Fortaleza (CE) - O executivo que lidera uma das principais empresas do agro listadas na B3 passou os últimos três dias assistindo atentamente aos painéis do Congresso Brasileiro do Algodão (CBA), que reuniu cerca de 3,5 mil pessoas esta semana, em Fortaleza, no Ceará.
Aurélio Pavinato, CEO da SLC Agrícola, também faz parte do conselho da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), que promove o evento. No intervalo entre os debates, conversou com o AgFeed, sobre alguns dos temas que foram destaque no evento.
Um dos alertas é possibilidade de o algodão seguir com preços mais baixos por mais um período, em função de um cenário em que oferta supera a demanda e o ritmo lento para que haja uma retomada na economia global.
Especialistas internacionais mostraram que o uso de outras matérias-primas como poliéster, segue crescendo acima do algodão. Ao mesmo tempo, novas gerações buscam roupas com menor impacto ao meio ambiente, o que tem multiplicado investimentos na reciclagem de tecidos.
“A pauta do congresso foi montada pensando no longo prazo. Esse cenário da necessidade de reciclar tudo e revender o que é possível é muito positivo na questão da sustentabilidade, mas ao mesmo tempo limita um pouco a demanda. Conhecer esse cenário é importante para definir estratégias”, avaliou Pavinato.
No primeiro dia do evento, o CEO da SLC participou de um painel em que o ex-ministro Blairo Maggi afirmou que o grupo Amaggi vai reduzir a área plantada de algodão, recomendando paciência aos produtores em meio ao cenário mais negativo para os preços.
Questionado pelo AgFeed se a SLC poderá adotar a mesma estratégia, Pavinato respondeu: “No ano passado a gente plantou mais algodão. A lógica é perpetuar, porque essa expansão do algodão aconteceu basicamente em substituição ao milho, então é a segunda safra, não é na soja. Então, dentro da competição milho e algodão, acaba o algodão sendo melhor do que o milho. Como cenário estratégico, isso não mudou”.
O executivo não revela qual a intenção de plantio exata de cada cultura porque a empresa divulgará suas previsões detalhadas ao mercado em outubro. Mas é fato que reduzir a área plantada, como sugeriu Blairo Maggi, não está no radar da SLC. O cenário mais provável seria manter a mesma área de cultivo com a pluma.
Pavinato diz que o fato de ter ouvido previsões preocupantes para o curto prazo não muda sua estratégia.
“A gente trabalha com estratégia de longo prazo. Às vezes o cenário é esse nesse momento, mas daqui a oito meses muda muito. Sempre tem os eventos climáticos que provocam mudanças de cenário, eles provocam mudanças de oferta”, lembrou.
O executivo afirma que o histórico da SLC mostra que a empresa não tem realizado grandes mudanças de portfólio, como variação de culturas. “Procuramos manter uma estratégia buscando maximizar a eficiência e a margem de contribuição em cada fazenda. Pensamos a empresa como um todo, mas tem que pensar cada região, o que que se adequa melhor em termos de culturas e por isso que a gente tem mantido essa estratégia de portfólio”.
De qualquer forma, Pavinato afirmou que “o Brasil, como País, não deveria plantar mais algodão”, sinalizando que isso “aumentaria ainda mais a oferta”, o que pressiona para baixo os preços.
Outro destaque do CBA foi a visão de especialistas sobre a competitividade da pluma brasileira mundialmente. O Brasil ultrapassou recentemente os Estados Unidos na liderança das exportações mundiais de algodão.
Os analistas internacionais seguem apostando no avanço do produto brasileiro em função do trabalho que vem sendo feito em tecnologia, ganho de produtividade, além da rastreabilidade, que já conta com marcas parceiras como a Renner, que também participou de um dos painéis.
“Nós (brasileiros), junto com os demais países, precisamos achar formas de divulgar o nosso produto algodão e fortalecer o consumo mundial porque, obviamente, aumentando o consumo vai fornecer aquele que é mais competitivo e aí o Brasil está com essa vantagem competitiva”, afirmou Pavinato, avaliando um dos pontos debatidos no evento.
