Bernardo de Arruda Reis agora pode falar de boca cheia: “A Tane Capital tem R$ 1,5 bilhão de patrimônio líquido sob gestão”.

Ele e o sócio, Marconi Silva, esperaram por esse momento por quase um mês, desde que anunciaram a criação da gestora até que se cumprisse toda a formalidade necessária para que quatro fundos que antes estavam sob responsabilidade da 051 Capital fossem definitivamente migrados para a nova casa – a administração prossegue com a XP Investimentos.

O processo, que incluiu a convocação de assembleias de cotistas, foi encerrado no última segunda-feira, 27 de outubro. Abriu-se, então, a porteira para que eles coloquem na rua a estratégia para execução de um pipeline ousado: lançar pelo menos um fundo de terras, com captação de R$ 1 bilhão, por ano.

A expectativa é colocar o primeiro fundo dessa nova fase no mercado ainda no primeiro trimestre de 2026. “A gente estava na expectativa de sair algo ainda esse ano. Mas, infelizmente, o tempo voa. Nós já estamos em novembro”, diz Reis.

“Já temos as áreas mapeadas, as conversas avançadas, todo mundo está mandatado, comprometido com a gente. Então, a ideia é avançar para a constituição do veículo no início do ano que vem para concluir o deal em fevereiro, mais tardar em março”.

A confiança de Reis vem junto com a reputação e o portfolio construído por ele e Silva na 051 capital, onde atuavam desde 2022. Então, os dois haviam recém-deixado a Prodap, agtech do segmento de nutrição animal vendida à multinacional holandesa DSM.

Os sócios trabalharam juntos na Prodap por mais de dez anos – Reis como sócio e Silva, primeiro como consultor em gestão responsável por grandes projetos em fazendas com mais de 50 mil hectares, fazendo planejamento estratégico, modelagem financeira, orçamento anual e depois como responsável pelo sistema de gestão dentro da própria agtech.

Na época, conta Reis, os dois já alimentavam o sonho de levar o negócio de terra para o mercado de capitais. “Em todo projeto de consultoria que participava o Marconi sempre dizia que, por mais que eventualmente o produtor não ganhasse dinheiro na atividade que estava em cima da terra, o negócio imobiliário sempre corrigia a conta”.

“Então, ele é o homem dos números, das modelagens, que faz as validações, e eu sou um cara mais da linha de frente”, define.

“Acho que nós dois temos um bom conhecimento de mercado, porque a gente rodou muito, mais de 10 anos rodando o Brasil inteiro e atendendo diversas fazendas”.

E ainda rodam, para fechar a primeira fazenda para o primeiro fundo de terras da 051 (e do País), o FZDA11, lembra Reis, eles chegaram a visitar 108 propeidades. “Então, é uma jornada de estar gastando a sola da bota diariamente”.

Segundo reis, atualmente o ritmo de avaliações se mantém intenso, com mais de dez ativos por semana passando pelo crivo dos sócios.

A “novata” Tane é, de fato, quase uma veterana, uma spin-off da 051, liderada por Luciano Brochmann, que agora é sócia minoritária dos seus dois ex-executivos. Eles carregam consigo não apenas os recursos, mas a experiência de terem escrito ali um histórico de pioneirismo no mercado de Fiagros para investimentos em imóveis rurais.

A ideia da cisão veio com a percepção de que, dentro da 051, a possibilidade de explorar os fundos de terras era limitada em um multifamily office com aplicações em outras vertentes e com menos liberdade para buscar novos investidores para suas teses.

“Nosso desejo era desenvolver uma esteira de produtos 100% agro, não apenas fundos de terra”, afirma Reis. “Não tem muitas casas com esse perfil no País”, explica.

A visão de Reis é de que o mercado de fundos de terras ainda é excessivamente tímido no Brasil. Ele estima que o valor das terras agrícolas no País supera os R$ 5 trilhões, mas nem R$ 100 bilhões (ou seja, 2%) estão listados em algum tipo de operação de mercado de capitais, como ativos de empresas ou de fundos.

Todos Fiagros de terras listados, por exemplo, somam apenas R$ 2,7 bilhões em patrimônio líquido. “E desses, R$ 1,5 bilhão são nossos”.

Segundo ele, hoje a maior parte das gestoras com produtos voltados para o setor “veio da Faria Lima para o agro”. “Nós já fizemos o caminho contrário, da botina para a Faria Lima”, diz ele – embora a sede da Tane se mantenha em Minas, no município de Nova Lima, na Grande Belo Horizonte.

O voo solo de Reis e Silva segue uma rota que eles já haviam começado a traçar nos últimos tempos de 051. Dos quatro fundos – três listados e um fechado – que trouxeram para a nova gestora, três são monoativos, ou seja, possuem apenas uma fazenda em seu porfolio.

