Na agropecuária, o sucesso ou o fracasso de uma iniciativa ou de uma nova técnica levam tempo para serem aferidos. Muitas vezes, várias safras, até que se possa ter uma conclusão definitiva.

Um ano e uma safra depois, a Fazenda Estância, da família Vick, localizada em Pirassununga (SP), pode dizer que passou na primeira etapa de seu processo de adoção de práticas regenerativas em suas lavouras, depois de quantificar a produção e a pegada de carbono de sua primeira safra nesse modelo.

A propriedade, conhecida como Fazenda Estância, aderiu a uma iniciativa da companhia de insumos Bayer, o Bayer ForwardFarming, em 2024, conforme reportou o AgFeed na ocasião. E, a partir de então, aceitou se colocar como um case de estudo quase em tempo real.

O programa da multinacional alemã promove agricultura sustentável e regenerativa em fazendas de todo o mundo – são 22 fazendas espalhadas em 14 países, sete delas na América Latina. No Brasil, a propriedade dos Vick foi a segunda no país a receber a iniciativa.

Agora, a fazenda está reportando os primeiros números da safra 2024/2025, que mostram indicadores promissores em seu projeto de redução da pegada de carbono.

Durante a temporada, a média de emissões da fazenda para a cultura de soja foi de 616,4 kg de CO2 equivalente por tonelada – ou seja, para cada 1 tonelada produzida, são emitidos 616,4 kg de gases de efeito estufa. Esse montante é 60% menor do que a média nacional, que é de 1526 kg CO2e por tonelada.

Um talhão medido, em específico, chegou a uma emissão de 373 kg CO2e por tonelada, 76% menor do que a média brasileira.

Além disso, em talhões com menor pegada de carbono, o índice de produtividade de soja da fazenda foi maior, chegando a 77 sacas por hectare.

Ao todo, foram avaliados 11 talhões para a cultura de soja na propriedade, considerando aspectos como mudança do uso de terra, plantio, manejos, colheita, secagem e transporte.

No milho, os resultados foram igualmente positivos. A média da Fazenda Estância nessa cultura foi 46% menor – 751,71 kg de CO2e por tonelada – do que a média nacional, de 1387 kg CO2 eq por tonelada.

"Gostamos muito de ver os resultados da pegada de carbono, de como pequenas mudanças que fizemos no manejo trouxeram mudanças e pretendemos continuar", disse Aline Vick, que lidera a operação agrícola da fazenda, ao AgFeed.

O cálculo foi feito utilizando a Footprint PRO Carbono, ferramenta desenvolvida pela Bayer em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), baseada na metodologia avaliação do ciclo de vida (ACV), que calcula a pegada de carbono de produtos agrícolas em sistema de produção, incluindo as culturas de soja, milho e algodão.

Para a próxima safra, Aline Vick diz que estará atenta ao comportamento das chuvas. Como a fazenda não possui sistema de irrigação, depende muito da quantidade e periodicidade correta das chuvas, que foram irregulares ao longo da última safra.

“A gente teve pelo menos três momentos longos de falta de chuva. Alguns talhões que tinham esse tipo de planta de ciclo mais curto sofreram muito porque faltou água bem no momento de floração ou de enchimento de grãos”, explica.

"Ficou muito nítido o quanto é importante olharmos a uniformidade das chuvas e não apenas o volume. Em volume, não houve muita diferença em relação a outros anos, mas a uniformidade, sim", complementa Vick. “Foi um aprendizado em relação a escolher melhor esses ciclos já pensando nas mudanças climáticas.”

A fazenda dos Vick já adota técnicas como plantio direto, rotação de culturas e cesta de insumos, práticas conhecidas quando se pensa em agricultura regenerativa, mas também dá um passo além.

Isso porque a propriedade adota também a técnica de rotação de raízes, forma de dar um "descanso" para o solo quando estressado.

Funciona assim: quando a análise de solo detecta algum talhão que está mais compactado, com menos atividade biológica, ou com problemas de nematóides, aquele pedaço da fazenda entra em um período de descanso. São plantadas, então, culturas de cobertura, com o objetivo de melhorar a qualidade do solo para a próxima safra.

“Num solo compactado, usamos nabo forrageiro, que vai ter um volume de raiz que vai descompactar. Se tem problema de nematóides, escolhemos uma cultura que corte esse ciclo. Às vezes só queremos produzir palhada e nitrogenar, escolhemos mix como milheto com crotalária”, explicou Aline Vick ao AgFeed há um ano.

E, claro, pequenas mudanças também acabam contribuindo para a melhora das condições no campo.

“No caso da cultura da soja, por exemplo, substituímos a aplicação de ureia pelo nitrato, que emite consideravelmente menos gases de efeito estufa”, explica Vick.

“Implementamos tecnologias de precisão que minimizam as manobras de maquinário, resultando em economia de combustível e, consequentemente, na redução das emissões de gases."

A fazenda dos Vick, no passado, era apenas um sítio de 90 hectares que funciona como uma espécie de hobby para o patriarca da família, José Vick, mas foi crescendo conforme os anos foram passando, e hoje é uma área de 1,2 mil hectares, cultivando soja, milho, sorgo, cana-de-açúcar e mandioca, administrada por Aline e Nathalia Vick, filhas de José Vick.

Além de participar do programa PRO Carbono, da Bayer, desde 2021, a família Vick também conduziu, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), um mapeamento de todos os solos da fazenda. A pesquisa serviu para mapear as enzimas e indicadores de vida do solo.

Aline Vick havia mencionado, há um ano, que esses dados ajudam a fazenda a entender como fazer um manejo melhor e qual talhão “descansar”.

“Para nós, o carbono é um indicador de vida, e não um gerador de créditos. Quanto mais carbono no solo, vimos que temos mais produtividade. Isso tudo mostra que a agricultura regenerativa não demanda uma perda produtiva, muito pelo contrário.”

Resumo

  • Um ano após aderir a programa de agricultura regenerativa da Bayer, Fazenda Estância (SP) reduziu em até 76% as emissões de CO2 na soja e 46% no milho, mantendo produtividade
  • Resultado é atribuído a práticas regenerativas como plantio direto, rotação de culturas, substituição de insumos e uso de agricultura de precisão
  • Para a safra 2025/20266, família proprietária da fazenda diz que deve ficar mais atenta à periodicidade das chuvas, que afetaram o ciclo 2024/2025