matopiba”, diz.
Nessas regiões, ele atua com representantes comerciais. Luque explica que primeiro esse profissional começa a fazer negócios e depois de um certo faturamento, é cogitado abrir o processo de lojas. “Não somos franqueadora. Somos uma empresa nacional com sócios-representantes”, diz.
A unidade de Cruz Alta é a única loja física da empresa por enquanto. Até 2025, a ideia é ter 36 lojas espalhadas pelo Brasil. Neste ano, Luque espera a inauguração de quatro lojas até junho, ainda a serem definidas.
A reportagem do AgFeed conheceu Luque em Sorriso (MT), há algumas semanas, em uma dessas viagens que ele tem feito. Por lá, ele conta que, além de uma reunião com o prefeito da cidade, organizou um jantar com 20 empresários e produtores da cadeia do agro. “Desde o cara que faz a fundação do armazém até o produtor”.
A estada, embora curta, foi encerrada com um café da manhã com outros empresários para estruturar uma usina de etanol de milho na cidade. “Queremos que o empresário ou produtor procure a AFS na cidade em que ele esteja” conclui João Paulo Luque.