Depois de apostas bem-sucedidas em setores como energia e telecomunicações, o BTG Pactual decidiu acelerar sua diversificação para o mercado de ativos florestais.

Há quatro anos, o banco lançou um fundo com o objetivo de conseguir US$ 1 bilhão em cinco anos para desenvolver projetos de restauração florestal na América Latina, com foco no Cerrado brasileiro. Os resultados até aqui têm sido promissores. Mais da metade da meta inicial de captação já foi alcançada – cerca de US$ 672 milhões – e a expectativa do banco é cumprir o planejado e dar um passo além.

Isso porque, além de avançar com seus projetos no Cerrado, o banco recentemente iniciou projetos de reflorestamento do fundo no Uruguai, e avalia agora oportunidades também na Amazônia Legal e na Mata Atlântica.

"Estamos no caminho para alcançar nosso objetivo. As coisas estão indo bem", resume Mark Wishnie, diretor de sustentabilidade do TIG, que conversou com o AgFeed durante sua passagem por São Paulo.

TIG é a sigla de Timberland Investment Group, subsidiária do BTG focada em ativos florestais, sediada em Atlanta, nos Estados Unidos, e que está tocando os projetos de reflorestamento. A julgar pelos números que divulga publicamente, pode-se dizer que o TIG hoje é um grande player em seu segmento: a subsidiária do BTG afirma ter US$ 7,3 bilhões em ativos sob gestão e compromissos firmados, como administrar 2,9 milhões de acres (1,1 milhão de hectares) e estar presente em 22 escritórios espalhados pelo mundo.

O TIG está na estrutura do BTG desde 2013, ano em que foi comprado pelo banco, mas sua história é mais antiga e começa em 1981, quando foi criado um fundo de ativos florestais, no extinto National Bank de Atlanta, nos Estados Unidos, que daria origem ao Regions Timberland Group.

Um ano antes de comprar o TIG, o banco já havia adquirido a TTG Brasil, empresa que havia sido criada em 2007 com o objetivo de atender à demanda de investidores institucionais que buscavam parceiros no Brasil – e que passou a integrar o TIG com a absorção do Regions Timberland Group.

Desde a criação, o foco da operação do TIG vem sendo a compra de áreas degradadas e transformação em florestas comerciais.

A subsidiária do BTG adquire terras em degradação e as restaura, plantando espécies exóticas, e as transformando em florestas comerciais com a ideia de obter recursos a partir da venda de madeira reflorestada anos depois.

A novidade, nos últimos anos, com o fundo de reflorestamento é que, além de transformar áreas degradadas em florestas comerciais, a ideia é também gerar créditos de carbono.

Isso acontece porque, nas áreas restauradas, segundo Mark Wishnie, a ideia é que metade dos territórios onde estão instalados os projetos seja destinada ao plantio de espécies exóticas para florestas comerciais e a outra metade receba espécies nativas para restauração e proteção dos biomas.

Assim, a partir do plantio de espécies nativas, há a expectativa de gerar créditos de remoção de carbono com os projetos, quando há possibilidade de retirar CO2 da atmosfera. E esses créditos tem o poder de atrair grandes empresas que têm metas de net zero a cumprir nas próximas décadas.

Não à toa, o braço de investimentos florestais do BTG fechou a venda de créditos de remoção de carbono para duas big techs no ano passado.

Primeiro, em junho do ano passado, a Microsoft acertou a compra de até 8 milhões de créditos de remoção de carbono até 2043, e depois, em setembro do mesmo ano, a Meta, dona de Facebook, Instagram e WhatsApp acertou a compra de 1,3 milhão de créditos de remoção de carbono, que podem ser adicionados com mais 2,6 milhões de créditos, até 2038.

“Nossa expectativa é que provavelmente teremos mais transações (com outras empresas) em 2026”, antecipa Wishnie.

Em paralelo, além das big techs, o TIG tem conseguido atrair novos investidores de peso ao seu fundo para a América Latina.

