André Guillaumon, CEO da BrasilAgro, não se abala com um período ruim. O balanço da companhia no terceiro trimestre de 2023 – ou no primeiro da safra 2023/2024, como prefere – refletiu, mais uma vez, os apertos vividos pelos produtores brasileiros em um ano de margens reduzidas (e algumas vezes, negativas).
Para ele, porém, chegou “o momento do X”. Ao comentar o resultado divulgado ao mercado no final desta terça-feira, 7 de novembro, apontando um lucro de R$ 29,9 milhões (30% abaixo do obtido no mesmo período no ano passado), ele ressaltou que este pode ser o último do atual ciclo de ajustes vivido pelo setor desde a disparada dos custos dos insumos pós-Guerra da Ucrânia.
“A composição é pior do que o primeiro balanço do ano safra passado”, admite Guillaumon. “Mas eu prefiro ver o copo meio cheio”. Assim, sua visão é de que a próxima safra, já com os custos de plantio estabelecidos em patamares bem inferiores ao ano anterior, permitirá a adoção de uma estratégia de recuperação das margens, comprometidas em praticamente todas as culturas.
O retrato do momento revela vários sinais negativos diante dos números que representam as variações do atual balanço com os do trimestre correspondente no ano passado. A destacar, além do lucro menor: receita líquida (R$ 272 milhões), - 9%, e Ebitda operacional ajustado (R$ 23 milhões), -78%.
A justificá-los, a recorrente combinação de custos altos de produção e preços baixos nas vendas das commodities. Soja, por exemplo, foi produzida a um custo médio de R$ 5,2 mil por hectare, mas vendida a valores que chegaram a R$ 122 por saca, contra R$ 170 obtidos no ano anterior.
Pesou também no resultado o desempenho da cana, cultura que representa cerca de 40% do faturamento da BrasilAgro. Segundo Guillaumon, a empresa é uma das cinco maiores fornecedoras de cana para grupos sucroenergéticos do país, com cerca de 30 mil hectares cultivados com a cultura.
Os canaviais da empresa, localizados no Centro-Oeste e no Maranhão, até tiveram ganho de produtividade, mas os resultados foram penalizados pela queda do preço do etanol, que fez desabar o preço pago pela matperia-prima entregue pela BrasilAgro.
O preço do Consecana, usado como referência, o valor do quilo de ATR saiu de R$ 0,9465 no primeiro trimestre do ano safra passado para R$ 0,8801 no primeiro da safra 2024.
Com isso, as margens de contribuição da cultura, geralmente acima de 30%, caíram para cerca de 15%, de acordo com Gustavo Javier Lopez, CFO da companhia.
Lopez afirma que a política de hedge praticada regularmente pela empresa amenizou o problema com o travamento de cotações em patamares menos desfavoráveis.
Mas no último trimestre, quando a empresa normalmente vende os volumes remanescentes dos estoques da safra que se encerra, a queda grande dos prêmios, não cobertos pelo hedge, acabou impactando de forma mais expressiva o resultado.
“Grande parte dos nossos estoques finais foram comercializados com margem próxima de zero”, afirmou Lopez. “A margem de contribuição da soja ficou em 5%, quando a média histórica é de 30%, e no milho, até negativa para as áreas de menor produtividade”.
Foco nas margens
“Não somos formadores de preços, mas tomadores de custo”, afirma Guillaumon. E se eles trouxeram apertos na safra anterior, sobretudo com altas expressivas nos preços de fertilizantes, agora devem dar um alívio que permite pensar em ganhos maiores, fazendo o tal X com as curvas das commodities.
No copo cheio do CEO da BrasilAgro há otimismo com a soja, por exemplo, com custo já precificado em R$ 4 mil por hectare, 25% abaixo da safra anterior. Com isso, mesmo que as cotações do grão se mantenham nos patamares atuais, será possível, segundo Lopez, recuperar as margens históricas.
O plantio de soja está avançado, já atingindo 38% das áreas previstas pela companhia para a cultura. De acordo com Guillaumon, no Mato Grosso estão bem adiantadas, oferecendo uma janela favorável para a entrada das culturas na segunda safra.
