No final de abril, a Organização Marítima Internacional (IMO) aprovou o uso de biocombustíveis, como etanol, para a navegação marítima. A medida caiu como uma luva para os planos da Citrosuco de transição sustentável.

Com US$ 350 milhões (quase R$ 2 bilhões, no câmbio da segunda-feira, 19 de maio) captados em quatro empréstimos sustentáveis nos últimos três anos, - o último de US$ 25 milhões junto ao Rabobank -, a maior produtora de suco de laranja do mundo já tem um projeto-piloto engatilhado para substituir o bunker, tipo de óleo comumente usado na navegação comercial, como combustível em seus navios.

Com cinco embarcações próprias e uma arrendada, a Citrosuco pretende testar, entre outros, o etanol como combustível no lugar do derivado de petróleo. Parte dos recursos captados recentemente vai para esse projeto, revelaram executivos da companhia ao AgFeed.

“A agenda marítima é o grande desafio nosso de carbono e tem alocação de capital para isso. Nós e o mundo inteiro operamos muito forte com o bunker e a gente está em testes e protótipos para os biobunkers e biocombustíveis”, disse Orlando Nastri Neto, head de ESG da Citrosuco.

Além do biocombustível a ser utilizado, o projeto prevê desde adaptação de motores de navios até uma regulação em mercados atendidos pela empresa e deve demorar cinco anos para se consolidar.

“É um grande desafio do mercado estrutural, porque você tem que ter oferta de combustíveis, tem que ter regulação, tem que ter eficiência, tem que ter adaptação de motores”, explicou Nastri.

O fato de ter operações de produção no Brasil e nos Estados Unidos, também maiores mercados globais de etanol, poderia, em tese, ajudar no projeto da Citrosuco.

Mas o desenho do modelo ideal passa por um planejamento interno e até com os fornecedores.

“A IMO aprovou esse movimento há apenas duas semanas, viabilizando uma agenda de oportunidades de biocombustíveis. Tivemos uma reunião estratégica com o time de operações para avaliar cenários de oportunidades”, explicou o executivo.

Para Camila Anaici, gerente global financeira da Citrosuco, além dos US$ 350 milhões captados no mercado, a própria companhia, que faturou US$ 1,7 bilhão (o equivalente a R$ 9,06 bilhões) no ano passado, encerrado em 31 de junho, também aporta outra fatia dos investimentos, cujos valores não foram informados.

“A agenda de ESG é real e não está só no papel. Ainda falando sobre os navios, a gente discute até mesmo se vai diminuir a velocidade para chegar ao destino, porque, dessa forma, vamos emitir menos carbono e atingir as metas”, completou a executiva.

Outro projeto na agenda são os megarreservatórios de água de captação de chuva para a irrigação de pomares. A companhia espera atingir 40 mil hectares de pomares irrigados, nas suas 28 operações agrícolas, e 2,6 milhões de metros cúbicos a mais de capacidade de reservação.

Segundo os executivos, a Citrosuco pretende chegar a 70% de áreas irrigadas - em algumas regiões o uso da água não é necessário por causa do melhor regime de chuvas -, e com o menor uso possível de captação de rios.

“Há preocupação real de como vamos construir um megarreservatório, porque não vamos utilizar água das regiões e das comunidades próximas”, afirmou Camila. “Em vez de capturar os recursos hídricos das outorgas que já temos, conseguimos de outros elementos, com inteligência, nas regiões mais críticas”, completou Nastri.

A Citrosuco já atingiu 10% de descarbonização nas operações industriais, logísticas e em terminais no Brasil e no exterior. Em breve, a companhia espera negociar seus primeiros créditos de carbono no mercado internacional.

No ano passado, durante a Climate Week, em Nova York, a Citrosuco lançou a PSA Carbon Agro, metodologia inédita de geração de créditos na citricultura. Os passos seguintes incluíram roadshows na Europa com mais de uma dezena de clientes.

E o momento ideal para o anúncio das vendas dos créditos será a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), em novembro, no Brasil. “Vai ter muita história boa e, em breve, teremos lançamentos e movimentos para comercialização desses créditos nos biomas da Mata Atlântica e Cerrado com metodologia inovadora da PSA Carbon”, afirmou Nastri.

Os programas integram “Compromissos ESG 2030”, que recentemente foi repactuado após o atingimento de parte das suas metas. Estabelecido a partir da safra 2020/2021, o programa tem seis temas: carbono; biodiversidade; água; gestão social; diversidade, equidade e inclusão; e cadeia de valor sustentável.

A Citrosuco espera reduzir em 28% as emissões de gás carbônico equivalente frente ao ano-base de 2019. Outros projetos incluem a eletrificação do terminal de Ghent, na Bélgica, que opera com energia 100% verde, rastreada e certificada.

A fábrica de Catanduva (SP) também alcançou 100% de energia renovável, e outros investimentos dessa natureza são implementados no terminal de Santos (SP) e em outras unidades.

Na parte social, o compromisso de alcançar 30% de representatividade de mulheres e pessoas negras em cargos de liderança até 2030. Segundo Nastri, com a repactuação, em 2025 a meta foi ampliada para assegurar 35% de mulheres e de 14% de pessoas negras em cargos de liderança até o final da década.

Outros investimentos

Para levar suco de laranja e outros produtos a mais de 100 países e com quase US$ 2 bilhões de faturamento anual, a Citrosuco investe US$ 30 milhões de dólares por ano em operações industriais em três fábricas, terminais, navios e operações agrícolas.

Ou seja, a empresa espera chegar ao final da década com US$ 150 milhões em aportes. Um exemplo: a cada safra são 3 milhões de novas mudas de laranja plantadas dentro do “fluxo normal de cultivo" para substituírem as erradicadas após o ciclo de, em média, 25 anos de vida de uma laranjeira em produção.

Após a safra 2024/2025, a menor em 35 anos com estiagem e temperaturas extremas, os executivos da Citrosuco esperam um alívio para a próxima temporada.

O Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) estima uma oferta de 314,6 milhões de caixas (40,8 quilos) de laranja no cinturão citrícola de São Paulo e regiões do Triângulo e Sudoeste de Minas Gerais em 2025/2026.

A oferta na principal região produtora da fruta e de suco de laranja do mundo será 36,27% superior e 4,8% maior que a média das últimas dez temporadas.

“Diferente do ano anterior, que foi bem desafiador, esse ano todas as condições climáticas ajudaram as nossas árvores, vai ser uma safra muito boa em termos de quantidade e de qualidade e ajudar a reduzir o nosso custo fixo”, disse Camila. “Então, a gente vai ter uma qualidade melhor e uma quantidade melhor de suco”, concluiu.

Resumo

  • Nos últimos três anos, Citrosuco captou US$ 350 milhões em financiamentos verdes. O mais recente foi em abril, de US$ 25 milhões, junto ao Rabobank
  • Um dos principais destinos dos recursos é em projetos para utilizar biocombustíveis, como etanol, como substitutos do óleo bunker em seus navios
  • Empresa já atingiu 10% de descarbonização nas operações e pretende negociar créditos de carbono durante a COP30

Camila Anaici, gerente global financeira da Citrosuco

Orlando Nastri Neto, head de ESG da Citrosuco