O seguro rural entrou em 2025 cercado por expectativas que não se confirmaram. Depois de um 2024 marcado por uma safra volumosa de grãos e margens mais favoráveis ao produtor, o mercado de seguros começou o ano de olho em ampliar as apólices rurais no País.

As seguradoras buscaram capacidade de resseguro no mercado internacional, desenharam novos produtos e trabalharam com a projeção de um orçamento de pouco mais de R$ 1 bilhão de subvenção do governo federal para o seguro rural.

O cenário, no entanto, mudou rapidamente por diferentes fatores, e o ano deve terminar com uma queda esperada de 6,4% para o mercado do seguro rural, de acordo com projeção da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).

“A expectativa era extremamente positiva, mas às vezes algumas premissas não batem e algumas coisas deixam de ser cumpridas”, resume Glaucio Toyama, presidente da Comissão de Seguro Rural da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), em entrevista ao AgFeed.

Isso porque, apesar de uma boa produção de grãos no campo, o início de 2025 foi marcado por restrição de crédito rural, juros elevados e um ambiente de desconfiança agravado pelo avanço das recuperações judiciais no setor.

Com a Selic em 15% e produtores acessando crédito a percentuais de juros que chegam a 20% ou 25%, Toyama avalia que o seguro passou a ser visto como um gasto difícil de acomodar no caixa dos produtores.

“Nesse cenário, não existe espaço para o produtor comprar seguro porque ele precisa pagar a dívida dele, precisa pagar as dívidas anteriores”, afirma o presidente da comissão de Seguro Rural da FenSeg.

O problema estrutural se agravou com o contingenciamento de recursos do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR), promovido pelo governo federal ao longo do ano.

Um sinal de alerta vindo do PSR havia ressoado no último dia de 2024, o governo retirou mais de R$ 60 milhões de valores já empenhados, o que gerou prejuízos para seguradoras e produtores.

“A situação já começou nervosa naquela primeira semana de janeiro, com a gente discutindo com o governo, sinalizando com as entidades como que a gente poderia caminhar”, recorda Toyama.

Na sequência, ao longo de 2025, a situação continuou ruim. Isso porque, apesar de a verba prevista originalmente pela Lei Orçamentária anual ser de R$ 1,06 bilhão, o PSR sofreu um corte de pelo menos R$ 445 milhões previstos para que o Executivo conseguisse cumprir as metas fiscais previstas para este ano.

Somando a dificuldade de subvenção com os problemas financeiras dos produtores, o seguro rural teve uma retração histórica em termos de área segurada, que atingiu 3,2 milhões de hectares em 2025, de acordo com dados do Atlas do Seguro Rural, do Ministério da Agricultura e Pecuária.

Trata-se da menor quantidade de área desde 2015, quando haviam sido seguradas 2,6 milhões de hectares. Com base nos dados oficiais, a FenSeg estima que 97% da área produtiva brasileira ficou sem produção em 2025. “O bloqueio do governo em relação à subvenção trouxe para a gente  um desarranjo de proteção de risco bastante grande”, avalia Toyama.

Ao todo, o PSR garantiu 61,6 mil apólices de 42 mil produtores em todo o Brasil. Tradicional mercado para as seguradoras, o Sul continua sendo a região do país com o maior número de área segurada, com Paraná (16,6 mil produtores) e Rio Grande do Sul (9,2 mil) à frente.

Melhoras à vista para 2026

Possíveis novidades poderão surgir no âmbito oficial para o seguro rural no ano que vem. Isso porque o Ministério da Agricultura e Pecuária pretende desenvolver, ainda no início de 2026, um novo modelo para o seguro rural.

A proposta, segundo informações do jornal Valor Econômico, já teria tido aval do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A ideia é tornar a contratação de seguros obrigatória para produtores que tomarem financiamentos do Plano Safra, para expandir a cobertura e diversificar o risco.

A pasta também planeja que o recurso destinado ao seguro rural não seja alvo de cortes e bloqueios, além de fazer a migração de produtores que hoje acessam o Proagro para o PSR, trazendo também parte do orçamento do programa.

Também há ainda a intenção, por parte do Mapa, de apresentar um requerimento de urgência para que o projeto de lei nº 2.951 do Senado, elaborado pela senadora Tereza Cristina, seja apreciado pelo plenário da Câmara já no início do ano legislativo em 2026. A proposta faz alterações nas leis de política agrícola e seguro rural.

Por ora, o Executivo prevê R$ 1,017 bilhão em recursos para o PSR, recursos que, por enquanto, não estão passíveis de bloqueios, situação que pode mudar após votação da Lei Orçamentária Anual.

No lado das seguradoras, a expectativa para o ano que vem, independentemente das movimentações do Mapa, é positiva.

A CNseg projeta um crescimento de 2,3% no seguro rural em 2026, projeção se ancora especialmente nas perspectivas trazidas pelo projeto de lei da senadora Tereza Cristina.

O texto, apresentado em 2024, sugere a alteração das leis 8.171/1991 e 10.823/823, que tratam das leis de política agrícola e seguro rural, respectivamente.

