Até o início desse ano era fácil resumir o cenário das principais cadeias do agronegócio: grãos com margens apertadas e situação confortável em setores como cana, laranja, café e proteína animal.

Tudo indica que na safra 2025/2026 a situação começa a ficar mais complexa. O principal fator é o aumento nos custos de produção, que vem sendo impactados, por exemplo, pela questão geopolítica, que acentuou a alta nos preços de fertilizantes.

“Para grãos, a gente entende que o cenário está um pouco pior (comparado à safra 24/25), principalmente por conta do milho safrinha, que está muito aberto, os custos virão maiores e tem muita coisa ainda para ser comprada. A soja preocupa um pouco menos, mas, ainda assim, também tem aumento de custo”, resumiu César de Castro Alves, gerente de Consultoria Agro do Itaú BBA, em conversa com o AgFeed.

Os números do Itaú BBA ilustram essa piora. Na soja, o custo de produção sobe de R$ 3.918 para R$ 4.223 por hectare na safra 2025/2026, que começa a ser plantada em setembro, mas que já está com boa parte dos insumos adquiridos.

Com isso, a margem dos produtores de soja, segundo o banco, deve cair de 41% em 24/25 para 34% nesta temporada. Isso porque só o preço dos fertilizantes, por exemplo, teria subido 20%. Para se ter uma ideia, no período em que os preços das commodities estavam nas alturas, a margem da soja em Mato Grosso, chegou a 67% na safra 2021/2022, pelos cálculos do banco.

Nesta simulação, a consultoria estima que os preços da commodity devem “andar de lado”, sem perspectiva de alta, e que a produção deverá crescer um pouco mais, saindo de de 169 milhões de toneladas em 2024/2025 para 175 milhões de toneladas na próxima colheita, o que confirmaria um novo recorde.

“A geopolítica está muito mais turbulenta nesse ano, muito mais incerto, inflação alta, o juro que não tem espaço para cair. Isso bate no agro diretamente. O produtor que ia investir deixa de investir, ele espera mais. Mesmo que  performe bem, tenha boa produtividade, ele vai ter um custo financeiro mais alto e muita gente está só trabalhando para pagar o custo financeiro”, alertou Alves.

Neste cenário, ele diz que uma continuidade nos pedidos de recuperação judicial “não pode ser descartada”.

“Nós estamos vivendo ainda uma ressaca, a gente vê alguns elos da cadeia ainda bem fragilizados. Então, com o produtor ainda entrando em um novo ano, também com os mesmos desafios, nós vamos depender do clima para salvar a produtividade para essa história não ficar ainda pior e compensar um pouco essas margens que são difíceis”, afirmou.

Se na soja não há perspectiva real de melhora, no milho a situação é ainda mais preocupante. Isso porque a cultura é altamente dependente de ureia, o fertilizante nitrogenado que mais sofre aumento de preço quando o conflito no Oriente Médio fica mais acirrado.

Além disso, segundo destacou o analista Francisco Queiroz, do Itaú BBA, durante encontro com jornalistas esta semana, apenas um terço dos insumos para o milho foram comprados para a safra 2025/2026.

É possível que o Brasil ainda registre um leve aumento na área plantada, mas em ritmo menor do que vinha avançando nos últimos anos.

Mesmo assim, o Itaú BBA prevê que a produção total de milho no País fique próxima do que está sendo consolidada nessa última safra, em torno de 130 milhões de toneladas. Isso porque, com insumo mais caro, é possível que produtor use um pouco menos de tecnologia na lavoura, portanto poderia ter uma produtividade um pouco menor.

A perspectiva de produtividade menor também leva em conta o fato de que esse ano o clima foi considerado “excepcional” para o milho segunda safra, que responde pela maior parte da produção, algo que não dá para contar no próximo ano.

No milho, a margem de lucro dos produtores deve cair de 27% para 21%, segundo o Itaú BBA. Outro fator negativo para a cultura é o preço que vem caindo nos últimos meses. De março até agora, em Sorriso (MT), o recuo teria sido de 37%, em função da oferta abundante com a “super safrinha”.

Proteínas tem cenário melhor

Quando milho e farelo de soja caem de preço, o efeito imediato é uma redução do custo dos produtores de proteína animal.

César Alves avalia esta indústria encontra um cenário melhor que na última safra, “porque o boi subiu bem de preço, o ciclo está caminhando claramente para melhor, para preços melhores. O frango e o suíno estão com exportações boas. O frango tem um problema de curto prazo, mas o suíno está espetacular”.

O problema para o setor de frango, no momento, ainda são os respingos do episódio de gripe aviária registrado esse ano no Brasil.

Os analistas do Itaú BBA se disseram esperançosos de que a situação de normalize com rapidez, elogiando a agilidade do Brasil em adotar as medidas sanitárias necessárias, o que já vem viabilizando a retomada de diversos mercados que, no primeiro momento, anunciaram o embargo ao frango brasileiro.

“Esperamos que os efeitos negativos dos embargos não sejam prolongados, dissipando-se sem comprometer o desempenho do ano, ainda que uma redução temporária no ritmo de produção possa ser necessária, o que já pode estar em curso”, diz o relatório do banco.

Em relação aos bovinos, o Itaú BBA avalia que “o cenário internacional segue positivo para o Brasil, com menor produção prevista nos EUA e Austrália, enquanto a China mantém forte demanda, apesar do risco de medidas de salvaguarda, o que sustenta a expectativa de preços firmes para a carne bovina brasileira”.

Culturas perenes

Mais uma vez uma vez cenário seguirá favorável para produtos como cana, café e laranja, segundo a análise do Itaú BBA. A situação, porém, já começa a mudar aos poucos, em função de preços mais baixos e custos de produção com perspectiva de alta.

“O café foi no céu, literalmente, os custos dessa safra colhida agora foram formados baixos. Então, mesmo com o café a um preço bem mais baixo, a margem ainda é boa”, avaliou César Alves.

O analista destaca que para o próximo ciclo, o custo da cafeicultura já será formado por valores elevados e as cotações do café começam a cair em função de uma percepção de que a produção global está se recuperando.

“O produtor de café, depende muito do tanto que ele vendeu ou não. Ele pode ter aproveitado muito desses preços mais altos, com o custo mais baixo, a margem vai ficar espetacular. Se ele não vendeu nada, a margem vai ser bem menor do que ele poderia ter”.

Na laranja, a expectativa é de manutenção das margens, já que, embora o preço esteja mais baixo, as produtividades estão melhores nessa safra.

Na cana-de-açúcar, o Itaú BBA está prevendo uma queda de 6% na produtividade, citando resquícios do problema das queimadas de 2024, que ainda afetam culturas perenes.

A queda no preço do açúcar, por ora, não teve trazer reflexos significativos para a cadeia, também “somente para o outro ciclo, já que as usinas estão muito fixadas”. Os analistas admitem que algumas usinas podem começar a produzir um pouco mais de etanol. Um dos fatores é a elevação para 30% da mistura de anidro na gasolina. Ainda assim, o mix deve seguir mais açucareiro por mais um tempo, segundo o banco.

Resumo

  • Relatório Visão Agro, do Itaú BBA, aponta safra 2025/26 com margens menores para grãos, especialmente milho, devido à alta nos custos de produção
  • A margem da soja deve cair de 41% para 34% e a do milho de 27% para 21%, se comparada com o resultado da safra 2024/2025
  • A pecuária e a suinocultura devem se beneficiar da queda nos custos de insumos, com destaque para a forte demanda da China