“O nome Courageous Land surgiu do fato de que eu sabia que deixar um ótimo emprego para fazer algo muito significativo, mas também perigoso de certa forma, exigia coragem", explica o americano Philip Kauders.
“Trabalhar na Amazônia, trabalhar para reflorestar, combater o desmatamento, etc., traz certos riscos e exige coragem. Então o nome é, na verdade, um recado para mim mesmo — um lembrete de ter coragem e perseverar na missão”.
O nome e o CEO podem até não ser brasileiros, mas a ambição, além de ousada, é 100% nacional. Fundada em 2022, a Courageous Land (CL) se posiciona como uma plataforma de agroflorestas.
Através de seu software, fornece diagnósticos e um verdadeiro dossiê para recuperar alguma área degradada e transformá-la em agroflorestas, já incluindo o investimento necessário e até um guia de culturas para os anos de projeto.
No mesmo programa, consegue aglutinar investidores interessados e uma espécie de marketplace para venda dos produtos cultivados em um desses projetos, incluindo créditos de carbono.
Philip Kauders, cofundador da CL que atua como CEO, conta ao AgFeed que a meta da companhia é instaurar 100 mil hectares de agroflorestas nos próximos 10 anos.
No curto prazo, ele cita que a empresa está com cerca de R$ 300 milhões em SPEs (Sociedade de Propósito Específico) de investidores para projetos que somam 5 mil hectares.
“Esse é o montante de project finance para os usuários da plataforma, que envolvem investidores de private equity, corporações e bancos, que querem investir em projetos que requerem bastante capital para produzir créditos de carbono junto com café e cacau. Nos posicionamos como um estruturador de projetos através da plataforma”, afirma o CEO.
Esses 5 mil hectares impactados contam com projetos de agrofloresta e também de silvicultura e áreas de conservação, acrescentou.
A plataforma da empresa foi oficialmente lançada ao mercado em setembro do ano passado e desde então, segundo Kauders, já foram cadastrados por lá cerca de 250 mil hectares. Nesses três anos de vida, ele cita alguns projetos que “já viraram realidade” em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Roraima e Bahia.
Para lançar a plataforma, a CL recebeu um investimento de R$ 6 milhões do Fundo Vale. Na mesma época, no final do ano passado, encerrou uma rodada de investimentos do tipo Seed.
Segundo informou Kieran Gartlan, sócio da The Yield Lab Latam, gestora que liderou a rodada junto da suíça Seedstars, em uma newsletter escrita por ele em maio deste ano, o aporte, que ainda contou com a americana K50 Ventures e profissionais do Goldman Sachs, ultrapassou os US$ 3 milhões. O montante, hoje, é equivalente a pouco mais de R$ 16 milhões.
Gartlan afirma que a tese da Courageous Land é algo que agrada a gestora, já que utiliza tecnologia para unir capital financeiro com oportunidade. A startup faz parte do portfólio do fundo de US$ 50 milhões da investidora.
“Hoje esse tipo de oportunidade existe, mas é fragmentada. A tecnologia que faz essa conexão, seja no agro ou no clima, é feita de uma forma que permite escala. Além disso, a startup tem um perfil de fundador que tem experiência não só em agro, mas também em business”, disse em uma entrevista recente ao AgFeed.
Philip Kauders é americano, nascido e criado nos EUA, e contou que começou a se interessar pelo universo de investimentos de impacto com 16 anos. Anos depois, estudou microfinanças e mercados emergentes e se formou na escola de negócios da universidade de Cornell.
Nesse meio tempo, fez dois intercâmbios, um para a Espanha e outro para o Chile. “Me apaixonei pela América Latina aí”. No mundo profissional, foi diretor de investimentos no banco Goldman Sachs em Nova Iorque e, em 2013, desembarcou no Brasil para atuar junto à gestora Tarpon.
De 2015 à 2022, atuou na startup unicórnio LTK, que atua conectando marcas e o universo de influenciadores, como o diretor responsável pela América Latina. Foi aí que resolveu juntar sua bagagem de finanças, tecnologia e o conhecimento em negócios de impacto que carregava desde a juventude para empreender.
“Comecei a ficar cada vez mais interessado em atuar para mitigar mudanças climáticas, e especialmente na interligação disso com a produção de alimentos, que é responsável por cerca de 30% das emissões de gases no mundo. Se não olharmos como fazer uma transição nessa parte, não resolvemos mudanças. As agroflorestas foram o pulo do gato”, comenta.
“Vi que podia regenerar áreas degradadas que não são produtivas e que nem performam bem financeiramente. Com isso, conseguimos plantar espécies misturadas, ganhar mais por hectare e sequestrar carbono”, resume.
Kauders então se juntou aos seus sócios fundadores Gilberto Terra e Luiza Avelar, dois ex-Vale que juntos fundaram sua própria agrofloresta em 2011, a Sucupira, localizada em Valença (BA). Os três se juntaram para escalar a ideia em todo o País na Courageous Land.
A meta dos 100 mil hectares em 10 anos é ousada, principalmente considerando que hoje a companhia tem um pipeline de R$ 300 milhões para 5 mil hectares. Nessa lógica, fazendo uma conta de padeiro, os 100 mil hectares demandariam R$ 6 bilhões, numa conta proporcional. Apesar disso, o CEO explica que cada projeto é único e feito sob medida, então o montante não é exato.
O retorno para o investidor hoje ainda está idealmente numa casa de 15 anos. “Cada projeto depende dos cultivos, mas dá pra dizer que a cultura atinge um bom patamar de lucratividade estável em sete anos, quando as árvores frutíferas estão já produzindo. Pensando no investidor, o retorno é de 10 anos para cima”, diz.
Com isso, a companhia hoje atua com esse modelo que demanda investimentos pesados para os projetos, mas com o tempo, quer mudar esse perfil.
Kauders cita que há esse tipo de investidor que quer tomar o risco do desenvolvimento, e com isso, conquistar um retorno maior no futuro. Com o mercado de agroflorestas amadurecendo, ele vê possibilidade em uma estrutura que atraia investidores menores que desembolsam menos e, consequentemente, tenham menos retornos.
“É quase como uma renda fixa, ou um FIPE listado para ganhar uma porcentagem mensal. Queremos no futuro popularizar o cheque. Pensando na fatia inicial, projetar um investimento de retorno em 10 anos já elimina a imensa maioria de investidores, que não conseguem ter essa iliquidez toda”, explica.
Na plataforma da CL, Kauders cita que há todo tipo de investidor, desde pessoas físicas até “megacorporações que faturam mais de R$ 100 bilhões por ano”. “Temos tudo na plataforma, em todos os cantos do mundo”.
A plataforma hoje ajuda a fazer o diagnóstico de forma gratuita, e exige apenas que o interessado informe alguns dados de localização ou número do CAR (Cadastro Ambiental Rural), por exemplo.
“O modelo de plataforma foi uma virada de chave porque une pessoas, fazendas, corporações, assets, grandes empresas como SalesForce e Vale e operadores de agroflorestas. Todos precisam desse apoio de backoffice, e a plataforma oferece isso e também assistência técnica, financeira, gestão e venda da produção. Monetizamos tudo isso de forma a la carte”, finaliza.
Resumo
- Em apenas seis meses de operação, plataforma da Courageous Land soma R$ 300 milhões que irão restaurar 5 mil hectares
- Com base digital, startup conecta investidores globais a projetos regenerativos no Brasil, e mira 100 mil hectares em uma década
- Fundada por ex-executivos de Goldman Sachs e Vale, startup quer levar escala ao agro regenerativo com retorno entre 10 e 15 anos