Buenos Aires (Argentina) - As chuvas não chegaram de forma tão regular na Argentina, o que acabou levando alguns produtores a migrar do milho para a soja neste início de temporada. Ainda assim, a produção do cereal deve voltar aos patamares recordes, na visão da principal consultoria agrícola do país vizinho, a AZ Group.

Em entrevista ao AgFeed, um dos cofundadores da empresa, Carlos Poullier, disse que a produção deve ultrapassar 50 milhões de toneladas, podendo chegar a 55 milhões de toneladas na safra 2023/2024. Se o volume se confirmar, seria um novo recorde para o país, que colheu 52 milhões de toneladas na safra 2020/21.

No ano passado, com a seca provocada pela La Niña, os argentinos tiveram a pior colheita da história. Foram produzidas em torno de 34 milhões de toneladas de milho. Desta vez, sob o efeito do El Niño, que costuma trazer mais chuva para a Argentina, as previsões seguem otimistas.

"Mas atrasou um pouco a chegada da chuva, o que fez alguns produtores desistirem do milho precoce, por isso estimamos que 75% da produção será de milho tardio, colhido em julho”, disse Poullier, que fez uma apresentação a jornalistas brasileiros durante uma visita à fábrica de biológicos da Basf em Santo Tomé, na Argentina.

Este fenômeno poderá trazer reflexos nos preços do milho ao longo do ano, à medida que o milho tardio argentino chegará ao mercado muito próximo da segunda safra do Brasil.

De qualquer forma, a expectativa é de aumento nas exportações de milho, que devem superar 35 milhões de toneladas em 2024, patamar próximo ao registrado na safra 2020/21, segundo a AZ Group.

Um dos fatores que será determinante para esse desempenho no mercado internacional é a possibilidade de que os atuais impostos sobre a exportação de creais sejam revistos pelo governo de Javier que acaba de tomar posse.

Em entrevista ao AgFeed, o secretário de Bioeconomia argentino, Fernando Villella, disse que as “retenciones” serão retiradas “no médio e longo prazo".

Carlos Poullier diz que o mercado também não acredita que a mudança ocorra já nos primeiros meses de 2024. No caso do milho, ao fechar um negócio de exportação, o produtor é taxado em 12% sobre o valor FOB, que vai direto para os cofres do governo.

"Um dos grandes problemas que o novo governo está enfrentando é que a Argentina tem um déficit fiscal muito grande. Mas, para reduzir o déficit, é preciso equilibrar a receita com a despesa. Atualmente, as despesas são muito maiores. Portanto, se você começar diminuindo as receitas, reduzindo os impostos, fica mais difícil. Achamos que nos primeiros meses dificilmente veremos mudança. Sim. Talvez para alguns produtos regionais, produtos menores. Mas para as grandes culturas como soja e milho talvez na última parte do ano comece a haver alguma melhora", avaliou o sócio da AZ Group.

Retomada no Complexo Soja

Na expectativa otimista dos argentinos também está a previsão de retomar o primeiro lugar no ranking dos exportadores globais de farelo de soja. Historicamente o país ocupava essa posição, mas perdeu no ano passado para o Brasil, em função forte quebra de safra.

Segundo a AZ Group, as chuvas chegaram bem no início da temporada da soja e a área plantada deve chegar a 17 milhões de hectares, um avanço em relação aos 16 milhões de hectares cultivados no ciclo anterior.

A produção estimada está próxima de 50 milhões de toneladas, ainda abaixo dos recordes já obtidos no passado de até 62 milhões de toneladas. O motivo é o fato de atualmente o país cultivar uma área menor, cerca de 17 milhões de hectares – a cultura perdeu espaço para o milho.

O desempenho das exportações também está em compasso de espera sobre as medidas do novo governo. A taxação da soja em grão é de 33% e do farelo e do óleo é de 31%. Mas segundo os analistas, um dos efeitos que mais prejudica o setor é taxa de câmbio.

"O que nós esperamos é que a taxa de câmbio que seja real, e não achatada artificialmente. