Na divisa entre os estados de São Paulo e Minas Gerais está a região da Alta Mogiana. Ali, entre montanhas que recortam o horizonte, onde o clima seco e ameno predominam, se concentra umas das principais áreas produtoras de cafés do Brasil.
Nessa região, a menos de 20 quilômetros de Poços de Caldas, está a Fazenda Cachoeira da Grama, uma propriedade histórica que desde 1890 está nas mãos da família Carvalho Dias.
Representante da terceira geração do clã, o produtor Gabriel de Carvalho Dias chegou à propriedade em 1994, mesmo ano em que a propriedade celebrava a colheita de sua centésima safra. Naquele ano também teve início a produção de cafés especiais da família.
Uma das pioneiras nesse segmento no Brasil, a propriedade é também uma das mais antigas fornecedoras de cafés de alta qualidade para a Nespresso no país. Dias conta que a parceria com a gigante suíça teve início em 2004.
“No começo fornecíamos em pequenas quantidades. Esse volume aumentou a partir de 2006, quando a Nespresso decidiu lançar a cápsula Dulsão do Brasil”, relembra.
Composta 100% por grãos arábicas, em uma mistura de grãos amarelos e vermelhos de bourbon, a cápsula ainda está presente no portfólio da companhia e marca parte importante da expansão dos negócios por aqui.
Nessa época, a Nespresso também começou a comprar mais café de outras regiões do país e desde então o portfólio só aumentou. Atualmente, a marca conta com mais de 70 variedades e se prepara para novos lançamentos no final do ano.
Isso em um cenário onde o consumo de cafés em cápsulas, apesar de pequeno e restrito ao público A/B, é um dos segmentos que mais crescem. “Há cinco anos, o segmento de cápsulas respondia a apenas 2% no Brasil e hoje tem 4% de participação no mercado de cafés, com tendência de continuidade do crescimento”, avalia Juliana Reis, gerente de marketing e sustentabilidade da marca.
De olho nesse movimento e no aumento do consumo de cafés pelo público mais jovem, em junho passado a companhia colocou no mercado as cápsulas de cafés com vitaminas B6 e B12 das linhas Vivida e Active.
Para atender a esse crescimento da demanda, a estratégia que começa no campo é fundamental para garantir o café não só em volume, mas em qualidade.
“Essa parceria nos dá uma tranquilidade maior, especialmente quando os preços do café estão mais baixos. Vendemos apenas uma parte de nossa produção para eles, mas com o pagamento do prêmio, a nossa remuneração muitas vezes transforma o que seria prejuízo em lucro”, avalia Dias.
A parceria com a Nespresso também acaba sendo uma garantia para os produtores, especialmente em tempos de tarifaço. Isso porque o café adquirido pela companhia no Brasil passa bem longe dos Estados Unidos e tem como destino as fábricas na Suíça, onde são processados e encapsulados antes de serem comercializados em todo o mundo.
Além das questões geopolíticas, as mudanças climáticas afetam cada vez mais a produção agrícola - especialmente a produção de café. Por isso, a companhia está investindo cada vez mais em medidas verdes, que garantam a continuidade da produção de café com baixa emissão de carbono.
Na ponta do consumo, as iniciativas envolvem o programa de reciclagem das cápsulas de alumínio, cuja meta é passar dos atuais 25% para 60% até 2030, o que inclui a ampliação de pontos de coleta. “Hoje temos capacidade para reciclar 100% das cápsulas”, explica Juliana.
A estratégia passa também pelo uso da borra de café para a produção de biometano, projeto que deverá ser implantado por meio de parcerias no Brasil. Questionada, a Nespresso não deu detalhes sobre o projeto.
No campo, essas ações passam pelo Programa AAA de Qualidade Sustentável e pela adoção da agricultura regenerativa.
A iniciativa é desenvolvida em parceria com a Rainforest Aliance e inclui o acompanhamento de consultores e técnicos para que os produtores invistam na melhoria da qualidade do café, no desenvolvimento econômico e social e na preservação do meio ambiente.
