Grande parte das gestoras da Faria Lima tem encurtado a distância entre o campo e o mercado de capitais por meio de novos instrumentos como os Fiagros, que geralmente atuam no mercado de crédito.
Uma casa fundada em 2017, no entanto, olha para o setor por uma abordagem de mais liquidez e tem diversificado suas apostas dentro do agro no universo das empresas de capital aberto.
A Trígono Capital, gestora com mais de R$ 3 bilhões sob gestão em seis fundos de ações, cinco de previdência e três de crédito, tem recheado esses veículos com percentuais de empresas bem conhecidas do segmento.
A firma de investimentos é, por exemplo, a maior acionista da Kepler Weber, com 22,7% do capital da empresa, e mantém investimentos regulares em outras gigantes relacionadas ao agronegócio.
Ao AgFeed, o CIO e fundador da Trígono, Werner Roger, citou que a empresa também é dona de 10% da Tupy, que produz equipamentos para o setor de bens e capitais, incluindo máquinas agrícolas, 2,5% da São Martinho, 2% da Jalles Machado e mais uma posição, ainda pequena, na Boa Safra.
Roger se descreve como um “peixe fora d’água”. Por mais que tenha feito toda sua carreira no mercado financeiro mais tradicional, atuando principalmente no setor de crédito, é engenheiro agrônomo de formação.
“Dada a minha história pessoal e formação acadêmica, a gestora conhece bastante o agro”, diz.
Após se formar na Unesp de Jaboticabal no início dos anos 1980, atuou por mais de sete anos no banco estadunidense Chase, sempre na área de crédito. No início dos anos 1990, entrou no Citi, onde ficou até 2005. Lá, ele atuou no chamado sell side e também com crédito.
Pouco tempo depois, Roger e alguns colegas da área de Asset do Citi se juntaram para criar uma boutique de investimentos, a Victoire Brasil. A ideia era fazer a gestão de investimentos em empresas listadas na bolsa que são consideradas menores e com menos liquidez - as small caps.
“Eu investia desde 1983, então tinha muito conhecimento sobre o mercado de ações”, afirmou. Em 2017, quase dez anos depois de fundar a Victoire, um colega dos tempos de Chase, Frederico Mesnik, o convidou para fundar a Trígono Capital.
A princípio, o foco também estava nas small caps, mas posteriormente a companhia de investimentos também entrou no universo de fundos, de previdência e de crédito e também tomou posição em empresas com mais liquidez.
Hoje a gestora conta com investidores do varejo (40% do capital) e institucionais, como family offices (60%).
Fora da Trígono, Werner também é investidor-anjo da startup FieldPro, que desenvolve tecnologias próprias para previsão de microclima em fazendas, e também tem como sócio Leonardo Maggi Ribeiro, conselheiro e "provocador de inovação" no grupo Amaggi.
As teses de investimento e a descarbonização
Dentro dos investimentos no agro, a casa olha com muita atenção para teses que envolvem a descarbonização do agro. “O governo tem investido em programas do tipo, mas esses temas já são realidade em empresas que nós investimos há tempos. Esse novo momento do agro pode trazer ainda mais benefícios a elas”, acredita Werner Roger.
No caso da São Martinho e da Jalles Machado, por exemplo, o sócio da Trígono vê uma boa perspectiva para o mercado de etanol, que deve ganhar mais protagonismo na agenda ambiental nos próximos anos.
“Essas empresas também estão entrando no mercado do biometano”, ele lembra. A São Martinho anunciou em outubro passado que vai investir R$ 250 milhões para criar sua primeira planta do tipo em Américo Brasiliense, no interior de São Paulo.
A planta deve entrar em funcionamento no segundo semestre do ano que vem e terá a capacidade de produzir cerca de 15 milhões de metros cúbicos de biometano por safra. Na instalação, o biometano será produzido através da biodigestão da vinhaça, um resíduo da fabricação de etanol.
Com um investimento de R$ 30 milhões e parceria com a francesa Albioma, a Jalles Machado também deve produzir biogás e biometano em Goiás.
