O mercado do biodiesel no Rio Grande do Sul, maior produtor do biocombustível no país, deve ganhar mais um player importante nos próximos anos.
Três cooperativas gaúchas - Cotrijal, Cotripal e Cotrisal - vão produzir o biocombustível em um complexo industrial que vai se chamar Soli3 e será instalado em uma área de cerca de 138 hectares em Cruz Alta, na região Noroeste do Rio Grande do Sul.
O investimento total previsto pelas cooperativas é de R$ 1,25 bilhão e a indústria deve ser construído em 24 meses, com início de operações previsto para o fim de 2027, segundo informou o presidente da Cotrijal, Nei César Manica, em entrevista à Rádio Gaúcha, de Porto Alegre.
A construção da planta já havia sido antecipada com exclusividade pelo AgFeed em setembro do ano passado. Na época, as cooperativas projetavam que a unidade iria custar entre R$ 700 milhões e R$ 900 milhões e que seria uma indústria que iria produzir óleo de soja.
Agora, além do óleo, as cooperativas decidiram que a planta também vai produzir biodiesel, aproveitando a originação de soja vinda dos associados das cooperativas. “Temos matéria-prima, isso que é o mais importante. Daria para fazer duas indústrias do tamanho que nós estamos fazendo hoje", disse Manica à Rádio Gaúcha.
A ideia é que a planta faça o processamento de 3 mil toneladas por dia, totalizando o beneficiamento de 1 milhão de toneladas de soja por ano, com a produção de 192 mil toneladas de biodiesel, 728,8 mil toneladas de farelo de soja, 19,8 mil toneladas de glicerina e 59,4 mil toneladas de casca de soja, segundo informações do jornal Zero Hora. O faturamento com a nova planta deve chegar a R$ 2,2 bilhões, segundo as estimativas do projeto.
A nova planta vai utilizar apenas soja como matéria-prima, deixando outras culturas locais como milho e trigo de lado. Manica explica que a oferta de milho hoje no Rio Grande do Sul é muito pequena frente à demanda que a indústria exige. "Teria que se plantar 33% da área disponível para cultivo de verão em cima de uma rotação de milho. Mas infelizmente hoje não chega a 5% no Rio Grande do Sul."
O presidente da Cotrijal, todavia, não descarta a possibilidade de processar o milho e trigo no futuro. "O projeto vai dar a oportunidade de nós iniciarmos com uma indústria de um produto, que é a soja, e depois já pensar em diversificar a industrialização de outros produtos de commodities também", disse.
Em 2022, a cooperativa chegou a anunciar um projeto para a produção de etanol a partir de trigo e outras culturas de inverno, que custaria R$ 300 milhões e previa produção de 70 milhões de litros de etanol por ano, mas voltou atrás após constatar dificuldades na obtenção de matéria-prima.
O projeto da indústria de soja prevê a pasagem de uma linha férrea dentro da indústria, para levar o óleo e o farelo de soja em vagões para o Porto de Rio Grande, cidade distante 500 quilômetros de Cruz Alta.
A ideia, segundo Manica, é também utilizar o modal para transportar soja in natura das cooperativas, que hoje enviam de caminhão os volumes a serem exportados a partir do porto de Rio Grande.
"Poderá ser descarregado no nosso porto de transbordo em Cruz Alta e dali nós prestarmos serviços para levar até Rio Grande, tornando mais barato", afirmou. Caso a rede ferroviária não dê conta de transportar toda a produção, Manica prevê também o transporte rodoviário, via caminhões.
Investimentos na infraestrutura logística do Rio Grande do Sul são necessários para escoar a produção de Cruz Alta, na avaliação do presidente da Cotrijal. "A malha do Rio Grande do Sul está muito decadente", afirmou.
Além da via rodoviária, também há um canal de ferrovia que liga Cruz Alta e Rio Grande e é operado pela Rumo. A companhia têm a concessão de toda a Malha Sul, com uma extensão de cerca de 7.223 quilômetros que ligam Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul. A concessão vai até 2027.
No começo de maio, a Rumo entegou uma proposta ao Ministério dos Transportes para uma reformulação da Malha Sul, incluindo a entrega de vários trechos de ferrovias no Rio Grande do Sul. A companhia quer se desfazer dos canais porque boa parte ficou inutilizado após a enchente de maio do ano passado, que afetou 759 quilômetros de ferrovias de um total de 1.680 quilômetros operacionais.
A ideia da Rumo seria ficar apenas com a ferrovia entre Cruz Alta e o porto de Rio Grande. "A Rumo provavelmente terá que fazer algum investimento. Nós já conversamos com a Rumo para ter facilidade de escoamento, porque vai ser volume muito grande de produção de farelo, de óleo e até de soja", disse Manica à Rádio Gaúcha.
O presidente da Cotrijal defende ainda que, se a Rumo não quiser investir, a solução seria outra empresa assumir a concessão. "Me parece que não faz sentido continuar batendo na tecla da Rumo, que não faz o seu papel."
A questão logística é relevante porque, além do biodiesel, a indústria também vai produzir farelo de soja que pode ser enviado ao exterior. "Em média, 60% do farelo produzido é para exportação e 40% é para o mercado interno", estimou Manica. "E o biodiesel também é um produto que tem um mercado interno bastante forte e também tem possibilidade de exportação."
Um dos maiores produtores de soja do Brasil, o Rio Grande do Sul tem se destacado nos últimos anos no mercado do biodiesel. O estado é hoje o maior produtor do biocombustível no país, com uma produção de 1,698 milhões de litros, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, e concentra nove usinas de produção do biocombustível, a maior parte delas situada no Norte gaúcho.
Resumo
- Cotrijal, Cotripal e Cotrisal vão investir juntas R$ 1,25 bilhão na construção da Soli3, em Cruz Alta (RS), que deve entrar em operação até o fim de 2027
- Nova indústria terá capacidade para processar 1 milhão de toneladas de soja por ano e produzir até 192 mil toneladas de biodiesel
- Projeto prevê instalação de ferrovia para escoamento da produção até o porto de Rio Grande, mas enfrenta incertezas com a operadora Rumo, que pretende devolver trechos da Malha Sul