Atualmente, 97% dos 900 produtores que fornecem para a empresa no Brasil já estão integrados ao programa, mas Juliana revela que a meta é chegar a 100% em pouco tempo.Globalmente, cerca de 93% dos produtores que fornecem cafés para a Nespresso estão dentro do AAA.
“Essa meta faz parte da nossa estratégia de produzir cafés com emissão zero até 2030”, explica Juliana
Para os produtores que integram o programa, a Nespresso paga um prêmio extra, cujo valor varia entre 5% e 10% sobre o valor da saca de café. E para os produtores que adotam práticas regenerativas, há ainda um prêmio adicional de 15%. É o caso da Fazenda Cachoeira da Grama.
Dias explica que atualmente dos 411 hectares da fazenda, o cultivo de café ocupa 100 hectares. No passado, a área plantada foi quase o dobro, mas ele explica que com as dificuldades para contratar mão de obra, optou por diminuir a área nos últimos anos.
Agora, ele planeja ampliar aos poucos a área com o cultivo de variedades mais modernas e aumentar o volume de café fornecido para a Nespresso. Para isso, conta com o apoio técnico do engenheiro agrônomo Rhafael Martins, um dos 22 consultores do Programa AAA no Brasil.
“Estamos ao lado do produtor desde o planejamento da safra, no calendário de atividades e nas orientações sobre práticas regenerativas e adoção de tecnologias. Caminhamos com eles lado a lado”, explica.
A adoção dessas variedades mais resistentes à pragas e doenças e às oscilações climáticas é inclusive um dos aspectos incentivados pela Nespresso dentro do programa de agricultura regenerativa.
A companhia foi a primeira a adotar o uso do biochar - fertilizante orgânico produzido com resíduos de plantas queimados - em larga escala no campo, por meio de parceria com a startup NetZero.
Por ano, os produtores participantes do AAA fornecem cerca de 16 mil toneladas de resíduos para a produção do fertilizante, que resultam em 4 mil toneladas de biochar que serão utilizados nas mesmas lavouras.
Para fomentar a adoção dessa e de outras práticas, a Nespresso investiu em 2024 e 2025 cerca de R$ 5,4 milhões. Entre as práticas recomendadas estão o uso de plantas de cobertura, produtos biológicos, adoção da fertilização orgânica, investimentos em arborização e na renovação dos cafezais com variedades mais resistentes à pragas e doenças.
“Cerca de 80% do café comprado pela Nespresso no Brasil em 2024 veio de fazendas que já praticam a agricultura regenerativa. Nossa meta é chegar a 95% até 2030”, explica Juliana.
Além da maior remuneração, os produtos enxergam no campo as vantagens. “Temos propriedades que já registraram aumento de 10% no volume produzido com a adoção das práticas regenerativas”, afirma Martins.
O percentual de café que cada produtor comercializa junto à Nespresso depende da qualidade dos lotes. No caso da Fazenda Cachoeira da Grama, da produção que gira em torno de 2 mil sacas por safra, cerca de mil sacas são destinadas para a companhia suíça, segundo Martins. O restante do volume é comercializado para uma trade parceira da região.
Por ano, a companhia compra cerca de 500 mil sacas de café dos produtores brasileiros.
Juliana explica que a adoção da agricultura regenerativa visa não só reduzir as emissões no campo, mas dar condições para que a produção de café nas propriedades parceiras seja longeva.
“Sabemos que as oscilações climáticas têm cada vez mais impacto na produção de café e queremos ajudar os produtores a continuarem produzindo com qualidade e sustentabilidade por longos anos”.
Resumo
- Segmento de cápsulas já responde por 4% do mercado de cafés e Nespresso aposta na agricultura regenerativa para diferenciar seus produtos
- Cerca de 93% dos seus fornecedores no País estão dentro do Programa AAA de Qualidade Sustentável, que oferece suporte técnico e prêmios financeiros
- A companhia suíça pretende atingir 95% de cafés de agricultura regenerativa até 2030, com foco em enfrentar as mudanças climáticas e manter a qualidade dos grãos