Apenas em um deles a dupla viu a oportunidade de um follow on, convenceu os investidores e adquiriu uma segunda propriedade. São, portanto, cinco fazendas, que somam cerca de 45 mil hectares.

Nos três primeiros investimentos, eles buscaram áreas com produção consolidada que, depois de adquiridas, foram arrendadas para grandes grupos agrícolas, como SLC (três fazendas), Ciaseeds (companhia de sementes da Bahia) e Jequitibá Agro.

Já no último fundo, o FZMG11, ele puseram suas botinas em uma nova tese: a aquisição de fazendas com áreas de pastagens para a conversão para a agricultura.

É esse o caminho que pretendem seguir a partir de agora, já a partir do primeiro fundo criado na era Tane.

“Além de continuar com um pipeline bem quente aqui de áreas potenciais de conversão, a gente também está abrindo para analisar tanto teses de conversão para café quanto para florestas. É uma demanda que está surgindo aqui até por alguns investidores”, afirma.

O modelo de distribuição, embora mais livre do que na 051, vai se manter focado em grandes investidores e family offices, e, apenas no longo prazo, se as condições permitirem, chegar ao varejo.

Antes disso, entretanto, Reis acredita que será preciso “evangelizar” o mercado. Para ele, fundos de terras não são produtos para investidores que podem precisar de liquidez no curto prazo.

Os veículos hoje na Tane, por exemplo, ainda não tiveram saídas e são de prazo indeterminado.

“Com uma taxa de juros na casa de 15%, o nosso yield vai dar entre 4% e 6% ao ano. Então, não é um yield alto para o camarada que tem pouco patrimônio”, aponta. “É um produto, de fato, para quem tem um volume maior de patrimônio e quer perpetuar”.

A Tane busca uma rentabilidade média de 20% ao ano nos seus investimentos, mas sabe que, para atingir essa meta, tem que ter “o conforto de desinvestir na hora certa”.

E o desinvestir na hora certa, segundo Reis, pode exigir muitos anos até a chegada de uma janela favorável. Atualmente, na avaliação dele, o momento é péssimo para a venda terra.

“A gente tem que aguardar o momento correto, num ciclo positivo de 2, 3 anos seguidos com os grãos em franca ascensão, para conseguir pegar uma janela positiva de venda. Então, o nosso investidor não pode ter pressa. Ele tem que buscar rentabilidade, mas sem pressa”.

Por outro lado, Reis lembra que o investimento em terras possui taxas de risco mais baixas, com a valorização da terra servindo como uma espécie de hedge.

“O que a gente mira aqui como objetivo da gestora é entregar quase um resultado de private equity com risco de ativo imobiliário”, resume.

Nesse sentido, o risco do negócio, na visão de Reis, está na compra das propriedades. Por isso, ele diz que, desde os tempos da 051, tem buscado ser rigoroso das due dilligences antes de assinar os cheques, contando com a assessoria de escritórios experientes como VBSO e a Mattos Filho.

Se o momento não é ideal para vendas, está atraente para compras – por isso a ideia de avançar com a constituição de um novo fundo já nos próximos meses.

As dificuldades financeiras de produtores abrem oportunidades para seguir uma regra que vem sendo perseguida também desde o início pelos sócios que é só fazer aquisições de fazendas que estejam sendo comercializadas com 40% a 60% de desconto sobre os valores médios de mercado.

Na visão deles, sem essa margem, é difícil hoje atingir a rentabilidade buscada e atrair os investidores. “Se a gente comprar a preço de mercado, o yield cai de 4% a 5% para 2%, 2,5%. O desconto da compra, além de melhorar o negócio, ainda gera uma proporcionalidade maior do arrendamento frente ao valor do ativo”.

Além da tese da conversão de pastagens, Reis acredita que o mercado está propício a operações de sales and lease back, que consiste na compra de propriedades de produtores que necessitam levantar capital e o posterior arrendamento a esse mesmo produtor, para que ele mantenha a atividade.

Também no radar da Tane estão, para o futuro, fundos de crédito e de private equity. Mas tudo será feito no estilo mineiro, sem pressa nem alarde. “Só vamos entrar em um novo negócio quando atrairmos bons sócios que o conheça muito bem”.

Resumo

  • Nova gestora Tane Capital, criada a partir da 051, inicia operações com R$ 1,5 bilhão e foco em fundos de terras agrícolas
  • Companhia pretende lançar um fundo de R$ 1 bilhão por ano, com o primeiro previsto para o 1º trimestre de 2026
  • Estratégia mira ativos rurais com desconto e conversão de pastagens, buscando retorno de 20% ao ano e expansão gradual