Os investidores e a BRF vivem em clima de lua de mel. Depois de uma sequência de balanços positivos, com reflexos inclusive nos resultados de sua controladora, a Marfrig, a companhia vê seus papeis se valorizarem na B3, com o segundo melhor desempenho entre as empresas listadas que compõem o índice Ibovespa (Ibov), com valorização perto de 60% no ano.

Em outra frente do mercado de capitais, o apetite dos investidores pela companhia também ficou claro no encerramento, nesta quinta-feira, 27 de junho, de uma emissão de debêntures, vinculadas a Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs).

A BRF captou R$ 2,0 bilhões com a operação, que foi realizada em três séries. Ao AgFeed, uma fonte que pediu para não ser identificada relatou que foi a maior oferta de CRAs realizada por uma empresa de proteína animal nos últimos dois anos.

A demanda total foi de quase R$ 2,8 bilhões, segundo essa fonte. Anteriormente, em 2020, a BRF havia emitido um CRA de R$ 2,2 bilhões.

Anunciada em 20 de maio, a oferta previa a emissão de 2 milhões de debêntures, com a possibilidade de um lote adicional de outros 500 mil papeis, somando R$ 500 milhões, um incremento de até 25% sob a oferta inicial.

Na primeira série, com vencimento de cinco anos, a BRF emitiu R$ 140 milhões em CRAs, tendo remuneração de 100% do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), mais spread de 0,8%. A segunda série, de sete anos, foi de R$ 925 milhões, com remuneração prefixada definida em 12,9262% ao ano e spread de 0,8%.

Na terceira série, com vencimento de dez anos, a companhia emitiu R$ 935 milhões, corrigida pelo índice oficial de inflação (IPCA), e pagamento de juros de 7,2336%.

Segundo a companhia, os recursos da emissão serão destinados integralmente a investimentos, custos e despesas relacionados à sua cadeia de produção e exploração de animais.

A emissão de debêntures vinculadas à CRAs pela BRF teve participação da securitizadora EcoAgro e coordenação dos bancos Safra, Bradesco BBI, BTG Pactual, XP Investimentos, Itaú BBA, Santander e UBS Brasil.

A robustez da operação revela também que as mudanças nas regras de emissão de CRAs, anunciadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) no começo deste ano, até podem ter provocado um temor pontual no agronegócio, mas não tiraram o interesse do mercado por esse tipo de título.

O CMN determinou que apenas empresas agrícolas podem emitir CRAs. Certificados lastreados em instrumentos de dívida como debêntures que não sejam diretamente ligadas ao setor agrícola são vetados.

Desde então, com a concentração das ofertas em companhias do agronegócio, outra emissão de CRAs, além dessa da BRF, chamou a atenção. No fim de maio, a JBS levantou pouco mais de R$ 1,8 bilhão ao emitir os papeis com vencimento mais longo do mercado, de 20 anos.

A oferta inicial da operação foi de R$ 1,5 bilhão e, segundo a empresa da holding J&F, os recursos serão aplicados na compra de gado e em outras funções operacionais, relacionadas ao abate e à comercialização de produtos.

Levantamentos já mostram um mercado aquecido nos primeiros meses de 2024. Segundo dados da fintech Bloxs, entre janeiro e maio deste ano, as emissões de CRAs somaram cerca de R$ 17,5 bilhões. O montante é quase o dobro do registrado no mesmo período do ano anterior, de pouco acima de R$ 9 bilhões.

Pesquisa da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostrou que os CRAs registraram captações recordes no acumulado de 2024, de R$ 17,7 bilhões até maio, salto de 69,8% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Março registrou o maior montante, de R$ 7,4 bilhões em CRAs.

O analista de fundos imobiliários e Fiagros da TRX Investimentos, Atilio Garcia, acredita, no entanto, que as emissões de Certificado de Recebíveis do Agronegócio podem perder fôlego nos próximos meses.

Segundo ele, tal retração pode ser explicada pela inadimplência envolvendo CRAs observada desde o ano passado e pelas mudanças nas regras de emissão.

“As securitizadoras estão tendo mais cautela após os atrasos de pagamento. Com isso, a safra 2024/2025 deve sentir os efeitos da queda das operações em razão também das mudanças do CMN”, diz Garcia em entrevista ao AgFeed.