Belém (PA) - Demorou, mas finalmente é possível dizer que o Ministério da Agricultura e Pecuária chegou à COP 30, a conferência do clima da ONU.

Integrantes da pasta já vinham circulando por debates e encontros ao longo da última semana, mas ainda faltava a presença do líder do agro no governo federal.

Isso mudou na manhã desta segunda-feira, dia 17 de novembro, quando o ministro Carlos Fávaro visitou a AgriZone, espaço organizado pela Embrapa para concentrar a programação do agro em Belém.

“Na AgriZone, temos a oportunidade de também mostrar para o mundo, na prática, com todas as soluções usadas pela agropecuária brasileira para demonstrar que o Brasil é um grande celeiro na produção de alimentos e energias, mas (que produz) também com responsabilidade ambiental”, resumiu o ministro em rápida entrevista coletiva a jornalistas.

Enquanto o ministro percorria o pavilhão principal da AgriZone, o assessor especial da pasta, Carlos Ernesto Augustin, detalhou em um painel as novas frentes do Caminho Verde Brasil, programa do Ministério da Agricultura que pretende financiar a recuperação de 40 milhões de hectares de áreas degradadas de todo o território nacional em dez anos. O programa é uma das vitrines da pasta na COP 30.

Um importante passo desse programa, que ainda não começou a fazer seus primeiros investimentos, foi dado em agosto passado, quando ocorreu o segundo leilão do Eco Invest Brasil, programa de hedge cambial do Tesouro Nacional, com foco em pastagens degradadas.

O leilão contemplou 10 bancos, somando R$ 16,5 bilhões em capital catalítico, recurso que sai por um custo mais baixo, geralmente oferecido por governos e instituições de fomento para acelerar projetos que exigem o chamado capital paciente, de longo prazo e que demora para dar retorno.

Os recursos são emprestados aos bancos a juro baixo, de 1%, e servirão para a restauração de cerca de 1,4 milhão de hectares, área equivalente a 9 vezes o tamanho da cidade de São Paulo.

Entre as instituições contempladas pelo leilão, figuraram os maiores bancos do país, como Banco do Brasil, BNDES, BTG Pactual, Caixa e Bradesco, entre outras.

De acordo com as regras do certame, os bancos têm de alavancar em pelo menos 1,5 vez o recurso conseguido junto ao governo.

Assim, considerando os números do leilão do Eco Invest e a entrada de novos recursos, a expectativa é de um investimento total de R$ 30,2 bilhões, que serão desembolsados entre este ano e 2027.

Não há um teto para os juros a serem praticados pelos bancos a partir dessas operações, como queria inicialmente Augustin.

“Eu pessoalmente não gostei, achei que devia ter um teto, mas o fato de não ter teto vai fazer com que flua mais rápido esse dinheiro. Alguns bancos vão segmentar, o dinheiro que vem do Japão já vai vir segmentado, por exemplo, não é só dar dinheiro barato”, disse.

Quanto mais alta a alavancagem, mais alto deve ser o juro praticado pela instituições, avaliou o assessor do Mapa, citando o caso do BTG Pactual – que se comprometeu a fazer uma alavancagem de 2,3x, após ter recebido R$ 2,1 bilhões do Tesouro Nacional para financiar a recuperação de 164,1 mil hectares. “O juro do BTG deve chegar a mais de 10% ou 12%”, disse Augustin.

Apesar de comemorar os resultados do leilão, o assessor do Mapa não se deu por satisfeito com o que conseguiu até o momento. “Não podemos contar que todos os anos vai ter aporte do Tesouro. Temos que propor outras saídas”, disse Augustin durante o painel.

Até o momento, os recursos conseguidos foram por dívida, mas a intenção do Mapa é também conseguir recursos via equity.

Uma alternativa em estudo, explicou Augustin, é trazer investidores internacionais interessados em ganhos com a valorização da terra após a recuperação.

Como estrangeiros enfrentam restrições legais para comprar propriedades rurais no Brasil, uma eventual porta de entrada poderia ser via Fiagros, permitindo que os aportes financiem a conversão das áreas degradadas.

“Para que venha a ser sócio da agricultura brasileira de uma maneira que o investidor seja sócio da terra, mas não da operação. Como vai haver valorização da terra, o investidor ganharia com a terra”, disse Augustin.

Em rápida conversa com a reportagem após o painel, Augustin adiantou ainda que o Mapa terá, em janeiro do ano que vem, encontros com “fundos árabes” interessados nesse tipo de estrutura.

“Eles têm bastante dinheiro e gostam desse modelo de ser sócio”, afirmou o assessor especial do Mapa, econômico nos detalhes, sem especificar quais seriam esses fundos.

Outra saída, o offtake agreement, espécie de “barter” entre Brasil e China, que vem sendo discutido entre chineses e representantes do programa brasileiro, enfrenta dificuldades para ser viabilizado até aqui, segundo o assessor especial do Mapa.

“Estamos testando outro modelo com a China, sem sucesso, no qual o país, ao invés de pagar empréstimo em dinheiro, faz pagamento em produto, soja, algodão e carne. É um assunto difícil, porque as variações a longo prazo são grandes e temos que fazer hedge”, disse Augustin no painel.

Ao AgFeed, ele detalhou um pouco mais dos empecilhos. “Ninguém quer fazer negócio de 10 anos com o preço já ajustado. Nenhuma trading faz isso porque o custo de hedge com uma operação dessa é impossível”, afirmou Augustin.

Ele afirmou que ainda não se deu por satisfeito em viabilizar esse tipo de operação. “O tema volta à mesa em todas as reuniões com os representantes chineses”, disse

Em paralelo, o Mapa também avança nas negociações com o Japão, primeiro país a manifestar apoio ao programa, ainda no ano passado. Fávaro deve apresentar nesta terça-feira, 18 de novembro, o acordo de cooperação técnica com a Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA), em evento na AgriZone.

O acordo com os japoneses envolve ainda a cooperação financeira do Japão com o programa – estimada em cerca de US$ 1 bilhão, segundo Augustin, recursos que entrariam via Eco Invest e que, a depender da alavancagem, poderiam virar R$ 8 bilhões – seja anunciada em breve.

“Espero que consigamos anunciar entre o fim deste ano e o início do ano que vem”, disse o assessor especial do Mapa.

Resumo

  • Fávaro estreia na COP 30 defendendo o agro sustentável, enquanto o Mapa apresenta avanços e desafios do Caminho Verde, que mira recuperar 40 milhões de hectares
  • Governo busca novas fontes de capital — incluindo fundos estrangeiros, Fiagros e acordos com Japão e China — para complementar recursos do Eco Invest
  • Japão deve anunciar cooperação técnica e financeira de até US$ 1 bi; Mapa estuda modelos de equity e parcerias com grandes investidores globais