É o caso do BNDES, que aprovou um investimento de US$ 56 milhões (cerca de R$ 300 milhões) no veículo, e da GenZero, plataforma de descarbonização do fundo soberano de Cingapura, o Temasek, que aportou valores não revelados.

A tese é sólida e as credenciais de Wishnie também dão uma forcinha para que o projeto deslanche. O executivo está em sua segunda passagem pelo TIG e é um nome conhecido no mundo dos ativos florestais, onde vem atuando nas últimas duas décadas, e foi o fundador do TTG Brasil no passado.

Pés no Cerrado, olhos para Amazônia (e mais)

O foco dos projetos de reflorestamento do fundo, por enquanto, tem sido o Cerrado, onde o TIG vem restaurando 11 mil hectares localizados no Mato Grosso do Sul, que está dentro do bioma . A ideia é conectar mais de 40 mil hectares de habitat para a fauna local – o equivalente a um terço da cidade do Rio de Janeiro.

O start dos projetos pelo Cerrado não acontece por acaso. Afinal, por mais que não seja o bioma mais óbvio em termos de desmatamento e restauração florestal - a Amazônia é geralmente o primeiro nome que vem à cabeça - o Cerrado é tão desmatado (ou até mais) quanto a Amazônia, fato que não ganha a mesma visibilidade.

Em 40 anos, entre 1985 e 2024, o Cerrado perdeu 28% de toda a sua vegetação nativa, o equivalente a 40,5 milhões de hectares, de acordo com estudo da rede colaborativa Mapbiomas.

E o bioma continua perdendo áreas nativas no momento. Em agosto deste ano, por exemplo, o Cerrado registrava 5,5 mil hectares sob alerta de desmatamento, segundo dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe), órgão do governo federal. Já a Amazônia, por sua vez, tinha 4,4 mil hectares sob alerta.

Mas o desmatamento não está restrito apenas a esse ou aquele bioma. É por isso que o TIG não descarta desenvolver projetos de restauração florestal também na Amazônia e na Mata Atlântica, diz Wishnie. "Estamos avaliando as oportunidades na Mata Atlântica. E, ainda nas etapas iniciais, mas também olhando para a Amazônia Legal", adianta ele, econômico nos detalhes.

Abrangendo 17 estados do território brasileiro, indo do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, a Mata Atlântica foi o bioma nacional mais devastado ao longo das décadas, de forma que atualmente, segundo a ONG SOS Mata Atlântica, restam apenas 24% da floresta que existia originalmente e, desse volume, apenas 12,4% representam florestas maduras e bem preservadas.

Recentemente, em paralelo ao fundo de US$ 1 bilhão, o TIG anunciou um outro projeto na Mata Atlântica, com a varejista de móveis sueca Ikea, que tem o objetivo de restaurar 4 mil hectares de pastagens degradadas ou pouco produtivas nos estados do Paraná e Santa Catarina, localizados dentro desse bioma.

A ideia é recuperar essas áreas e criar florestas comerciais para comercialização de pinus. A iniciativa faz parte de um investimento de 100 milhões de euros para remoção e armazenamento de carbono feito anteriormente pela companhia sueca.

Wishnie salienta que o fundo para a América latina busca fazer investimentos em regiões com capacidade operacional e infraestrutura que possam suportar a estrutura.

“Onde temos acesso aos mercados, onde temos uma boa compreensão do crescimento das árvores e um ambiente de negócio favorável", explica o executivo do TIG. "Estamos procurando as características que irão suportar essa estratégia."

Como o fundo é voltado para a América Latina como um todo, não abarcando apenas o Brasil, projetos de restauração também começaram a ser executados em paralelo no Uruguai ao longo deste ano. "Por lá, nós estamos focando em uma região que é uma mescla de Pampa e de floresta. É uma floresta baixa, mas também é floresta", afirma ele.

O Pampa é um bioma pequeno - no Brasil, por exemplo, está presente apenas no Rio Grande do Sul - e por isso acaba sendo deixado de lado quando se pensa em desmatamento. Mas foi justamente o Pampa o bioma que mais perdeu vegetação nativa no Brasil entre 1985 e 2021, com 3,4 milhões de hectares a menos nesse período, de acordo com dados do Mapbiomas.