O projeto de lei sugere que o PSR seja enquadrado nas Operações Oficiais de Crédito, sob administração do Tesouro Nacional, tornando-se uma despesa obrigatória do governo. Dessa forma, os recursos do seguro rural não poderiam ser contingenciados, pois sairiam da linha de despesas discricionárias do Ministério da Agricultura, ou seja, passíveis de cortes.

A proposta inclui também a previsão de uma remodelação do Fundo Catástrofe, criado pelo governo federal pela Lei Complementar nº 137, de 2010, e que nunca chegou a operar de fato. A ideia é que a União e as seguradoras passem a contribuir com esse fundo, destinado a apoiar o seguro rural em situações de desastres climáticos.

A proposta foi aprovada no fim de novembro pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado e ainda precisa passar por uma votação suplementar na CCJ. Se a aprovação for confirmada pela comissão, o texto será avaliado pela Câmara dos Deputados.

“Se sancionada, (a proposta) cria um cenário muito mais otimista para o seguro rural”, comentou o presidente da CNSeg, Dyogo Oliveira.

“Dada essa particularidade do seguro rural, considero que 2026 será um ano muito positivo e otimista para o mercado de seguros. As projeções são boas e mostram esse movimento“, emendou Oliveira.

A FenSeg acompanha o otimismo da CNSeg e também vê no horizonte sinais de retomada do seguro rural ao longo de 2026, ainda que evite cravar uma projeção em termos quantitativos. “O tamanho desse crescimento vai depender de muitas premissas, mas acreditamos que ele venha”, afirma Glaucio Toyama.

Um dos principais vetores da virada, na avaliação de Toyama, é a trajetória da taxa de juros. “A taxa de juros tende a cair em 2026 e de forma rápida. A gente não sabe dizer o quanto ela vai cair, mas vai ter um efeito imediato no custo do dinheiro para o Tesouro Nacional”, avalia.

Com juros mais baixos, emenda Toyama, abre-se espaço para um Plano Safra mais robusto, maior fluidez do crédito rural e, consequentemente, mais previsibilidade para os programas de mitigação de risco, como o seguro agrícola. “Mesmo com os desafios fiscais, a expectativa é de queda”, avalia Toyama.

Outro fator que Toyama acredita ser relevante é a mudança no perfil da demanda agrícola. A expansão acelerada das plantas de etanol de milho no Brasil tende a puxar fortemente o consumo do grão, criando uma pressão adicional por área e produtividade.

“Se a janela não fosse muito curta para o milho safrinha, a gente teria uma explosão de área de milho safrinha neste ano e aí já teria uma demanda em termos de crescimento. De qualquer forma, com taxa de juros mais baixa e Plano Safra positivo, você retoma um negócio que está muito parado e com retração nos últimos anos”, diz.

Nas finanças, Toyama avalia que o avanço das recuperações judiciais no agronegócio gerou cautela, mas que começa a se abrir espaço para renegociações e redefinições de quem permanece e quem sai do jogo.

Paralelamente, enquanto mudanças não acontecem no PSR, Toyama lembra que o mercado segurador passou a desenvolver soluções menos dependentes da subvenção governamental em parceria com produtores rurais.

Grandes produtores, segundo ele, já acessam seguros mais sofisticados, como produtos paramétricos e programas customizados montados em conjunto com cooperativas, bancos e indústrias, protegendo carteiras de crédito e financiamentos.

O seguro paramétrico é tido como uma importante alternativa de mercado. Não à Mapfre, uma das maiores seguradoras do mercado, continua estudando, por exemplo, a entrada nesse. “A gente está buscando e trabalhando para ter (seguro paramétrico). Hoje eu não tenho disponível, mas pretendemos lançar num futuro não tão distante”, afirmou Pablo Emanuel Haack, gerente técnico da Mapfre, em entrevista ao AgFeed em novembro.

As seguradoras também avançaram em modelos híbridos, lembra Toyama, como o chamado seguro de faixa, no qual a cobertura não começa no zero, mas a partir de um patamar mínimo de perda, por exemplo, de 30% a 70% da produção. A lógica é simples: ao assumir uma parte do risco, o produtor reduz o custo do prêmio.

“Muitos estão dispostos a correr esse tipo de risco e dizem que nunca colheram menos de 30% da safra e que estão dispostos a bancar o risco”, explica Toyama.

Outro avanço foi a consolidação de seguros de margem e de receita para grãos, além da ampliação de coberturas sanitárias. Produtores de estados como o Rio Grande do Sul já contratam, há anos, seguros contra febre aftosa, e negociações semelhantes avançam em outras regiões para eventos como gripe aviária e peste suína. “Os estados estão muito preocupados com os aspectos sanitários”, diz Toyama.

Resumo

  • O seguro rural deve encerrar 2025 em retração, pressionado por juros altos, restrição de crédito, avanço das recuperações judiciais no agro e cortes no orçamento da subvenção.
  • A queda estimada para o seguro rural, segundo a CNseg, é de 6,4% este ano.
  • Para 2026, o setor vê sinais de retomada com a queda esperada dos juros e avanços em proposta legislativa de mudanças no PSR.