A principal rota de descarbonização da aviação mundial é o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), que vai permitir às companhias do setor continuar transportando milhões de passageiros por dia com uma pegada de carbono bem menos intensiva que a do querosene utilizado atualmente.

Maior produtora de etanol de milho da América Latina, com uma receita de R$ 14,9 bilhões apenas no ano passado, a companhia Inpasa não poderia ficar de fora do novo mercado que está se formando.

A empresa acaba de dar um passo importante ao conquistar a certificação ISCC CORSIA, que segue critérios estabelecidos pela ICAO (sigla em inglês para Organização da Aviação Civil Internacional) para conferir que o seu biocombustível segue padrões internacionais para a produção de SAF. Dessa forma, a Inpasa agora está habilitada a vender etanol e óleo de milho para as empresas produtoras de SAF.

Christopher Davies Junior, diretor de sustentabilidade da Inpasa, explica que o etanol produzido pela companhia por si só não basta para ser utilizado nas aeronaves, mas precisa passar por um processo de desidratação conhecido como alcohol-to-jet (ATJ), uma das rotas de produção do SAF. "A gente também vai poder fornecer etanol para o ATJ.", afirma.

A certificação foi concedida à unidade da Inpasa em Dourados, que está em operação desde 2022, produz etanol, DDGS, óleo vegetal e semirrefinado, ácido graxo e energia, e só no ano passado, processou 2 milhões de toneladas de milho.

A planta também está habilitada a fornecer outra matéria-prima para a produção de SAF: Technical Corn Oil (em português, óleo técnico de milho). Esse óleo é um resíduo do processamento do milho e é extraído durante o processo de fermentação e destilação dos grãos. Também não passa pelo mesmo processo de refinação do óleo de milho consumido na alimentação humana.

A companhia hoje consegue produzir 305 mil toneladas de TCO por ano. Apesar de a planta de Dourados ter sido certificada, nada impede que as outras quatro fábricas da Inpasa possam fornecer óleo, segundo Davies Junior. "Dourados é meio que um hub, está certificado para TCO e, através desse hub, a gente habilita as outras indústrias que a gente tem no Brasil também para ter óleo para o combustível de aviação", afirma o diretor da Inpasa.

O SAF é relevante porque pode reduzir em até 80% as emissões de CO₂ ao longo do ciclo de vida do combustível, quando comparado ao querosene de aviação convencional.

No ano passado, foram produzidas apenas 1,3 bilhão de litros de SAF, correspondente a apenas 0,3% da produção global de combustível de aviação, segundo a Associação Internacional das Empresas Aéreas (IATA, na sigla em inglês). A meta da IATA é de atingir 65% de uso de SAF em toda a aviação até 2050, como parte do compromisso de zerar as emissões líquidas de carbono no setor.

A produção de SAF ainda é incipiente no mundo e no Brasil, onde ainda não há fabricação do combustível em escala comercial.

Até o momento, Petrobras e Raízen são as companhias mais à frente em seus planos de produção. Inicialmente, a primeira dizia que iria produzir SAF a partir de óleo vegetal ou de gordura animal a partir de duas refinarias em Cubatão (SP) e no Rio de Janeiro (RJ).

Em setembro do ano passado, uma reportagem da agência Bloomberg informou que a Petrobras também planeja utilizar etanol de cana-de-açúcar ou de milho em seu ciclo produtivo de SAF.

A Raízen recebeu a mesma certificação que a Inpasa para o seu etanol, produzido na usina Costa Pinto, em Piracicaba (SP), em 2023. Em abril do ano passado, a companhia enviou 25 milhões de litros de etanol para os Estados Unidos, a ser utilizado pela planta da produtora de combustíveis sustentáveis LanzaJet no estado da Geórgia.

A companhia americana, que tem como investidores empresas áereas como British Airways e Southwest Airlines, inaugurou a planta, que é a primeira indústria comercial de SAF a partir do etanol, em janeiro de 2024. A fábrica tem capacidade de produzir cerca de 38 milhões de litros de combustível sustentável por ano.

Questionado se a Inpasa vai passar de fornecedora a produtora de SAF no futuro, Davies Filho despista. “A gente tem que estar preparado para ter a matéria-prima para essas rotas, mas se ela vai produzir ou se ela vai só vender a matéria-prima, isso não ainda foi definido. A empresa é muito dinâmica, mas até onde sei, ainda não foi definido.”

Enquanto a tecnologia do SAF ainda engatinha, a Inpasa segue firme em sua produção de etanol. No ano passado, a empresa disse que investiu em sua operação brasileira R$ 4,9 bilhões.

A Inpasa vem num crescimento acelerado desde que chegou ao Brasil na década passada. Criada em 2006 no Paraguai, onde hoje possui duas unidades, nas cidades de Nova Esperanza e San Pedro, a companha inaugurou sua primeira planta brasileira em Sinop (MT), em 2019. No ano seguinte, foi a vez de uma fábrica em Nova Mutum (MT) entrar em operação, seguida por Dourados (MS) em 2022, e Sidrolândia (MS), em 2022.

Os investimentos mais recentes foram feitos na ampliação da planta de Sidrolândia (MS), que passou a operar desde fevereiro com uma capacidade de produção de 800 milhões de litros de etanol e na criação de unidades em Balsas, que foi inaugurada em março passado, e em Luis Eduardo Magalhães (BA), com previsão de inauguração no começo de 2026.

Resumo

  • Inpasa recebeu a certificação ISCC CORSIA, que permitirá vender o biocombustível e óleo para usinas produtoras de combustível sustentável da aviação no futuro
  • Certificação foi concedida à unidade de Dourados, que processou 2 milhões de toneladas de milho somente no ano passado
  • Companhia está apta também a fornecer óleo de milho não refinado, outra matéria-prima para a produção de SAF