O cerealista Adelírio Danieli provavelmente não imaginava que o pequeno negócio de abate de frango iniciado no porão de casa se transformaria, três décadas e meia depois, em um grupo empresarial com diversas frentes de atuação e capacidade para realizar investimentos milionários e passar por um importante processo de transformação.

No ano em que completa 35 anos de história, o Grupo Danieli, de Tapejara, no Noroeste gaúcho, está investindo R$ 300 milhões para concluir a construção de uma esmagadora de soja, com inauguração prevista até o fim do ano, e para ampliar sua produção de fertilizantes.

O momento também é de transformação para a empresa. No começo do ano, o grupo se desfez do último frigorífico que ainda possuía, que passou a ser operado pela cooperativa de laticínios Santa Clara, de Carlos Barbosa (RS). Outras duas estruturas haviam sido vendidas há quatro anos para a Cooperativa Aurora, de Santa Catarina.

"O foco daqui em diante vai ser nos grãos e nos fertilizantes", resume Rafael Danieli, filho do fundador Adelírio e diretor administrativo e financeiro do grupo em entrevista ao AgFeed.

Os Danieli possuem negócios diversos. No setor de grãos, são donos da Agrodanieli, com cinco unidades de recebimento de grãos e uma esmagadora de soja. A empresa também é dona de 119 aviários, uma rede de supermercados e atacarejo, postos de combustíveis e possui negócios na área de construção civil.

A base do negócio de Adelírio Danieli foram os grãos, ainda nos anos 1980, quando o fundador da empresa já atuava na área cerealista, no interior de Tapejara. Depois veio o negócio de frangos, no qual a família se concentrou na segunda metade da década de 1990.

Para atender às necessidades da operação avícola da empresa, veio o processamento: o grupo inaugurou em 2008 uma esmagadora de soja por extrusão, com capacidade de processar 600 toneladas por dia. "Farelo de soja é o segundo item mais consumido na ração dos animais depois do milho. Portanto, metade do que a gente esmagava ia pra nossa própria integração", afirma Danieli.

Agora, a estrutura já existente será substituída por uma nova, a ser inaugurada até o fim de 2025, que vem sendo construída desde meados de 2023 em um terreno de 185 mil metros quadrados e terá uma capacidade de processamento de 1,6 mil toneladas por dia, quase três vezes superior à esmagadora mais antiga, que vai deixar de operar e será adquirida por uma empresa de Minas Gerais.

O projeto, que custou R$ 250 milhões à companhia, inclui também uma linha de armazenagem com capacidade para 2 milhões de sacas de grãos. “A primeira parte da armazenagem já está pronta e tem capacidade de 1,2 milhão de sacas de soja. A outra parte vai se estender ainda ao longo de 2026, pelo menos pelo primeiro semestre”, afirma Danieli.

A ideia é vender os processados de soja no mercado gaúcho e também fornecer óleo para a produção regional de biodiesel, segundo Danieli, aproveitando o fato de que a indústria está em uma região-pólo de fabricantes do biocombustível no Rio Grande do Sul, reunindo empresas como Be8, Olfar, Oleoplan, Biofuga e Bocchi Agrobios. "São cinco usinas num raio de 200 quilômetros. Fazemos negócios com todas elas", diz Danieli.

A família chegou a elaborar um plano de investimentos para incluir no projeto da esmagadora uma usina de produção de etanol a partir de trigo, milho e cereais de inverno, mas acabou não levando a ideia adiante por dois motivos, segundo Danieli.

"O primeiro deles foi de foco, queríamos concentrar nossos esforços no esmagamento", afirma. "E o segundo foi pela viabilidade financeira. Entendemos que é um bom negócio, por termos áreas ociosas no Rio Grande do Sul a serem ocupadas pelos cereais de inverno, mas para nós ainda não é um negócio que para de pé", acrescenta.

Vários projetos de usinas produtoras de etanol de trigo têm avançado pelo Rio Grande do Sul, com duas empresas mais à frente em seus planos: a CB Bioenergia, que está prestes a inaugurar sua planta em Santiago, e a Be8, que começou a construir sua fábrica em Passo Fundo há pouco mais de um mês. "Vamos observar o mercado para ver como é que esse negócio se comporta. Talvez nos próximos anos seja algo que possa vir [como negócio], mas por enquanto não está no nosso radar", diz Danieli.

