De olho em influenciar as discussões da COP 30, a conferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU), um time de peso formado por nomes como o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues e o professor Marcos Jank, entre outras figuras e instituições influentes do agro brasileiro, está se reunindo numa organização para defender que a agricultura tropical seja reconhecida pelos países participantes da COP como solução global para segurança alimentar, energética e climática.

Trata-se da Rede de Inteligência em Agricultura e Clima (RIAC), uma aliança formada pela consultoria Agroicone, FDC Agroambiental, FGV Agro, Insper Agro Global, Instituto Equilíbrio e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), que contam com apoio do Instituto Clima e Sociedade (ICS).

A ideia é que os integrantes dessa rede, que estavam trabalhando de forma separada até aqui, agora passem a atuar em conjunto, para que haja mais unidade nas ideias desenvolvidas na academia e também um discurso mais unificado em defesa da agricultura tropical.

"A gente começou a fazer alguns projetos e aí surgiu essa ideia: ‘Por que a gente não aproveita a COP e faz algo que possa unir essas entidades todas em torno do mesmo tema, mas com diferentes abordagens? Agora a gente vai convergir em torno da ideia de agricultura tropical regenerativa", afirma a pesquisadora Ludmila Rattis, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), uma das integrantes da rede, em entrevista ao AgFeed.

Rattis explica que a rede está trabalhando sobre quatro pilares: (1) atuação baseada na ciência; (2) neutralidade política para construir consensos entre diferentes atores; (3) convergência para alinhar iniciativas e conseguir ganhar escala e impacto positivo; (4) internacionalização da proposta, para que seja feita a defesa da agricultura regenerativa “tropical” – e não apenas “brasileira”.

Para influenciar as discussões da COP 30, a aliança estará presente em Belém em eventos que serão promovidos tanto dentro do espaço da conferência – com presença na Green Zone (área aberta ao público) e também na Blue Zone (restrita a negociadores, governos e imprensa) – quanto fora, em espaços como a AgriZone, da Embrapa, entre outros.

Em paralelo, a iniciativa já lançou um site bilíngue - em português e inglês - que já reúne cerca de 40 artigos científicos sobre agricultura tropical e clima, produzidos por pesquisadores das instituições participantes.

O ex-ministro Roberto Rodrigues, enviado especial da COP 30 para o agro, vai, inclusive, levar aos negociadores uma síntese desses estudos para defender a importância da agricultura tropical como arma para o combate às mudanças climáticas.

Um desses papers, obtido pela reportagem, é o artigo “Diagnóstico e Reposicionamento da Agricultura Tropical”, com autoria de Marcos Jank, coordenador do Insper Agro Global, e outros seis pesquisadores do Insper.

O levantamento compara as realidades agrícolas de países tropicais na América do Sul, África e Ásia, e mostra a distância entre eles, e por isso, a necessidade de uma maior unidade quando se fala em “agricultura tropical regenerativa”.

“A heterogeneidade é muito grande. Desde 1960, a produtividade total da agricultura no Brasil, considerando terra, trabalho e capital, cresceu em média 1,8% ao ano e, nos últimos 25 anos, vem crescendo 3,2% ao ano. Mas se você pegar os países da Ásia, eles estão na faixa de 1,3%. Já na África Subsaariana, o crescimento é de apenas 0,4%”, explica Jank.

A partir desses dados históricos, os pesquisadores buscaram compreender por que houve um “gap” no desenvolvimento da agricultura entre os países tropicais e concluíram que as práticas adotadas no Brasil foram decisivas para o aumento da produtividade nacional em relação a outras regiões do mundo.

“Temos a intensificação da produção, com plantio direto, duas ou até três safras por ano, e mais recentemente, sistemas integrados entre agricultura, pecuária e floresta plantada, fibras, bioenergia, carbono.. Isso aumentou não só a competitividade do país, mas também a sustentabilidade, porque foram adotadas várias técnicas conservacionistas”, explica o pesquisador.

Ainda que as práticas adotadas no Brasil não representem uma “bala de prata” aplicável a outras regiões do mundo sem adaptações, Jank avalia que o agro brasileiro se tornou uma referência por conseguir conciliar sustentabilidade e produtividade.

Por isso, segundo ele, o país merece maior reconhecimento dos principais participantes da COP, que ainda tendem a adotar metodologias e visões baseadas em realidades de países temperados, onde as formas de produção agrícola e pecuária são bastante diferentes.

“O que a gente defende é que o processo que aconteceu de intensificação no Brasil, de um lado, gerou produtividade e competitividade, mas, do outro lado, também gerou sustentabilidade”, avalia Jank.

“É claro que não foi assim desde o começo, quando houve uma expansão geográfica mesmo, com desmatamento e tudo o mais, que era o que tinha que ser feito nas condições da política pública daquela época, mas hoje o que se busca é uma adaptação cada vez maior às condições tropicais, fazendo muitas coisas ao mesmo tempo.”

A agenda da aliança não termina na COP 30 e deve continuar pelas próximas conferências. “Mas se a COP 30 consegue consolidar esse reconhecimento, espera-se que gere a partir daí um monte de coisas, como financiamento climático para essas soluções, etc”, complementa Rodrigo Lima, sócio-diretor da consultoria Agroicone.

Resumo

  • Personalidades do agro lançam grupo para defender que agricultura tropical seja reconhecida na COP 30 como solução climática
  • Rede de Inteligência em Agricultura e Clima (RIAC) é formada por Agroicone, FDC Agroambiental, FGV Agro, Insper Agro Global, Instituto Clima e Sociedade, Instituto Equilíbrio e Ipam.
  • A ideia é que os pesquisadores trabalhem em conjunto para que haja mais unidade nas pesquisas e no discurso