Incertezas quanto ao clima, preços e câmbio, são a realidade de quem trabalha no agronegócio, praticamente todos os anos.

Na Cooperativa Agroindustrial dos Produtores Rurais do Sudoeste Goiano (Comigo), a quinta maior do País, sediada em Rio Verde (GO), não é diferente.

Mas em 2025, ao contrário de outros players do setor, a cooperativa diz que praticamente não enfrenta um problema que tem sido comum: a dificuldade de acessar crédito.

“A cooperativa está muito bem capitalizada, a gente tem capital de giro, estamos construindo uma nova esmagadora (de soja) para 6 mil toneladas dia, é uma das maiores do País. E isso nós estamos fazendo com recurso próprio, nós vamos financiar 30 ou 40% no máximo”, ressaltou Dourivan Cruvinel, presidente executivo da Comigo, em entrevista exclusiva ao AgFeed, no dia do lançamento da Tecnoshow Comigo 2026.

É fato que produtores de Goiás também estão inseridos no cenário de alta nas recuperações judiciais e margens cada vez mais apertadas, em função das dívidas do passado, dos custos mais altos e dos preços abaixo dos picos vistos anos atrás.

Porém, no caso da cooperativa, a avaliação é que os sucessivos treinamentos de gestão e as ferramentas para proteção contra as oscilações de mercado já vêm ajudando a minimizar o problema.

“A gente trabalha só com cooperado e a gente tem o histórico dele. Então, você sabe para quem você pode dar crédito ou não”, explicou Cruvinel.

Em encontro recente com jornalistas, executivos da Comigo chegaram a dizer que são procurados com frequencia por bancos, com oferta de recursos. Mas afirmam que, estrategicamente, essa disciplina financeira, que prioriza uso de recursos próprios em grandes investimentos, vem sendo mantida.

O diretor presidente disse ao AgFeed estar otimista para que a Comigo alcance este ano um faturamento superior a R$ 14 bilhões, podendo chegar a R$ 15 bilhões.

Se confirmado, o resultado vai representar um ano de retomada no crescimento financeiro para a cooperativa, que teve ingressos de R$ 11,2 bilhões em 2024, abaixo de 2023, quando estava em R$ 13 bilhões.

O aumento na receita é explicado principalmente pela maior originação de grãos, que normalmente acompanha uma colheita mais farta dos mais de 12 mil cooperados da Comigo.

A cooperativa espera fechar o ano com o recebimento de 63 milhões de sacas de soja, 18% a mais que 2024. No milho são 24 milhões de sacas, uma alta de 21%.

“A gente atua em várias áreas, na aquisição de grão, na produção de ração, misturadora de adubo, as lojas veterinárias, então cada parcela dessa contribui um pouco. A perspectiva é de receber mais produto ainda do que o ano passado. E isso ajuda no faturamento”, disse Cruvinel.

No caminho do biodiesel

O investimento na nova esmagadora de soja inicialmente estimado em R$ 1,3 bilhão, agora é calculado em R$ 1,5 bilhão. Segundo o presidente executivo, a diferença se explica em parte pela decisão de adquirir terras para expandir mais a área cultivada com eucalipto.

Isso porque a nova fábrica vai demandar mais biomassa nas caldeiras, já que a atual capacidade de esmagamento da Comigo vai subir de 5,5 mil toneladas para 11,5 mil toneladas, diariamente.

“Nós temos hoje 10 mil hectares já consolidados, já plantados (de reflorestamento). E a gente vai precisar de mais uns 5 mil. Nós já adquirimos uma área de 3 mil e poucos hectares e falta o restante”, contou o executivo.

Atualmente, são duas esmagadoras na Comigo, uma delas construída na década de 1980, considerada a primeira indústria do tipo na região Centro-Oeste.

A cooperativa destina 70% da soja que recebe para a exportação e 30% são usados na indústria, para transformar em óleo e farelo.

Uma parte é o óleo bruto que vem sendo vendido a usinas de biodiesel. Outra parte é o refinado, de cozinha, com a marca Comigo, vendido ao consumidor. Já o farelo de soja é um insumo importante para a fábrica de ração da cooperativa.

A nova indústria está sendo construída no município de Palmeira de Goiás, a 177 km de Rio Verde. A previsão é de que os primeiros testes operacionais da planta sejam iniciados no final de 2026 e o funcionamento total ocorra em 2027.

Com o acréscimo de mais 6 mil toneladas/dia de esmagamento, dobrando a capacidade para gerar óleo e farelo, a Comigo percebeu que poderia ela mesma passar a produzir o biodiesel.

O AgFeed apurou que a construção da nova usina já é uma decisão tomada, mas ainda deve levar algum tempo para sair do papel – falta definir o timing exato que isso vai ocorrer. O local também já foi escolhido. Curiosamente, não é em Palmeira de Goiás, junto da nova esmagadora. Será junto à unidade principal da Comigo, em Rio Verde mesmo.

Segundo os executivos da cooperativa, a nova esmagadora está na outra região em função da logística de exportação. A conclusão dos trilhos da ferrovia Norte-Sul passando por Goiás tem sido uma revolução para os produtores do estado, prometendo mais competitividade.

Para o biodiesel faria mais sentido, economicamente, ter a usina próxima das esmagadoras de Rio Verde, que já operam há anos.

Tudo indica que os esforços para o biocombustível só serão aplicados na hora que for iniciada a primeira operação da esmagadora nova.

“Nós vamos terminar o projeto lá e depois vamos trabalhar no biodiesel. Mas aí nós vamos construir ele aqui”, confirmou Cruvinel, na conversa com o AgFeed.

O dirigente evitou dar mais detalhes sobre o plano, como capacidade da indústria e investimento previsto, alegando que o projeto ainda não está pronto.

Ele descartou investimentos em etanol de milho, justificando que o anúncio recente da Inpasa para a construção de uma planta em Rio Verde já absorverá boa parte da demanda na região.

Em 2007, época que houve um “boom” de investimentos em biodiesel no Brasil, em função de incentivos do governo federal na época, a Comigo chegou a divulgar o plano para construir uma usina com capacidade para produzir 100 milhões de litros por ano, mas o projeto nunca saiu do papel.

Antônio Chavaglia, atualmente com 79 anos e que presidiu a cooperativa por quase 5 décadas, acredita que a usina será construída somente daqui a 3 anos. “Porque temos que rodar a planta (esmagadora de soja), é muito investimento para fazer de uma vez”, disse ele, que hoje é presidente do Conselho de Administração da Comigo.

Outro motivo para não haver pressa em relação ao tema é que a cooperativa vem destinando parte dos seus investimentos para abrir “uma loja por ano” e novos armazéns para suprir o déficit conhecido nos grãos.

Em 2025, por exemplo, estão sendo abertos três novos armazéns, um em Palmeira de Goiás, uma ampliação em Acreúna e outro na região de Santa Helena. Com isso, a capacidade de armazenagem total da cooperativa será ampliada de 43 milhões de sacas para 48 milhões.

Resumo

  • Cooperativa Comigo, capitalizada e seletiva no crédito, projeta faturamento recorde acima de R$ 14 bilhões em 2025
  • Nova esmagadora de soja de R$ 1,5 bilhão, em fase de construção em Palmeira de Goiás, dobrará a capacidade industrial
  • Após o início da operação da esmagadora, previsto para 2027, cooperativa deve investir em planta para produção de biodiesel