Belém (PA) - João Adrien, head de ESG Agro do Itaú BBA, desembarcou em Belém nesta semana para participar de mais uma COP. E trouxe, na bagagem, quase R$ 2 bilhões em recursos desembolsados pelo banco para um programa que vem brilhando no segmento de recuperação de pastagens, o Reverte, além de novos planos para o futuro.

O banco estuda, por exemplo, a possibilidade de criar uma linha de crédito ESG agro voltada à pecuária.

“A gente tem estudado muitas soluções para a pecuária. Acho que é uma grande oportunidade e também existe uma demanda muito grande de recursos para a pecuária”, adiantou Adrien, em entrevista exclusiva ao AgFeed no início desta semana no escritório do banco em Belém.

O projeto está sob análise e ainda não tem data para acontecer, mas se tudo der certo, poderá ser lançado já em 2026, segundo Adrien.

Se concretizado o plano, essa seria a sexta linha de crédito na prateleira de produtos ESG Agro do Itaú BBA, hoje composta por cinco modalidades: uso de bioinsumos, comercialização de bioinsumos, certificações, energia solar nas propriedades e plantio de cobertura. Essas linhas já correspondem a uma carteira de R$ 3 bilhões.

Ainda não está claro, no entanto, o que exatamente o Itaú BBA pretende financiar com a nova linha de crédito voltada à pecuária. Adrien diz que o banco vem estudando modelos e formatos de atuação.

“Temos pensado como achamos um caminho para entrar na pecuária, o que não é tão óbvio como na agricultura”, diz o executivo.

Para ele, o maior desafio está na própria natureza da atividade. “A pecuária tem um desafio muito grande, porque a agricultura está muito mais padronizada”, diz.

Enquanto o cultivo de grãos segue pacotes tecnológicos definidos e ciclos previsíveis, o gado opera em três realidades completamente distintas – cria, recria e engorda –, cada uma exigindo um modelo de negócio diferente.

Na cria, avalia Adrien, o sistema depende mais do patrimônio – matrizes e vacas – e demanda pouco capital de giro. Já na recria, o ciclo é mais dinâmico e exige mais recursos para acelerar o crescimento dos animais. E na engorda, o capital de giro é alto e os desafios ambientais se concentram na alimentação e na redução das emissões de metano.

“Não existe uma solução única que resolva todos os gargalos”, afirma Adrien. “A cria está mais vinculada à recuperação de pastagens e integração lavoura-pecuária, a recria pede eficiência e redução de idade de abate, e a engorda precisa avançar em suplementação e insumos que diminuam a fermentação entérica.”

Além da operação funcionar de maneira distinta da agricultura, o perfil de crédito dos pecuaristas também é diferente, explica Adrien. “A agricultura é uma atividade muito intensiva em capital. A pecuária, a depender do ciclo, não é tanto.”

Entre as alternativas em análise, segundo o executivo, estão os modelos de integração lavoura-pecuária (ILP), em que a criação de animais convive com a produção agrícola, e o TIP (Terminação Intensiva a Pasto), voltado para a finalização do gado em pastagens de alta eficiência.

Adrien diz que o Itaú BBA quer aproveitar também o momento de modernização pelo qual a pecuária passa – mas pondera que esse também não é um desafio simples.

"Na agricultura, você tem uma cadeia muito dependente de trading, produtor, você tem o barter e vários instrumentos financeiros que te ajudam a gerar incentivo. Isso não tem tanto na pecuária. E os serviços também não têm contrato de longo prazo", analisa.

Para entender melhor qual caminho seguir, o executivo diz que o Itaú BBA está de olho no que está analisando o Insper Agro Global, que colocou a pecuária como uma de suas pesquisas estratégicas para este ano.

“O Insper está trazendo vários atores, seja indústria, produtor, consumidor, frigoríficos, e a gente vai conseguir ter uma visão um pouco mais clara de quais são os gargalos, até porque é uma cadeia que tem as suas questões entre produtor e indústria, entre importador e tal”, diz.

Em paralelo, o Itaú BBA segue dando impulso a outras frentes, como o Programa Reverte, carro-chefe da área Agro ESG.

O Reverte é um programa de recuperação de pastagens, executado em parceria com a multinacional de insumos agrícolas Syngenta, e nasceu oficialmente em 2019, no embalo das discussões sobre agricultura regenerativa.

A iniciativa ganhou escala com a estruturação de crédito de longo prazo e assessoria técnica conjunta entre Syngenta e Itaú BBA e, em números, apresenta um salto expressivo: hoje o Reverte já está em 279 mil hectares, somando 410 fazendas e 97 agricultores.

Ao todo, já foram R$ 2,03 bilhões desembolsados em 11 estados – metade do programa está concentrada em áreas de Mato Grosso.

