Quem resolveu investir ou reinvestir em empresas do agronegócio nos últimos anos fez um negócio melhor do que se tivesse aportado o dinheiro na poupança ou em um título atrelado à Selic.
É isso que mostrou um levantamento inédito da Austin Rating, agência classificadora de risco de crédito de origem brasileira que levou em conta mais de 4100 empresas de diversos setores da economia.
No levantamento, a empresa mapeou o retorno sobre o patrimônio (ROE) dos segmentos e, dentre 34 setores, foram considerados oito que possuem uma ligação direta ou forte com o agro: Açúcar e Álcool, Agricultura e Pecuária, Alimentos e Bebidas, Tabaco, Máquinas e Equipamentos, Papel e celulose, Piscicultura e Cooperativas de Crédito.
Nesse período, enquanto a Selic teve uma rendimento mediano de 5,2% ao ano, os setores listados tiveram ROE mediano de, no mínimo, 8,5% ao ano, índice atingido, por exemplo, pelas cooperativas de crédito e empresas de piscicultura.
Entre os demais segmentos, o setor de Açúcar e Álcool teve ROE de 21,2% ao ano; Agricultura e Pecuária atingiu 14,9%; Alimentos e Bebidas, 15,5%; Tabaco, 29,1%; Máquinas e Equipamentos, 17,2%; Papel e Celulose, 15,9%.
Dentre todos os 34 setores levantados pela Austin Rating, o setor de Seguros, Previdência e Capitalização foi o que teve o maior ROE mediano entre 2019 e 2022, com um retorno de 32,1%.
Levando em conta só o ano de 2022, o segmento de Tabaco, que segundo Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating que elaborou o estudo, considerou duas empresas chinesas que atuam por aqui, o ROE foi o maior de todo levantamento, com 42,1%.
De acordo com Agostini, a dinâmica favorável ao agro tem diversas razões, que combinam de políticas estatais a questões geográficas. Ele cita como exemplo a presença forte de financiamento rural do Banco do Brasil como uma vantagem competitiva do segmento.
“Diferente de outros países, temos como característica o investimento do setor público no fornecimento de capital de risco ao setor. Não deixamos todo o risco na mão do produtor. O governo absorve esse risco via financiamento rural do BB e de máquinas e equipamentos pelo BNDES”, comenta o economista.
Outro ponto levantado por Agostini é a dinâmica favorável do País em relação a clima e território. Ele cita que a extensão territorial, somada a um clima que não é tão diferente entre as regiões, apesar de cada particularidade, deixa o cenário mais previsível para o cultivo.
“O clima tropical estimula a diversidade de culturas. Temos, por exemplo, tabaco no Rio Grande do Sul, oleaginosas no Nordeste e grãos no Centro Oeste. Isso ajuda muito o setor agropecuário”, analisa.
O terceiro aspecto que impulsiona o agro brasileiro, na visão dele, é a Embrapa. “O governo, para além do capital, entra com a parte de pesquisa e desenvolvimento, uma diferença grande no Brasil em relação a outros países. O setor é um dos maiores em produtividade global, produzindo mais com menor espaço de terra”, ressalta.
Para 2023, a tendência, segundo o economista, é repetir os bons resultados acima da taxa básica de juros, com as exportações novamente puxando o agro brasileiro, junto da produção.
No início do mês, a Conab projetou mais uma safra recorde para a temporada 2023/24: 322 milhões de toneladas grãos, um avanço de 18% frente ao visto em 2022/23.
Mesmo com um cenário externo ainda avaliando uma possível recessão global e uma desaceleração da China, Alex Agostini vê o Brasil bem posicionado para atender a demanda, com margens ainda boas para os produtores.
“Supondo que o preço [de grãos] ainda continue abaixo, só com o aumento de produção de 18% você já ganha mais margem. O preço pode ficar estável e mesmo assim o retorno já será melhor na comparação com 2022”, afirma.
O levantamento foi feito, segundo Agostini, com empresas, abertas ou não, que possuem balanços auditados e divulgados. As mais de 4100 empresas estão espalhadas por todo País, com uma distribuição regional que conta com metade sendo do Sudeste, 26,5% do Sul, 12,3% do Nordeste, 9,1% do Centro-Oeste e 2,7% do Norte.
Em termos financeiros, o ativo total mediano foi de R$ 226,8 bilhões, o patrimônio líquido mediano de R$ 68,9 bilhões, lucro líquido mediano de R$ 7,23 bilhões e uma receita líquida mediana de R$ 77,5 bilhões.
A ideia do levantamento surgiu, segundo Alex Agostini, de uma conversa com amigos economistas sobre a tributação dos fundos offshore e os exclusivos, que começou a ser pautada no Congresso.
A intenção de Agostini era mostrar que, mesmo com a tributação, algo que desagradava seus colegas, o retorno de alguns investimentos no País é grande. “Para nenhuma surpresa, constatei que a maior parte dos setores da economia tem uma margem de retorno interessante, maior do que a Selic”, afirma.
Ele considerou o intervalo de tempo de quatro anos, pois considera que desde então, tanto o país quanto o mundo passaram por transformações e eventos significativos. Por aqui o país aprovou a reforma da previdência e, no mundo, a pandemia se mostrou presente a partir de 2020 e, no ano passado, o início da guerra na Ucrânia mexeu com o preço de muitas commodities.
“O efeito global ainda não foi totalmente corrigido. A ideia do estudo era mostrar que, apesar de ter passado por um momento difícil, conseguimos nos recuperar rapidamente. Da mesma forma que o Brasil tropeça nas próprias pernas, tem uma capacidade de resiliência muito forte”, finaliza.