Grandes grupos brasileiros, como JBS, Marfrig e Minerva, atingiram bons índices de conformidade socioambiental do gado que compram na Amazônia em um levantamento divulgado nesta quarta-feira, dia 14 de maio, pelo Ministério Público Federal (MPF), que apresentou os dados do segundo ciclo unificado de auditorias em 89 frigoríficos de seis estados da região, onde está a maior parte da produção bovina nacional.

O índice geral de conformidade foi de 96%, considerando frigoríficos que assinaram o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Carne Legal com o MPF e se comprometeram a contratar auditorias independentes para apurar eventuais irregularidades em suas operações na Amazônia.

Ainda nesse cenário, de empresas que contrataram auditorias, o percentual de não-conformidade foi de 4%.

Já no recorte que considera empresas que não contrataram auditorias, o índice de não-conformidade geral passa para 52%. Esses frigoríficos não fizeram auditorias independentes por conta própria, mas passaram por análises automáticas feitas pelo MPF, sem possibilidade de questionamentos sobre dados imprecisos.

Os números consideram o período que vai de janeiro a dezembro de 2022.

Dos três grandes frigoríficos brasileiros, Marfrig e Minerva apresentaram o melhor desempenho, com 100% dos animais auditados em conformidade ambiental nos estados do Pará, Mato Grosso, Rondônia e Tocantins.

"Essa conquista por mais um ano, reforça o nosso compromisso com o combate ao desmatamento ilegal e a nossa contribuição para o desenvolvimento sustentável na cadeia agropecuária, além de evidenciar a robustez do nosso sistema de monitoramento geoespacial, que é auditado anualmente e se destaca pelos excelentes resultados", disse Tamara Lopes, gerente executiva de sustentabilidade da Minerva, em nota.

Logo após, vem a JBS, com 98,23% de seus animais auditados nos estados de Rondônia, Mato Grosso, Acre, Tocantins e Pará. O melhor desempenho do frigorífico dos Batista foi em Rondônia (99,23% do gado conforme), seguido por Mato Grosso (98,19%), Acre (98,14%), Tocantins (98,03%) e Pará (97,01%).

"Esse desempenho mostra que estamos muito próximos da meta de 100% de conformidade, número que vai refletir todo o empenho da companhia para a produção sustentável na Amazônia”, afirmou Liège Correia, diretora de Sustentabilidade da JBS Brasil, em nota.

Também chama a atenção o desempenho de frigoríficos médios como Frigol e Masterboi, ambos com 100% de animais em conformidade ambiental.

Apesar dos números positivos, ainda há muito a ser feito, isso porque nem todos os frigoríficos que participam do TAC necessariamente passaram por auditorias. Nos casos em que a empresa foi convocada a fazer auditoria e não respondeu ao chamado do MPF, o órgão faz uma avaliação automática.

"A gente analisa as guias de trânsito animal (GTA) para saber de onde ela está comprando gado, analisa a situação das fazendas, e tudo isso é rodado de modo automatizado pela nossa câmara técnica", explica Ricardo Negrini, procurador da República no Pará.

A diferença entre os dois processos, segundo Negrini, é a possibilidade de as empresas, nas auditorias, apresentarem justificativas e dados na hora de questionar números que eventualmente estejam inconsistentes.

A análise é feita por amostragem. Inicialmente, segundo o procurador Negrini, 100% das compras eram avaliadas, mas houve mudanças com o passar do tempo. "A partir de dois ou três ciclos, a gente começou a permitir que as empresas adotassem uma metodologia de amostragem que nós desenvolvemos, e principalmente as empresas que estavam em boa situação nas auditorias anteriores. Elas ganharam o direito de fazer por amostragem, que barateia os custos."

O procurador salienta também que os frigoríficos que apresentarem um desempenho ruim ou não apresentarem auditoria terão mais exigências a cumprir. "A gente vai passar a exigir que façam análise de todas as compras e não mais por amostragem", afirmou.

O MPF também trouxe dados envolvendo os fornecedores indiretos, as fazendas onde os animais passam pelas fases de cria e recria, antes de chegarem à engorda, e que hoje são o maior gargalo ambiental dos frigoríficos.

Em dados preliminares feitos com análise automática, o MPF constatou que 38% das cabeças de gado estavam em conformidade ambiental, 35% não tinham correspondência com o CAR da propriedade e 28% tinham potencial não-conformidade.

Entre as não-conformidades, estão gado com desmatamento (38%), gado de área com embargo (23%), gado em áreas protegidas (3%) e gado associado a trabalho escravo (menos de 1%).

O problema nos fornecedores indiretos é crescente, segundo Negrini. “Sabendo que os frigoríficos não conseguem monitorar os indiretos, muitos produtores rurais começaram a aproveitar essa brecha para fazer 'esquentamento de gado': manda o gado para uma fazenda que não tem problema ambiental para depois ir para o frigorífico”, disse o procurador.

A ideia, segundo o procurador do MPF, agora é desenvolver um protocolo de rastreabilidade de fornecedores indiretos, com o mesmo nível de exigência que hoje já existe para os fornecedores diretos.

“Não pode ter desmatamento, não pode estar em terra indígena, etc. A gente pode ter critérios e cronogramas e regras de transição, porque a gente sabe que tem muito indireto que está se adaptando, está correndo atrás. Tudo isso vai ser discutido internamente pelo MPF até a gente publicar uma regra”, diz Negrini.

Negrini salientou ainda que só se pode exigir essa regra se houver um acesso fácil aos dados. O MPF conseguiu fazer esse mapeamento inicial dos indiretos apenas ter acesso às GTAs de todo o ciclo produtivo da pecuária, o que os frigoríficos hoje não conseguem fazer.

“A gente só pode exigir essa regra obrigatória se a gente tiver certeza que os frigoríficos, no dia a dia, vão ter uma base para consultar. Se ele consegue consultar numa base os indiretos, ok. Se ele não consegue consultar, eu não tenho como exigir dele.”

O procurador criticou ainda o fato de o plano de rastreabilidade individual do Governo, que vai exigir o acompanhamento do ciclo de vida do rebanho brasileiro e será implementado de forma gradual até 2033, concentrar seu foco no aspecto sanitário das cabeças de gado, deixando de lado o ambiental.

“Se a gente olhar as diretrizes que o governo federal publicou sobre a rastreabilidade individual, a palavra ambiental não é citada no documento em nenhum momento. A palavra sustentabilidade não tem nenhuma citação no documento inteiro. É uma rastreabilidade voltada para identificar o gado e para entender a questão sanitária e olhe lá”.

Resumo

  • Grandes frigoríficos brasileiros apresentaram bons índices de conformidade ambiental em compras de gado na Amazônia em 2022, segundo o MPF
  • Índice geral foi de 96%, sendo que Minerva e Marfrig atingiram 100% e JBS ficou com 98,23%
  • Análise ainda não alcança auditoria de produção dos fornecedores indiretos, principal foco de problemas ambientais na pecuária brasileira