Desde que as tarifas de 50% para importação de café brasileiro pelos Estados Unidos entraram em vigor, em 1 de agosto, a expectativa era de que os preços da commodity subissem no mercado internacional - com uma maior demanda americana pelo produto de outros países – e caíssem no doméstico – que seria inundado com os grãos que deixariam de ser comprados pelos clientes da terra de Donald Trump.

Mas o que tem se visto nas últimas semanas é diferente disso. O preço do produto vem disparando no mercado internacional e internamente também. Isso é uma boa notícia para os produtores nacionais, mas não para os consumidores brasileiros.

Só nos últimos 30 dias, o preço da saca saltou 29% em Nova York e 30,9% em Londres. No mercado físico brasileiro, o café tipo arábica ficou 26,5% mais caro e o conilon, 33,4% no mesmo intervalo.

Desde o preço mais baixo do ano, em 6 de julho passado, quando a saca chegou a cair para US$ 278, o produto já se valorizou 38,4% em Nova York, para US$ 385.

Nas gôndolas dos supermercados, por sua vez, o preço médio do produto soma alta de 40% desde o início de agosto, embora tenha tido leve queda recente de 1,47%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em comparação com a quinzena anterior.

No campo, para a maioria dos produtores, o tarifaço de Donald Trump surtiu um efeito “altista” inesperado, mas bem vindo. A elevação internacional dos preços vem compensando para eles a baixa na produtividade.

Os motivos não são novos. Antes da pandemia, no início de 2020, a cotação em Nova York era de US$ 120 por saca de 60 quilos.

“De lá para cá, tivemos vários fatores climáticos, aqui, no Vietnã e em outras partes cafeicultoras do mundo que afetaram a produção. Por isso, os estoques globais estão em baixa e vêm fazendo os preços subirem”, diz Fernando Maximiliano, gerente de café da Inteligência de Mercado StoneX.

Em números aproximados, segundo ele, os estoques regulatórios globais ideais deveriam estar em torno de 50 milhões de sacas. Mas estão atualmente em 30 milhões.

“Por isso, o efeito das tarifas, que era para ser algo que derrubasse os preços no Brasil, estão na verdade pressionando os valores para cima, já que a oferta caiu”, diz ele.

Sem vender para os Estados Unidos e com oferta limitada, os produtores nacionais fizeram um rearranjo das vendas. Honduras e Colômbia -- que antes do tarifaço vendiam mais para a Europa -- passaram a suprir o mercado americano.

Os brasileiros, por sua vez, ocuparam os espaços que hondurenhos e colombianos deixaram na Alemanha e em outros países europeus. “Isso não é uma coisa que vai acontecer, já está sendo assim”, reforça o engenheiro agrônomo.

Marina Marangon, analista da Consultoria Agro do Itaú BBA, concorda. “As exportações de café brasileiras são bem mais disseminadas e não são tão concentradas em um país só, como acontece com carne bovina”, diz ela.

O problema é que os EUA são o maior consumidor de café Brasil e do mundo, dependendo da importação para suprir o mercado interno. Para dar conta dessa demanda, a Colômbia vem comprando café do Brasil para revender aos americanos, conforme dados preliminares da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). As compras do país vizinho, conforme a Secex, subiram 334% em agosto.

Os preços vão seguir subindo?

Com isso, a tendência é de que as altas continuem, segundo Marina. O Itaú BBA acredita que a safra brasileira que acabou de ser colhida agora deva ficar em 62,8 milhões de sacas – 11% abaixo da anterior.

Mais uma vez, fatores climáticos afetaram a produção, como a geada que aconteceu na primeira quinzena de agosto no Cerrado Mineiro.

Para a nova safra, a preocupação é com o regime de chuvas. O solo está mais úmido do que estava ano passado, o que é bom. Mas a possibilidade de as precipitações começarem com atraso, no fim da florada, em outubro, pode ser prejudicial.

Os modelos meteorológicos ainda preveem a possibilidade de tempo quente logo em seguida. Isso atrapalha muito o desenvolvimento das flores para que se tornem grãos.

Ou seja: há chances de mais uma safra menor. E como o Brasil é maior produtor e exportador do tipo arábica do mundo, volumes menores afetam os preços globalmente.

Para o produtor, o melhor momento para vender é agora, diz a especialista do Itaú BBA. “Neste momento, o agricultor vai ter a melhor relação venda versus custos de insumo dos últimos cinco anos. Então, essa alta é bastante positiva”, diz Marina.

Resumo

  • Café dispara até 38% após tarifas de 50% dos EUA, contrariando previsões de queda no Brasil
  • Estoques globais baixos e clima adverso sustentam altas. Produtores brasileiros se beneficiam, mas consumidores enfrentam café 40% mais caro
  • Para espcialista do Itaú BBA, momento é favorável para cafeicultores venderem seus estoques com melhor relação de preços em relação a custos de produção