A expectativa do Itaú BBA para este ano é de que o programa chegue a 300 mil hectares e a ideia do banco de investimentos é que o programa atinja a marca de 1 milhão de hectares recuperados já em 2030. “O Reverte tem sido para a gente um grande experimento de como desenvolver produtos para impactar a agenda ESG”, diz Adrien.

O banco também foi uma das dez instituições financeiras contempladas pelo leilão de pastagens degradadas do Eco Invest, promovido neste ano pelo Tesouro Nacional, obtendo R$ 1,95 bilhão em recursos, que terão de ser alavancados em pelo menos 1 vez e meia.

Nesse leilão, o governo entra emprestando recursos a juro baixo para que os bancos multipliquem esse montante para trazer novos investidores e, na ponta, financiem a restauração de cerca de 1,4 milhão de hectares. O Itaú se comprometeu a financiar a recuperação de 202 mil hectares.

Adrien atenta para o manancial de dados de produção sustentável que o leilão pode viabilizar. “Se a gente de fato impactar mais de 1 milhão de hectares, o País vai ter um banco de dados de adoção de práticas sustentáveis que nunca teve”, analisa Adrien.

“Não é só um programa de conversão. É uma iniciativa que traz capacidade de gerar dados estratégicos, para demonstrar como a adoção de práticas sustentáveis impacta carbono, impacta a mineralização do solo e vários outros indicadores.”

Adrien diz ainda que há outras parcerias no radar do Itaú BBA, estratégia que passa por ampliar o uso de parcerias intracadeias, tendo como referência o próprio Reverte, desenvolvido com a Syngenta, diminuindo os riscos das operações, mais caras que o convencional.

Ele prefere não detalhar os planos à reportagem, mas adianta que novidades poderão vir já no primeiro trimestre do ano que vem.

COP

Adrien diz que o Itaú BBA desembarcou na COP 30 confiante de que a relação entre agricultura e clima traz oportunidades para o setor como um todo.

Para ele, já está claro que a adoção de práticas sustentáveis melhora a produtividade, aumenta a resiliência climática e abre caminho para novos mercados, especialmente em um contexto de transição energética que eleva a demanda por produtos agropecuários. “A própria lei do combustível do futuro é um exemplo disso.”

O executivo cita o estudo recente coordenado pelo ex-ministro Roberto Rodrigues sobre agricultura tropical como evidência de que o Brasil está ajustado às exigências da nova economia climática.

“Ele mostra como a agricultura tropical, ao passo que adota tecnologias, também endereça os desafios climáticos”, diz. Essa visão reforça a estratégia do banco: tornar sustentabilidade uma prioridade central.

O Itaú, como grupo, assumiu a meta de reduzir em 50% suas emissões financiadas até 2030 e atingir emissões líquidas zero até 2050.

No agro, Adrien diz que o foco tem sido aprofundar o entendimento sobre o perfil de emissões dos clientes, seus modelos de negócio e os pontos de melhoria que podem ser financiados. “Tem sido muito uma jornada de conhecer esse nosso cliente”, afirma o executivo.

O Itaú não mudou de posição mesmo após o fim da Net Zero Banking Alliance (NZBA), da qual a instituição participava.

A NZBA foi uma iniciativa do setor bancário global, apoiada pela ONU e lançada em 2021, que chegou a reunir mais de 140 bancos de diferentes partes do mundo para alinhar suas atividades de financiamento com as metas de emissões líquidas zero até 2050.

Contudo, após uma debandada de vários membros ao longo do último ano, a aliança anunciou o encerramento das suas operações no mês passado.

“A NZBA se tornou agora um framework e a gente entende que ele foi muito importante para que pudéssemos nos engajar na agenda e desenvolver toda a nossa estratégia de mensuração de carteira”, analisa Adrien.

“O que estabelecemos na época da NZBA foi fundamental e tem sido uma trajetória positiva na relação com o cliente, porque nos permite conhecer melhor o perfil dele. Vamos continuar seguindo a nossa estratégia, porque acreditamos que o que colocamos lá atrás é o melhor para o banco, para o nosso cliente e para a economia como um todo”, emendou.

Resumo

  • João Adrien, head de ESG agro do Itaú BBA, diz que o banco estuda a criação de uma nova linha de crédito ESG voltada à pecuária
  • A análise está sendo feita e o lançamento do produto ainda não tem prazo para acontecer, mas se tudo der certo, há a possibilidade de que vá ao mercado já em 2026
  • Adrien afirmou que o Itaú BBA seguirá ampliando parcerias intracadeias para reduzir risco e custo das operações ESG, prometeu novidades já no primeiro trimestre de 2026