A percepção imediata do agro brasileiro a respeito da guerra comercial envolvendo os EUA da nova era Donald Trump e a China pode ser positiva. Afinal de contas, com as tarifas recíprocas entre os dois países, o fornecimento de algumas commodities poderia ser escoado para cá, fazendo com que os agricultores, principalmente os produtores de soja, se beneficiem de um comprador asiático com mais demanda.

Porém, nem tudo deverá ser flores. Um relatório divulgado pelo Itaú BBA nesta quarta-feira, 16 de abril, cita alguns pontos de atenção para o agro brasileiro diante do cenário macro global.

O analista Gustavo Troyano, que assina o relatório, diz que o banco está “estruturalmente otimista com o agro brasileiro”, mas que há incertezas sobre como os países do globo reagirão às tarifas americanas, e com isso, como ficará o comércio global.

No caso da China, maior comprador do agro nacional, as tarifas impostas pelos EUA sobre as importações chinesas são de 145%. Do outro lado, a China impôs uma tarifa de 125% sobre as importações dos EUA como resposta retaliatória.

Troyano cita que, a princípio, o Brasil poderia se beneficiar ganhando uma nova fatia das exportações globais. “A China comprou dois milhões de toneladas de soja na última semana, o que pode impulsionar os estoques domésticos à medida que o comércio global avança nas próximas semanas. Embora isso pareça positivo para os produtores brasileiros, antecipamos potenciais preocupações que podem afetar suas margens no futuro”, disse o analista.

Ele acredita que apesar de um aumento no prêmio sobre os preços americanos, uma cotação mais baixa em Chicago pode pesar sobre os preços globais da soja no mundo todo.

Além disso, os custos de produção podem aumentar devido aos fertilizantes importados. Por fim, uma alta nas taxas de juros globais, causada pelo cenário de incertezas, pode afetar a capitalização dos fazendeiros.

Troyano, do Itaú BBA, ainda vê algumas preocupações em relação ao algodão.

“Os EUA respondem por 25% do total das exportações globais e qualquer lacuna deixada pelos americanos poderia ser potencialmente preenchida pelos volumes brasileiros. No entanto, os riscos de uma recessão global podem pesar sobre os preços do algodão em geral devido à sua forte correlação com a atividade econômica”, avaliou.

Nos grãos, o Itaú BBA prefere uma exposição a companhias como SLC Agrícola e 3tentos. O banco prevê, respectivamente, um upside de 19% e 18% nas ações dessas duas empresas na B3 até o final do ano.

No segmento de açúcar e etanol, o momento global pode favorecer o Brasil, mas não garante margens atrativas. Na comparação com outros fornecedores globais de produtos derivados da cana, o Brasil teve uma taxa menor (10%), enquanto Índia e México foram taxados em 26% e 25%, respectivamente.

Porém, o BBA cita que a produção de cana foi revisada para baixo (590 milhões de toneladas), devido ao clima ruim. Além disso, a paridade do etanol com a gasolina caiu para 67%, o que pressiona os preços do biocombustível.

Por fim, a crescente da indústria de etanol de milho no Brasil pode mudar a demanda do setor, o que segundo Troyano, gera dúvidas sobre a sustentabilidade dos preços. Ele acrescenta que ainda existem investimentos para etanol de arroz na Índia.

“De modo geral, produtos substitutos estão mudando a dinâmica do etanol de cana-de-açúcar, reduzindo a capacidade de arbitragem das operadoras e potencialmente aumentando as preocupações com a percepção estrutural dos investidores no segmento de açúcar e etanol”, disse o analista do Itaú BBA.

No setor, o banco prefere apostar nas ações da São Martinho, com projeção de valorização de 53% no papel até o final do ano.