Belém (PA) - O Bradesco chegou à COP 30, a conferência do clima da ONU, disposto a mostrar mudanças que vem implementando, o que inclui novos passos na agenda voltada à sustentabilidade.

Um dos marcos deste posicionamento foi um anúncio feito pelo banco no início da COP que surpreendeu o mercado. O banco se uniu ao BNDES e ao fundo Ecogreen para botar de pé uma certificadora de créditos de carbono nacional chamada Ecora.

Trata-se da primeira alternativa de peso no mercado de carbono nacional à americana Verra, a maior certificadora do mundo, notória pela pouca celeridade em seus processos, dificultando a certificação dos créditos de carbono.

Com essa iniciativa, o Bradesco está se preparando para a entrada plena em vigor do mercado de carbono no país nos próximos cinco anos, hoje em fase de regulamentação e implementação.

Como não há tempo a perder, a ideia é que as atividades da Ecora comecem já no ano que vem, com metodologia já adaptada à realidade brasileira.

Essa é uma demanda antiga de quem gera ou pretende gerar créditos de carbono por aqui, que muitas vezes esbarram em métricas de clima temperado ou ainda numa falta de compreensão sobre como funciona o sistema fundiário no Brasil.

Para Fabiana Costa, superintendente de sustentabilidade do Bradesco, a criação da Ecora permitirá que os projetos reflitam a realidade brasileira de forma precisa. “Hoje é muito difícil trabalhar com metodologias que não refletem a realidade brasileira”, diz.

A meta, portanto, é garantir eficiência e precisão. “A ideia é trazer metodologias que enderecem as realidades brasileiras, com eficiência, transparência e agilidade. E com um time técnico bem robusto.”

Costa, que conversou com o AgFeed após um evento na EY House, espaço da consultoria em Belém, na semana passada, vê a Ecora como um exemplo de uma estratégia adotada pelo banco, que envolve inserir a sustentabilidade de forma transversal aos negócios da instituição financeira.

“A agenda de sustentabilidade hoje é parte do propósito da estratégia da organização. Quando o Bradesco se posiciona no mercado, a sustentabilidade faz parte desses pilares relevantes. Quando a gente pensa numa COP, tudo que nós estamos fazendo, não é especificamente para a COP”, afirma a executiva.

Fabiana explica que o banco tem concentrado esforços em conscientizar sua base de clientes, especialmente no agro, onde a instituição tem uma carteira significativa – que ficou próxima de R$ 130 bilhões no ano passado.

“É muito importante trabalhar o conhecimento de toda a cadeia de valor, porque a sustentabilidade hoje, como oportunidade ou risco, impacta todo mundo”, diz. “A gente tem clientes grandes, com estruturas robustas, e clientes menores que estão aprendendo essa agenda.”

A linha orientativa faz sentido até se comparada à própria história da instituição, que nasceu em 1942 em Marília (SP), atendendo pequenos cafeicultores do interior do estado e sempre teve forte presença nas camadas populares da sociedade.

Nesse contexto, Costa lembra que a orientação precisa chegar também às equipes comerciais. “Eu preciso que o meu gerente da ponta entenda, conheça e consiga levar isso para o cliente, para ajudá-lo no desenvolvimento de novos negócios e atender demandas reais.”

Um exemplo dessa estratégia apareceu no segundo leilão do Eco Invest, programa de hedge cambial do Tesouro Nacional, realizado em agosto passado.

Na ocasião, o Ministério da Fazenda liberou R$ 16,5 bilhões em financiamento a dez bancos, com juros reduzidos, para que essas instituições multiplicassem os recursos e ampliassem a oferta de crédito destinada à recuperação de 1 milhão de hectares de áreas degradadas nos cinco biomas brasileiros.

Costa diz que a instituição fez um workshop no qual reuniu representantes do Tesouro e clientes.

“Para que a gente discutisse juntos qual era o melhor modelo, os clientes trouxessem as suas dúvidas também, porque não é só você fazer um repasse de recursos, você tem todo um monitoramento, um acompanhamento para ser feito e uma prestação de contas”, diz.

Com essa mesma linha orientativa, o Bradesco tem colocado em prática uma norma de autorregulação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a SARB 26, lançada em maio de 2023, como forma de garantir que os animais abatidos por frigoríficos não tenham passado por áreas desmatadas na Amazônia.

O normativo da Febraban prevê que, se quiserem, os bancos poderão deixar de fornecer crédito a frigoríficos que não fizerem o rastreamento completo de suas cadeias de fornecimento.

A executiva explica que os times comerciais do Bradesco estão auxiliando os frigoríficos a se adaptarem a essa medida.

“Estamos na etapa de diagnóstico, de levar o tema para os clientes como uma exigência”, explicou. “O SARB é uma mudança grande para os clientes, porque eles têm que se adaptar, desde o cliente grande, um frigorífico enorme, até um frigorífico pequeno.”

As metas de descarbonização do Bradesco incluem zerar as emissões da carteira de crédito e investimentos até 2050, além de reduzir em 50% as emissões operacionais até 2030.

Nada mudou na estratégia do banco, mesmo com o fim da Net Zero Banking Alliance (NZBA), da qual a instituição participava.

A NZBA foi uma iniciativa do setor bancário global, apoiada pela ONU e lançada em 2021, que chegou a reunir mais de 140 bancos de diferentes partes do mundo para alinhar suas atividades de financiamento com as metas de emissões líquidas zero até 2050.

Contudo, após uma debandada de vários membros ao longo do último ano, a aliança anunciou o encerramento das suas operações no mês passado.

“A aliança foi bacana porque a gente conseguiu, em um grupo de bancos nacionais e internacionais, discutir tecnicamente uma série de aspectos relevantes”, diz Costa.

“Mas a descarbonização segue como parte da estratégia climática do Bradesco", emenda. “Independente de a aliança existir ou não, nós seguimos comprometidos. Essa é uma agenda de riscos e oportunidades, é uma agenda regulatória e não tem como a gente não olhar a descarbonização do portfólio.”

Resumo

  • O Bradesco lançou na COP 30, com BNDES e Ecogreen, a primeira certificadora nacional de créditos de carbono
  • A certificadora Ecora promete adaptar as metodologias de mensuração de carbono à realidade brasileira
  • Banco vem intensificando sua estratégia de sustentabilidade, optando por uma linha educativa, o que inclui os clientes do agro