Carambeí (PR) - “Quando o Século XXI amanheceu, encontrou a agroindústria dos Campos Gerais em crise de identidade. Os produtores já não estavam mais organizados na Cooperativa Central de Laticínios do Paraná Ltda., mas em uma Sociedade Anônima (...)”.
O trecho, na página 331 do livro “Histórias que contam a história”, mostra o cenário de crise enfrentado pela Frísia na virada do século, quando a cooperativa nem tinha sido batizada por esse nome.
A obra, que reúne 100 crônicas e homenageia o centenário da cooperativa, conta também como a Frísia e suas parceiras naquela região paranaense superaram adversidades e crises, se reinventaram e voltaram a investir na agropecuária e na agroindústria.
A Sociedade Cooperativa Hollandeza de Lacticínios foi fundada em 1925, considerada a primeira do setor. Um tempo depois passou a se chamar Batavo, em homenagem à região da Batávia, na Holanda. Já em 2015, foi rebatizada como Frísia.
Cem anos após ser criada, a expansão e a intercooperação pautam o próximo ciclo de investimentos da cooperativa, a mais antiga do Paraná e com 1,1 mil cooperados.
Em entrevista exclusiva ao AgFeed na sede da cooperativa, em Carambeí (PR), o superintendente da Frísia, Mario Dykstra, revelou os planos de investimentos de R$ 1 bilhão no próximo ciclo entre 2025 e 2030 e os destinos prioritários de parte desse aporte.
De acordo com o executivo, os investimentos serão “pulverizados” nos vários ramos de atuação da Frísia. Os planos passam pela duplicação da produção de sementes, em parceria com a Castrolanda, um investimento no processamento de soja e produção de óleo e a expansão na área e nas parcerias em Tocantins.
Um dos principais players de sementes do Paraná, com 1 milhão de sacas por ano da marca Batavo, a Frísia fará uma operação de intercooperação com a Castrolanda para crescer em 50% essa oferta ainda em 2025 e dobrar o volume, para 2 milhões de sacas em até três anos.
“Inicialmente, a gente pretende ocupar uma capacidade ociosa nas unidades da Castrolanda. Tão logo esteja preenchida, a gente já imagina em fazer investimentos que, provavelmente, vão ser em ampliações nas unidades atuais”, afirmou Dykstra.
De acordo com o superintendente, as unidades de beneficiamento de sementes estão bem localizadas, próximas às regiões de produção dos Campos Gerais, “com aptidão para a produção, altitude de 900 metros até 1.100 metros, e um clima que é excepcional”.
Inicialmente, as cooperativas seguirão com a produção de sementes de soja, trigo e cevada com as marcas Batavo e Castrolanda de forma independente. “Mas a gente vai ter que avaliar se faz sentido manter as duas marcas ou se a gente vai seguir com uma marca só no futuro”, explicou.
Além da produção de sementes, por enquanto as únicas marcas com operações próprias da Frísia são as ligadas à Batavo, nos fertilizantes e rações.
A intercooperação vista com a Castrolanda faz parte da cultura da Frísia, com um braço industrial sustentado em sociedade com outras cooperativas. O principal negócio é a Unium, que nasceu da união da Frísia, Castrolanda e Capal.
A Unium possui três unidades de beneficiamento de leite - em Ponta Grossa (PR), em Castro (PR) e em Itapetininga (SP) - e moinho de trigo. No setor de lácteos, detém as marcas Colônia Holandesa, Naturalle e a Colasso, vendidas no atacado e varejo, mas também é especialista na produção para outras grandes marcas.
“Nós produzimos para muitas empresas e marcas diferentes, como Italac, Piracanjuba, Danone, Nestlé, entre outras”. Segundo Dykstra, o braço de laticínios tem exigido investimentos constantes no recebimento e beneficiamento nas unidades, cenário que será mantido no próximo ciclo de aportes.
No trigo, com as marcas Herança Holandesa e Precisa, 95% da produção é direcionada à panificação e está presente em marcas como Bimbo, Arista, Seven Boys, Wickbold e Bauducco. Os outros 5% da produção são destinados ao varejo, basicamente na região paranaense.
A Unium é sócia também de uma das maiores maltarias do Brasil, a Campos Gerais, localizada em Ponta Grossa, que consumiu R$ 1,6 bilhão em investimento. No empreendimento, as três são sócias das cooperativas Agrária, Bom Jesus e Coopagrícola.
As três cooperativas da Unium também integram o braço de processamento de suínos na Cooperativa Aurora, com 10% de participação.
