O ano de 2024 vem sendo marcado pelos “lay offs” ou paradas programadas nas grandes fabricantes de máquinas agrícolas em função da demanda em queda, com agricultores menos capitalizados e rara disposição para fazer investimentos.

Uma empresa do setor, no entanto, garante que “não parou nenhum dia” e segue montando seus tratores em ritmo semelhante ao ano passado. É a sul-coreana LS Tractor, controlada pela LS MTron, marca que está presente no Brasil com uma fábrica em Santa Catarina desde 2011.

O AgFeed conversou com o vice-presidente da LS Mtron, André Rorato, sobre os segredos para lidar com o momento de crise que vive o setor.

“A gente é líder de mercado, em Minas Gerais, por causa do café. Em segundo lugar está São Paulo, com a citricultura. E hoje, os dois mercados estão puxando muito, porque os preços estão muito bons”, ressaltou o executivo.

A LS calcula que 35% de seu faturamento – valor que não revela – já estaria atrelado à demanda dos produtores de café.

Além das vendas via concessionárias, nas áreas produtoras, a empresa possui uma parceria comercial com a Cooxupé, considerada a maior cooperativa de café do mundo.

“(A Cooxupé) é a única que a LS fatura direto, fora da rede de concessionários. Posso afirmar que quase 90% dos grandes produtores de café são nossos clientes”, conta.

Rorato lembra que até mesmo o café conilon vem explodindo de preço e que a quantidade de café necessária para comprar um trator ficou favorável ao produtor.

Em paralelo, segundo ele, as vendas seguem em alta para grandes clientes do setor da laranja que, por causa do greening (e com altos preços), passaram a investir em outros estados, inclusive em Minas Gerais.

Setor florestal é o novo “nicho”

O VP da LS Tractor diz que um dos segredos para crescer nos “mercados de nicho” é a flexibilidade que possui para customizar os tratores de acordo com a necessidade de cada cultura. A tendência é de que grandes fabricantes sejam mais engessados para fazer mudanças em seus equipamentos.

Isso ocorreu primeiro no café. Segundo ele, o trator da LS não é o mais barato para o cafeicultor, mas é o único “especificado”. “Se os concorrentes grandes quiserem fazer o mesmo, o custo para eles dispara”.

Outro segmento está ganhando destaque nos negócios da empresa: a silvicultura. A LS pegou carona nos grandes projetos de expansão de companhias como Suzano, Klabin e CMPC, que aumentam áreas de plantio de eucalipto, com a demanda mundial aquecida por papel e celulose.

Neste caso, um dos segredos também foi a customização. Máquinas gigantes predominam na parte da colheita no setor florestal, ele lembra. “Mas o plantio é todo feito com tratores pequenos. O que mais roda na silvicultura é um (trator) 105cv ou 110cv”.

O visual do trator da LS adaptado ao setor de florestas é realmente diferente por contar com várias grades e proteções, pneus e para-brisa especiais, pois circulam em solos e ambientes mais propensos ao choque com pedaços de madeira, por exemplo.

É uma linha diferenciada também pelo modelo de negócio. As empresas florestais não compram diretamente os tratores. Apenas homologam determinados modelos com o fabricante, que então vende as unidades para empresas terceirizadas.

“Depois de homologado pela empresa mãe, tem frotista que já comprou 120 tratores”, conta. “E segue crescendo”.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, Rorato lembra que a chilena CMPC tem 500 mil hectares de eucalipto plantados e já anunciou um plano de expansão de R$ 24 bilhões.

“Então a gente sempre trata de pegar o nicho de mercado e agarrar”, diz o gaúcho de Santa Maria.

Market share sobe, mas vendas ainda caem

A LS atua especialmente no segmento de pequenos e médios tratores, entre 25cv e 150 cv de potência. Segundo Rorato, essa faixa representa 85% do mercado de tratores no Brasil.

A marca é conhecida da agricultura familiar, que no Sul do Brasil também inclui a produção de grãos, mas agora avança nestes outros segmentos, o que está ajudando nos resultados em meio ao preço mais baixo de produtos como soja e milho.

No Centro-Oeste, por exemplo, mais afetado pela combinação de preço baixo e problema climático, predominam tratores de alta potência. “Mas o nosso chão são os tratores pequenos e médios que, graças a Deus, estão indo bem”.

A empresa vendeu 3,5 mil tratores em 2023, volume parecido com o registrado no ano anterior. Agora, em 2024, a LS prevê que o número fique próximo de 3 mil unidades, o que representaria uma queda de 14%. O resultado é considerado positivo porque o mercado como um todo, segundo Rorato, teria recuado mais de 20%.

Os dados mais recentes da Abimaq indicam que de janeiro a julho deste ano as vendas de máquinas agrícolas tiveram queda de 27,5%.

“O nosso 2024 não vai ser do tamanho de 2023. Mas, em relação ao mercado, todo mundo caiu, só que a gente caiu muito menos do que o mercado. Estamos crescendo em market share”, afirmou.

Na faixa de tratores em que atua, a LS calcula que subiu de 9,5% de market share no ano passado para 12% este ano. A empresa admite, porém, que vem sofrendo forte concorrência das grandes fabricantes mundiais. “O mercado deles de alta potência sumiu e estão vindo brigar no pequeno”.