“Estou confiante em bons resultados para essas empresas. Na próxima safra, vejo um movimento do etanol se recuperando e o biometano entrando na conta, além da geração de CBIOS”, disse Werner Roger.
“O agro está se descarbonizando e aumentando sua eficiência energética. Nós temos uma posição importante em duas empresas relevantes no mercado dos biocombustíveis. Ao mesmo tempo que amplia o retorno aos investidores e a qualidade ambiental do planeta”, acrescentou.
Ainda nesse contexto, ele cita que a MWM, subsidiária da Tupy, outra investida da Trígono, tem aumentado suas apostas em motores movidos a biocombustíveis. Esses motores podem ser utilizados em máquinas agrícolas, aproveitando uma tendência vista no setor.
Nos últimos meses, John Deere, CNH e AGCO, as três maiores empresas do segmento, revelaram ao AgFeed alguns projetos de investimentos para oferecer aos produtores soluções que vão além do diesel no abastecimento.
A Agrishow 2024 serviu para essas empresas colocarem as novidades na vitrine. A norte-americana John Deere apresentou seu motor a etanol de nove litros pela primeira vez no País. O modelo, ainda em etapa de conceito, será testado a partir deste ano em lavouras do interior do País e ainda não tem data para se tornar comercial.
Na concorrente Case IH, marca do grupo CNH, trouxe à feira na feira um motor agrícola movido a etanol. Inicialmente, esses motores serão testados em colhedoras de cana e posteriormente, o plano é fazer testes em tratores.
A AGCO, dona de Valtra, Massey Ferguson e Fendt, anunciou em 2022, o início da fabricação de uma linha de motores agrícolas chamada Core. Os propulsores foram projetados para serem compatíveis com biocombustíveis como etanol, hidrogênio, metanol e biogás.
Na Kepler Weber, líder do mercado nacional de silos, Roger cita uma aposta da empresa em relação às evoluções tecnológicas. Há pouco mais de um ano, a companhia comprou 50% da Procer, empresa com foco específico em tecnologias para a armazenagem de grãos.
Também nas discussões ESG, ele cita que a empresa lançou recentemente um alimentador de cavaco que adapta fornalhas à lenha para operarem com a queima de cavaco junto ao secador de grãos.
O KW Biocav traz uma queima mais efetiva do cavaco, o que torna o processo mais sustentável. Além disso, consegue controlar a temperatura de secagem dos grãos, o que melhora a qualidade final dos produtos.
As participações nessas empresas se dividem em fundos conforme a estratégia de cada um. Enquanto a Kepler Weber, por exemplo, entra num hall de empresas que pagam bons dividendos, a Boa Safra entra numa estratégia de companhias de crescimento.
“São Martinho está terminando um ciclo de investimentos, e deve se tornar uma boa pagadora de proventos. A Jalles já entra numa estratégia de crescimento. A Kepler se encaixa em todas estratégias: paga dividendos e cresce”, exemplifica.
Olhos abertos para novas investidas no agro
Werner Roger afirmou que a Trígono “olha tudo”, mas ressalta que a gestora vendeu há alguns meses uma participação que tinha na BrasilAgro.
Segundo ele, os riscos climáticos somados ao preço dos grãos motivaram o movimento. “Não vimos boas oportunidades nem em SLC, nem em BrasilAgro. 3tentos é outra empresa que olhamos, mas precisamos ficar atento aos efeitos dos preços baixos dos grãos no negócio”, contou.
Com a La Niña surgindo no horizonte, esse cenário pode mudar. Como esse fenômeno acaba impactando as safras do hemisfério norte, o preço dos grãos pode reagir e beneficiar as empresas nacionais, acredita o gestor.
Caso a janela de IPOs reabra e a bolsa receba novos players do agro, Roger também vê a Trígono de olho em novas oportunidades. Em setores próximos ao agro, ele cita que gosta das teses das empresas do Grupo Simpar, como JSL e Vamos.
“Também gostamos do setor florestal, um setor que o Brasil é muito competitivo. Temos algumas ações da Suzano em fundos da casa”, acrescenta.