No setor de proteína animal, a família continua tendo uma quantidade importante de granjas próprias – são 21 – mas resolveu deixar de lado os frigoríficos, estratégia que já havia traçado há quatro anos e agora se completou com a venda da última estrutura que ainda possuía, no município de Vila Lângaro, vendida à Santa Clara. O negócio foi anunciado em março e a cooperativa assumiu a planta no último dia 1º de maio.

O grupo já vinha prestando serviços nos últimos dois anos à Santa Clara e, segundo Danieli, a compra do frigorífico de suínos, capaz de abater 600 animais por dia, aconteceu de forma natural. “Já existia a ideia de um possível negócio. Eles foram se aproximando, e agora concretizamos a compra”, afirma.

No auge, além do frigorífico de suínos, os Danieli também tinham dois frigoríficos de aves, na cidade de Tapejara, que chegaram a ter um abate de 220 mil animais por dia. Os produtos eram comercializados sob a marca Danieli Alimentos, que eram vendidos principalmente no Rio Grande do Sul, mas também eram exportados para países da Ásia e do Oriente Médio.

Em 2021, a família resolveu vender toda a operação de aves - que incluia os dois frigoríficos de Tapejara, fábrica de ração e incubatório de aves - para a cooperativa catarinense Aurora, que comprou a operação em março daquele ano. A esmagadora de soja, que atendia à unidade e agora será desativada, não entrou na operação e continuou com a família.

O negócio se explica, segundo Rafael Danieli, pelo alto nível de investimentos que a área de proteína, em crescimento, já estava exigindo no momento, além de outros arranjos societários que a família não estava disposta a fazer.

"Teria que partir talvez para algumas alternativas que não estávamos querendo, como fazer até IPO ou buscar investidor externo, que era algo que a gente não gostaria”, afirma. "Vimos uma oportunidade de sair, então, da parte de carnes e focar em grãos.”

Como a Aurora não teve interesse no frigorífico de suínos que o grupo também possuía, os Danieli continuaram com o negócio por mais quatro anos, prestando serviços para terceiros. "Resolvemos manter o frigorífico, tirando a marca Danieli Alimentos do mercado e prestando serviços para outros players. Foi aí que chegamos à Santa Clara.”

O grupo continuou também com um negócio de fertilizantes, comercializados sob a marca Neorgan. Implantada em 2018, a fábrica de fertilizantes dos Danieli está passando por uma ampliação de área construída, passando de 11 mil metros quadrados para 20 mil metros quadrados, que exigiu um aporte de R$ 50 milhões do grupo e deve ficar pronta no último trimestre de 2025. A expectativa é de que a produção atinja 100 mil toneladas por ano.

O negócio começou em 2018, segundo Danieli, a partir da necessidade de destinação de resíduos orgânicos das granjas e de resíduos das estações de tratamento de efluentes das indústrias, que eram transformados em adubo orgânico numa produção em pequena escala. “Surgiu, então, a ideia de nós pegarmos esse fertilizante orgânico, comprarmos matéria mineral, moermos isso e granularmos novamente, fazendo um organomineral granulado.”

Para chegar no produto final, houve um longo trabalho de pesquisa com engenheiros agrônomos internos e terceiros, conta Danieli. A indústria passou a operar com esse produto em 2022, ainda com volumes limitados e agora, podendo fabricar mais, a ideia é atingir produtores de outras regiões do país, com embalagens de 50 kg e 1000 kg. “A expansão vai acontecendo naturalmente”, diz Danieli.

Resumo

  • Grupo Danieli, de Tapejara (RS), está investindo R$ 300 milhões em nova esmagadora de soja e na expansão de fábrica de fertilizantes
  • Expectativa é atender usinas gaúchas que produzem biodiesel em um raio de 200 quilômetros da sede do grupo
  • Empresa gaúcha vendeu frigoríficos de aves e suínos nos últimos anos e concentrou operações nas áreas de grãos e fertilizantes