De qualquer forma, a coreana diz que o modelo de pós-venda e produtos customizados está garantindo a fidelidade do cliente. Na parceria com cooperativas, por exemplo, mesmo que o trator seja adquirido via barter, a parte da assistência técnica é feita pela concessionária local.

A perspectiva é seguir recuperando as vendas principalmente pela expansão do setor florestal, que vem reduzindo o tempo de maturação das árvores para o corte e chegando a outras regiões.

O VP da LS diz que o plantio de eucalipto também cresce no Uruguai, por exemplo. “Esperamos aumentar as exportações, inclusive para a Argentina”.

A empresa também participa com frequência de licitações públicas. São vendas “não previstas”, como uma que acaba de ser fechada para o governo do Rio Grande do Norte, em que foram comercializados 200 tratores.

É por isso que André Rorato segue reforçando que “a fábrica nunca para”, podendo até subir o estoque, mas sem lay offs. Ele diz que é algo natural dos coreanos, seguir produzindo. A unidade de Garuva, em Santa Catarina, tem 180 funcionários atualmente.

“O pessoal técnico de campo está aumentando, em vendas e engenharia”, diz. Há um movimento, segundo o executivo, de usar mais engenheiros no Brasil neste processo de adaptação dos produtos, enquanto a parte mais pesada segue sendo feita na Coreia.

Em paralelo, a LS diz estar mantendo investimentos em marketing, algo também diferente de seus concorrentes, na sua visão. Na Agrishow contratou o cantor Leonardo como garoto propaganda.

“Ele é muito amigo, fizemos uma parceria com ele, comprou diversos tratores também e tem nos ajudado a vender até pra diversas duplas sertanejas”, contou Rorato.

O último investimento recebido da Coreia foi em 2022, de US$ 50 milhões. “Mas temos feito um reinvestimento com recursos locais, principalmente em plataformas digitais”, disse o executivo, sinalizando que poderá solicitar mais recursos ao acionista se houver necessidade de expandir.

“Acho que 2025 já será melhor que 2024. Se chover mais pra cima (com o La Niña esperado para o centro-norte do País), isso nos beneficia”.

A incerteza para empresa deve ficar mais concentrada no mercado gaúcho, que ainda responde por cerca de 12% das vendas. Depois de várias secas e uma enchente, os produtores do estado ainda lidam com alto endividamento e perspectiva de que o La Niña possa trazer estiagem, mais uma vez.

Na Expointer deste ano, onde André Rorato conversou com o AgFeed, a intenção foi manter o tamanho de estande e a mesma oferta aos produtores como uma sinalização de “seguir dando apoio ao cliente”. As vendas na feira, porém, ficaram 15% abaixo do ano passado, segundo a LS.

Cabotagem é diferencial logístico

A fábrica em Santa Catarina, que fica a 30km de Joinville, foi instalada em função da proximidade com os portos e uma logística favorável para distribuir os tratores nas regiões que mais consomem os tratores da LS.

“Estamos numa posição geográfica que num raio de 60 quilômetros nós temos 5 portos. E usamos muito o componente importado, de origem coreana, somos uma montadora”, explica André Rorato.

Essa facilidade, que primeiro ajudou na chegada dos componentes, agora está sendo um diferencial também para vender tratores para as regiões mais distantes do Brasil

“Somos únicos no negócio de tratores a usar cabotagem para mandar ao cliente. Todos os tratores que eu mando pro Norte e Nordeste, mando via navio”, ressaltou.

Segundo a LS, o custo fica 50% mais baixo se comparado ao terrestre, em função das longas distâncias.

A cada mês estão sendo embarcados pelo menos 10 contêineres que levam 3 tratores cada um (alguns itens são desmontados), pelo porto de Itapoá.

Rorato lembra que Itapoá é 100% privado e vem se destacando com um porto muito ágil e com melhor custo benefício.

“Itapoá e São Francisco, esses dois portos, logo vão ultrapassar Itajaí e Navegantes. Basta ver a quantidade de empresas que estão indo para o lado de Joinville. Depois que a LS foi pra lá, entrou BMW, entrou GM, entrou ampliação da Tupy”, lembrou.

Mais vendas para locadoras

Outro diferencial da LS no mercado de tratores tem sido a venda crescente de unidades para empresas como Localiza, Unidas e Vamos, conforme o AgFeed mostrou em reportagem no ano passado.

A demanda do setor florestal está relacionada a este fenômeno. Segundo Rorato, o contratista que presta serviço para empresas como a Suzano, tem recorrido às locadoras.

“Colocamos nossa força de vendas a buscar cliente para as locadoras. Fizemos essa parceria. E é um negócio super rentável pra eles”, disse.

O VP da LS diz que alto retorno tem levado, inclusive, concessionários da marca a iniciar o serviço de locação, regionalmente. A revenda compra da fábrica e depois aluga para seus clientes.

Segundo ele, quem presta o serviço no campo tem percebido que consegue executar com a mesma qualidade e gasta 30% menos. “O nosso trator é o mais econômico do mercado em combustível e manutenção”.

Neste cenário, de acordo com a LS, as vendas de tratores para locadoras estão crescendo em média 20% ao ano. Atualmente, já representam 15% dos negócios.