Aí, a busca por margens fica mais evidente. O milho, com menor contribuição, perde espaço, com 9,2 mil hectares (ou 34%) a menos que o inicialmente estimado. Segundo Guillaumon, as áreas previstas para receber o grão foram analisadas “com lupa” e a empresa deve deixar de plantar naquelas em que a produtividade ficou abaixo de 110 sacas por hectare em períodos anteriores.
“Ainda assim, no total, vamos ter aumento de área plantada, na ordem de 11 mil hectares ano contra ano”, afirmou o CEO. Isso significa sair de 168,7 mil hectares em 2022/2023 para 179,7 mil hectares em 2023/2024, ampliando a estratégia de diversificação de culturas para mitigação de riscos.
Soja (+5% sobre a estimativa anterior), algodão (+1%) e feijão (+46%) terão ampliação de cultivo, com escalas e abordagens diferentes. No algodão, por exemplo, os riscos climáticos levam a empresa a tirar o pé nas áreas de sequeiro na Bahia. Em compensação, aumenta a aposta em projetos de irrigação e de produção no Chaco paraguaio.
Guillaumon se mostra entusiasmado com os resultados no país vizinho, onde, segundo diz, a BrasilAgro foi uma das pioneiras no plantio da fibra. Dos 7 mil hectares usados pela companhia na cultura, cerca de 2,5 mil estão no Paraguai.
“Lá o custo de produção é metade do que no Brasil, pois precisamos de menos fertilizante e defensivos”, explicou. “E a produtividade é alta”.
O cultivo do feijão deve ocupar mais de 9 mil hectares. É uma operação relativamente recente para a BrasilAgro, mas que foi incorporada juntamente com aquisições de propriedades feitas pela companhia há alguns anos. “Já temos hoje uma boa expertise nessa área”, afirmou Guillaumon.
E a cana praticamente mantém as áreas já cultivadas, sendo considerada estratégica para o modelo de negócios da empresa. “Sempre foi uma ótima opção quando se fala de combinar o negócio operacional de produção com o negócio imobiliário”, avaliou o CEO.
“É espetacular do ponto de vista de mitigação de risco, já que é uma cultura com certa estabilidade na produção. E ajuda muito no fluxo de caixa, pois oferece entradas praticamente o ano todo, sem a sazonalidade dos grãos. Ninguém quebra por patrimônio, quebra por fluxo de caixa”, completou.
Oportunidades à frente
Guillaumon considera um marco positivo a indicação de aumento de área total de plantio para a nova safra. Sobretudo, conforme ressaltou, depois de um ano “vendedor” no âmbito imobiliário dos negócios da BrasilAgro.
Em 2023, a empresa se desfez de cerca de 9 mil hectares de terras, que ajudaram a compor resultados em trimestres anteriores. E, segundo o executivo, a manter saudável a situação financeira da empresa.
De acordo com Guillaumon, a empresa apresenta endividamento baixo, com grande parte baseado em créditos subsidiados. “Nossa dívida hoje está em 96% do CDI”, afirmou. “A estrutura de caixa é boa, com muitos recebíveis das fazendas negociadas”.
Segundo ele, o volume de recebíveis é superior ao endividamento, o que colocaria a companhia em uma confortável situação de dívida líquida negativa.
“Não poderia ser diferente para uma companhia que quer capturar oportunidades imobiliárias”, disse. “Se tivermos de vender fazenda para pagar dívida, acabaram as oportunidades”.
Guillaumon acredita que elas vão voltar a aparecer nos próximos meses. O CEO da BrasilAgro entende que a liquidez corrente do setor ainda é boa no agronegócio, depois de vários anos de bons resultados. Mas avalia que alguns produtores mais alavancados podem estar sofrendo os primeiros sinais de estresse financeiro em função do elevado custo de capital.
Ele entende que, em termos de múltiplos de sacas de soja – um dos parâmetros para avaliação de propriedades rurais – os preços de terra ainda se mantêm em patamares elevados.
“Mas começamos a ver oportunidades de aquisições mais fáceis”, afirmou. “Sempre nos perguntam se, no mercado imobiliário, estamos vendedores ou compradores. Na safra passada, estávamos mais vendedores, agora já estamos meio a meio”. E prontos para fazer o X e passar a compradores.