"As pessoas acham que o Pampa é só área de pasto, de grama. Mas também tem floresta", diz Wishnie. "O potencial que o Uruguai traz, em termos de restauração florestal, é menor do que no Brasil, é óbvio. Mas também há potencial por lá."

Esse potencial do Brasil tem oportunidades e desafios, sinaliza Wishnie. De um lado, há uma grande oportunidade pela quantidade de áreas passíveis de recuperação. Mas, de outro, ainda falta mais conhecimento sobre os projetos de restauração – especialmente projetos de restauração comercial, ainda uma novidade no país. E, mesmo assim, vários projetos de restauração estão sendo executados no país.

“Apesar de faltar muita informação, também tem vários projetos de restauração com alunos, professores estudando métodos, ou seja, tem já uma base”, analisa. “E isso é uma vantagem para o Brasil, mais do que em qualquer outro país da América Latina.”

Nesse contexto, no ano passado, o TIG assinou um acordo de pesquisa de longo prazo com a Universidade Federal de Viçosa para estudar técnicas de restauração do Cerrado. Um experimento de campo de 81 hectares – projetado pelo TIG, Conservation International e pelo Laboratório de Restauração Florestal da UFV – foi criado para avaliar a eficácia de diferentes métodos de restauração no bioma.

"Por meio de experimentos de campo rigorosos, estamos avaliando como diferentes abordagens afetam a recuperação da vegetação, do solo e da biodiversidade. Esta pesquisa fornecerá dados essenciais para refinar as estratégias de restauração, garantindo que os esforços sejam ecologicamente sólidos e escaláveis para uma aplicação mais ampla em paisagens degradadas da região", disse o professor Sebastião Venâncio Martins, do Laboratório de Restauração Florestal da UFV.

Diversificação

A aposta do BTG em florestas ajuda a contar uma história mais longa sobre os diferentes caminhos percorridos pelo banco ao longo das últimas décadas e que começa ainda com um dos criadores da instituição, o ex-banqueiro Luiz Cezar Fernandes.

Nome já consolidado no mercado financeiro, Cezar, como é conhecido, resolveu investir em empresas da economia real em meados dos anos 1990, com a criação de uma holding chamada Latinpart, que comprou participações de companhias como a fábrica de roupas de linho Teba, a produtora de suco de laranja CTM e a locadora de veículos Hertz, entre outras.

Mas nenhum desses negócios deu certo. Endividado e sem liquidez, Cezar foi vendendo sua participação no Pactual para fazer caixa na tentativa de salvar suas empresas. Só que as retiradas foram tantas que Cezar acabou perdendo, em 1999, o controle acionário do banco que criou para um grupo de sócios, cujo nome proeminente foi o de André Esteves.

Com Esteves à frente, o atual BTG Pactual seguiu um caminho diferente de Cezar. Com mais acertos que erros, obteve sucesso em sua estratégia de diversificar seu portfólio e hoje tem participação em empresas de setores da economia bastante diferentes entre si.

No setor energético, por exemplo, o BTG controla a Eneva, que atua na exploração, produção e comercialização de gás natural e líquidos; no varejo, é dono da Veste, que comanda marcas como Le Lis, Dudalina e John John; nas telecomunicações, tem o controle da V.tal, que tem a maior rede neutra de fibra ótica do país. E agora, com as florestas, tem tudo para se tornar um campeão em mais um setor da economia.

Resumo

  • O BTG Pactual vem acelerando investimentos em ativos florestais por meio de uma subsidiária, o TIG, que tem um fundo de reflorestamento que já captou US$ 672 milhões.
  • O fundo busca US$ 1 bi para projetos de restauração na América Latina e vem se dedicando ao reflorestamento no Cerrado.
  • O TIG também ampliou suas operações para o Uruguai, enquanto avalia possibilidades na Amazônia Legal e na Mata Atlântica.

Mark Wishnie, diretor de sustentabilidade do TIG