Safra 2024/2025
Na visão do CEO da SLC, um aspecto mais positivo para a safra que a empresa começará a plantar no fim do mês “poderá ser o clima”.
O vazio sanitário acaba nos próximos dias em algumas regiões, mas Pavinato informou que a companhia só plantará soja após o dia 20, já que o cultivo muito cedo pode reduzir a produção.
“O clima desse último ano foi mediano. Ele foi ruim no Mato Grosso, foi bom na Bahia e foi razoável (para a safra de grãos) no Sul. O que poderá ser melhor no próximo ano é ter um clima bom em todos os locais”, disse Pavinato.
Ele lembrou que os custos estão menores, mas os preços também são mais baixos, por isso espera “margens talvez similares”. Se o clima ajudar, a produtividade nas fazendas da SLC aumentaria, o que aí sim traria melhores resultados de uma safra para outra.
“Com o La Niña, no geral, chove mais no Centro-Norte e menos no Sul. Então como nós estamos no Centro-Norte, o La Niña é favorável”, explicou.
Pavinato disse que o cenário para a soja “está melhorando”. Já em relação ao milho, ainda vê margens muito apertadas, à medida que o preço está baixo e o custo ainda muito elevado.
Em relação ao início da legislação europeia antidesmatamento, em janeiro de 2025, o CEO da SLC disse que a empresa está preparada, já que a última vez que o grupo plantou em área onde houve desmatamento foi em 2020. “Desde 2021 nós decidimos não desmatar mais, por isso estamos alinhados com a União Europeia”.
Ele admite que desafios logísticos – na rastreabilidade e segregação – ainda existem, mas ficam sob a responsabilidade das tradings que compram os grãos da SLC.
O AgFeed mostrou recentemente que, enquanto algumas empresas se preparam para estas regras ambientais cada vez mais rígidas, produtores de soja vêm se mobilizando contra um programa que já existe há bastante tempo, a chamada “moratória da soja”. Estados começaram a aprovar leis para restringir incentivos fiscais a tradings de soja.
Sobre este tema, Pavinato afirmou: “Esse movimento antimoratória da soja é uma volta para o passado, não tem lógica nenhuma. São interpretações pensando no seu mundinho e não pensando no todo. Querer voltar a expandir soja no bioma amazônico é um retrocesso”.
Para a SLC, afirmou, não é uma preocupação, porque a empresa não planta mais em áreas desmatadas e não atua no mercado de trading.
Mais biológicos
O CEO da SLC disse que a empresa pretende usar insumos biológicos “cada vez mais”. O AgFeed mostrou recentemente que a Fazenda Pamplona, em Cristalina-GO, que está batendo recorde de produtividade de algodão, já substituiu 20% dos químicos por biológicos.
A dúvida no mercado é se a companhia seguirá investindo em biofábricas instaladas nas próprias fazendas, no sistema on farm, ou se mudará o foco para a compra de produtos industrializados.
“Vamos usar o que for mais econômico. Se é a biofábrica a mais econômica, vamos fazer na biofábrica. Se for o produto pronto, vamos comprar pronto. Para nós, as duas vão coexistir”, disse Pavinato.
Na Fazenda Pamplona, a próxima safra não terá aumento de produção na biofábrica. O que houver de consumo adicional, será comprado das indústrias. O executivo confirmou que a tendência é a mesma para as demais fazendas, “não ampliar produção nas biofábricas, mas também não reduzir”.
“Hoje tem produtos que são mais baratos comprar do que fabricar em casa. E tem todo um processo da fabricação em casa também ser mais industrializada ou mais modernizada. É um processo de maturação que está acontecendo. Então, independente se fabrica na indústria ou fabrica na fazenda, tem que ser um processo controlado”, explicou.
Ele reforçou que a produção na fazenda não pode ser “artesanal” e sim uma mini indústria. Mesmo assim aposta que as duas formas seguirão coexistindo. “O artesanal, acho que a tendência é ele não sobreviver”.
A SLC tem um contrato com a Solubio, controlada pelo Aqua Capital, para produção em boa parte de suas biofábricas. O acordo vence este ano, mas Pavinato disse ao AgFeed que a parceria “vai continuar”.