Cristalina (GO) - Com o mercado exportador majoritariamente para a países asiáticos, Egito e Turquia, os produtores brasileiros de algodão teoricamente estariam tranquilos com o anúncio do presidente norte-americano, Donald Trump de taxar em 50% os produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos.
Os dois países disputam a posição de maiores abastecedores do mercado global da commodity, mas o fato de o Brasil ser o sétimo maior consumidor de algodão e ter uma indústria exportadora pode atingir indiretamente os cotonicultores locais, caso o tarifaço seja aplicado a partir de agosto.
De uma produção estimada em quase 4 milhões de toneladas de pluma na atual safra brasileira, 730 mil devem ficar no País. O volume é destinado principalmente para o consumo da indústria têxtil, que também é exportadora.
“Os Estados Unidos respondem por 4% das exportações brasileiras (de têxteis), especialmente de jeans e produtos de cama, mesa e banho. Não seria um impacto ao ponto de a indústria quebrar, mas toda a cadeia vai ter de se reposicionar”, disse o diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Marcio Portocarrero.
Segundo ele, o varejo norte-americano “deve estar se preparando para cancelar contrato de compras” e o impacto, caso a tarifa entre em vigor, seria sentido pela cadeia toda. “Pode parecer pouco esse porcentual exportado pela indústria têxtil nacional, mas o impacto seria para a cadeia toda”, afirmou Portocarrero.
Em relação aos clientes externos para a venda de pluma, o cenário segue positivo, de acordo com o diretor-executivo da Abrapa. Toda a safra que será colhida até setembro já foi vendida e 60% da próxima, a ser plantada entre novembro e fevereiro, também já foi comercializada pelos produtores.
Cultura com maior custo de produção, com R$ 22 mil por hectare, em média, e manutenção - colhedoras não saem por menos de US$ 1,4 milhão e o investimento para uma estrutura de beneficiamento supera R$ 30 milhões - o algodão tem uma estrutura própria de financiamento, explicou Portocarrero.
Segundo ele, 30% do custo vêm do adiantamento das tradings compradoras, outros 30% são captados em operações de barter com empresas de insumos, até 20% em bancos com taxas diferenciadas. Os 20% restantes em operações de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs).
“Produtor de algodão dificilmente pega dinheiro do Plano Safra, pois o limite máximo de R$ 4 milhões de receita anual corresponde ao custo para o plantio de apenas 300 hectares”, afirmou Portocarrero.
Durante evento realizado pela Abrapa em uma propriedade produtora da commodity, em Cristalina (GO), esta semana, o diretor-executivo citou também os gargalos nos portos brasileiros, principalmente o de Santos, como outro fator que merece planejamento antecipado dos produtores de algodão.
“Santos responde por 74% das exportações brasileiras de algodão e todos os anos o produtor se antecipa e reserva um espaço no porto para fluir melhor o embarque. Mas o setor está sempre atrás de alternativas”, explicou Portocarrero.
A principal delas, de acordo com o diretor-executivo da Abrapa, é o Porto de Salvador (BA), cujo terminal de contêineres deverá ser a rota de saída para 100% da oferta de pluma produzida na região do Matopiba, segunda maior produtora do País. Outra alternativa é o Porto de Itaguaí (SC), rota de escoamento do produto de Mato Grosso.
“Salvador e Itaguaí ainda precisam de fluxo de contêineres, mas têm sido boas alternativas para Santos. E a melhor alternativa será a rota bioceânica, que proporcionará a saída dos bens pelo Pacíficio, o que reduziria de 10 a 15 dias o tempo para o envio das cargas aos clientes da Ásia”, avaliou Portocarrero.
Resumo
- Abrapa avalia que tarifas dos EUA devem afetar indiretamente os produtores de algodão, através da taxação de produtos têxteis brasileiros
- Cerca de 4% das exportações da indústria têxtil brasileira têm os EUA como destino, impactando toda a cadeia
- Apesar das preocupações, a comercialização do algodão segue aquecida — toda a safra atual já foi vendida e 60% da próxima também