Falar de batata pode parecer simples, especialmente em um país agrícola como o Brasil, onde cadeias como as de soja, milho, café e cana dominam as discussões do agronegócio

Porém, a suposta trivialidade do primeiro “croc” ao abrir um saco de salgadinhos como Ruffles ou Lay's tem por trás uma cadeia produtiva que envolve desafios, alta tecnologia e uma rede de produtores agrícolas que abastecem a PepsiCo.

Segundo explicou ao AgFeed a gerente de agronegócio responsável pela cadeia de sementes da PepsiCo Brasil, Natália de Oliveira, cada batata que chega à indústria de chips percorreu uma caminhada de três anos até a indústria, que envolve rotas internacionais – e um desafio para eliminá-las.

Atualmente, o processo de produção começa no desenvolvimento de novas variedades em áreas de pesquisa da PepsiCo em Wisconsin, nos Estados Unidos. As melhores são enviadas ao Brasil, onde passam por quarentena e são armazenadas no banco de germoplasma da companhia, em Minas Gerais.

Em seguida, são encaminhadas a 25 produtores parceiros, que multiplicam as batatas-semente nos campos. São esses agricultores, parceiros da companhia, que garantem a expansão da produção e no cultivo dos tubérculos que vão, futuramente, alimentar as fábricas da empresa.
Oliveira estima que a PepsiCo Brasil demanda pouco mais de 100 mil toneladas de batatas por ano para abastecer sua produção nacional de chips.

Para garantir essa oferta, na base da cadeia estão justamente as batatas-sementes. Hoje, cerca de 70% dessas sementes são produzidas no Brasil, por meio dos produtores parceiros da companhia. Mas o restante ainda precisa ser importado de países como o Chile e algumas nações europeias.

E essa etapa do processo produtivo hoje tem recebido atenção especial da Pepsico. A meta da empresa é que 100% das batatas-semente utilizadas no Brasil sejam produzidas localmente até 2028.

O objetivo da companhia é reduzir riscos na cadeia de suprimentos e evitar a dependência de importação, que possui barreiras, além de logísticas, regulatórias.

A empresa pretende alcançar essa autossuficiência investindo junto aos produtores para que a multiplicação das batatas-semente aconteça totalmente no Brasil.

O plano é substituir essa importação parcial por produção própria dentro das fazendas e sementeiros locais.

Segundo a ABBA (Associação Brasileira da Batata), existe um cenário preocupante para as batatas-sementes no Brasil. Embora a associação não tenha o número exato de importação desse produto por aqui, ela avalia que o País vive um cenário de dificuldade em importação dessas batatas-sementes.

Há menos de dois anos, em 2023, os produtores brasileiros foram surpreendidos pela notícia de que as tradicionais empresas europeias exportariam apenas 30% do volume usual de batatas-semente para o Brasil, devido à seca intensa nas regiões produtoras como Holanda, principal fornecedora local.

Natália de Oliveira pontua que os produtores têm enfrentado ainda dificuldades para importar materiais do Chile.

“Muitas companhias têm aumentado a produção de produtos à base de batata. Nós não podemos perder o domínio da gestão das sementes, porque senão, lá na frente, não teremos o produto à disposição”, diz.

A executiva da PepsiCo ainda acrescenta que a maior parte das batatas-sementes utilizadas na indústria nacional são produzidas aqui para ter “seguridade no abastecimento, tanto de sementes, quanto na parte industrial”.

A ABBA calcula que a produção anual no Brasil seja em média de 4 milhões de toneladas de batatas. Desse total, cerca de 350 mil toneladas utilizadas como sementes, em torno de 500 mil toneladas são destinadas à produção de chips e palha, cerca de 900 mil toneladas processadas para a produção de pré-fritas congeladas e 2 milhões de toneladas consumidas in natura.

“Também é necessário considerar as importações de mais de 300 mil toneladas de batatas pré-fritas congeladas, o equivalente a 600 mil toneladas de batatas in natura”, acrescenta Natalino Shimoyama, diretor executivo da ABBA, em uma publicação recente da associação.

A produção se dá em sete estados numa área próxima aos 115 mil hectares, considerando todas as produções.

No campo

Marcelo Cazarotto é um dos 25 produtores parceiros da empresa. Há 15 anos que as batatas plantadas em sua fazenda em Casa Branca (SP), cidade próxima de São Carlos e Ribeirão Preto, são fornecidas para a multinacional.

Marcelo ainda é um dos produtores que fazem parte dos menos de 30% que importam a batata-semente. Ao AgFeed, ele contou que utiliza uma variedade chilena, aprovada pela PepsiCo, no cultivo. “Hoje trabalho só com importada, pois acredito que são de melhor qualidade. Futuramente, não muito distante, temos um projeto de fazer a produção do tubérculo na própria fazenda”, diz.

Cazarotto cita que, de dois anos para cá, muitas restrições estão sendo impostas aos produtores, dificultando a liberação das batatas-semente importadas. “Cargas barradas nos trazem um custo pesado”, diz.

Ele explica que hoje importa batatas-semente já prontas do Chile, mas que futuramente quer assumir o controle dessa etapa.

“O projeto aqui é fazer estufa e laboratório para produzir as sementes na própria fazenda. Além do risco de exportação, também ficamos reféns de moedas como o dólar e o euro”, explica.

Marcelo Cazarotto, produtor parceiro da Pepsico

Esse projeto ilustra bem o que a PepsiCo pretende fazer junto aos produtores para garantir que o suprimento de batatas-sementes seja 100% nacional: fomentar os atuais parceiros e buscar novos, para não depender de burocracias na hora da importação.

Dos 3,2 mil hectares de sua propriedade, Cazarotto estima que são 750 hectares dedicados para batata, num plantio que vai de abril a junho, com a colheita espalhada entre julho e outubro, chegando até novembro a depender da safra. Ele também cultiva soja, sorgo, milho, trigo e ainda faz recria de gado.

No último ano, o produtor sofreu com ondas de calor em suas terras, que deixaram a produção de batata um pouco menor. Com a previsão de “dar uma esfriadinha” nos próximos meses, ele projeta uma produção melhor na batata, que segundo ele, depende muito do clima.

Diferente do Mato Grosso e de regiões do Matopiba, as propriedades agrícolas do interior de São Paulo são médias, assim como a de Marcelo Cazarotto. Ele explica que faz muito sentido, por conta disso, plantar algum tipo de hortifruti, por trazer uma rentabilidade acima dos grãos.

“Na soja, mesmo travando em patamares elevados, dependemos muito do mercado. A batata acaba sendo um dos carros-chefe pois, por hectare, rende mais”. Somado isso a um comprador garantido, que é a PepsiCo, o cultivo brilha os olhos do produtor.

Ele estima que o custo por hectare de batata fica próximo aos R$ 60 mil, pois diferente de soja e milho, são culturas que demandam mais funcionários e um manejo mais adequado.

Hoje seu cultivo de batatas utiliza somente um inseticida químico. O restante dos produtos é biológico. Ele acredita que o plantio de cobertura que ele faz na propriedade também ajuda nos resultados.