Esmagadora de soja e expansão no Tocantins
No novo ciclo bilionário de investimentos, a Frísia, revela seu superintendente, estuda industrializar a soja para a produção de óleo e farelo. O óleo seria destinado à produção de biodiesel e o farelo para exportação.
“Nossa a ideia é produzir o óleo bruto, degomado para venda às empresas que produzem biodiesel”, afirmou Dykstra.
A unidade de processamento seria com investimento próprio ou modelo de intercooperação, mas construída no Paraná. O projeto ainda está em estudo de viabilidade técnica.
Em 2024, a Frísia faturou R$ 5,79 bilhões, produzindo 362,2 milhões de litros de leite; 826,8 mil toneladas de grãos; 93 mil toneladas de produção florestal; e 27,9 mil toneladas de carne suína.
Para 2025, a perspectiva é superar os R$ 6 bilhões em receita e manter os resultados aos cooperados entre 4% e 5% desse total.
Além das parcerias, a Frísia tem 12 unidades no Paraná e duas em Tocantins, com armazéns e secadores de grãos nos municípios de Paraíso do Tocantins e Dois Irmãos do Tocantins.
Para o estado da Região Norte, os planos da cooperativa preveem principalmente a ampliação no recebimento de grãos, que demandará novos investimentos nas operações locais.
“Dos 150 produtores que recebemos grãos em Tocantins, 80 deles são fidelizados. Eles somam uma área de 40 mil hectares e, nos próximos cinco anos, a gente quer elevar essa área para 72 mil hectares, já que muitos adquiriram ou arrendaram novas áreas”, explicou Dykstra.
“Temos ainda produtores novos que nós prospectamos e, com esse aumento, precisaremos investir na ampliação da capacidade de recepção e armazenagem”.
Outra aposta da Frísia para Tocantins é fomentar a diversificação por meio de culturas diferentes na safrinha. A cooperativa tem trabalhado com o incentivo ao plantio de gergelim e alguns tipos de feijão, de olho no mercado exportador, além do sorgo para ração.
“A gente quer tentar verticalizar um pouco mais. Como são culturas novas para a cooperativa, nós ainda não temos esse know-how. O que a gente quer é aprender melhor e conhecer melhor esse mercado”, disse o superintendente da Frísia.
“Eventualmente, podemos fazer uma exportação direta de feijão para a Índia, do gergelim para um mercado demandador. Nos próximos cinco anos queremos conhecer melhor essa logística, essa comercialização e como ela se dará com os países compradores”.
Foi aprendendo durante o cultivo que a Frísia entrou e se consolidou no mercado de madeira no Paraná. Há mais de uma década, a cooperativa fomentou produtores a plantar, principalmente eucalipto, nas áreas com pouca aptidão para soja e milho.
A cooperativa buscou linhas de financiamento e o projeto de plantio avançou na região paranaense. Quando estava chegando próximo a ser cortada, surgiu a preocupação de dar um destino à madeira. Afinal, se a cooperativa incentivou o plantio dessas florestas, teria de buscar alternativas para a colheita.
Após vários estudos, a Frísia criou uma área de negócios de madeira, com assistência técnica, consultoria no corte e na comercialização, e até o processamento para os que se interessarem em vender para a cooperativa. A Frísia possui uma serraria que produz cavacos a serem utilizados em unidades de secagem de grãos e beneficiamento de lácteos
Se os planos para os próximos cinco anos estão traçados e as metas anteriores foram praticamente cumpridas, quais seriam os desejos da cúpula da centenária Frísia para os próximos 100 anos?
“Acho que o que a gente mais espera é fazer sentido para o cooperado. Que ele possa perceber valor em participar de um sistema cooperativo, como ele vem percebendo até hoje. A gente tem um desafio de sempre estar avaliando o que é importante para o cooperado e a cooperativa poder contribuir com isso”, disse Dykstra.
“Não vai existir cooperativa se não existir o cooperado junto. Então a gente precisa olhar para ele sempre e ficar se calibrando. Será que o que eu estou entregando para ele ontem faz sentido para hoje e faz sentido para amanhã?”, concluiu.
Para Dykstra, ao contrário das incertezas e da crise de identidade no início do Século XXI mostradas no livro do centenário, o cenário para o amanhecer do século XXII será de previsibilidade de pujança para a Frísia.
Resumo
- A cooperativa Frísia, que está completando 100 anos, planeja investir R$ 1 bilhão entre 2025 e 2030.
- Um dos planos é duplicar a produção de sementes da marca Batavo, chegando a 2 milhões de sacas, em parceria com a Castrolanda.
- A Frísia também estuda atuar no processamento de soja, para produzir óleo e farelo, e está expandindo área e parcerias no estado de Tocantins.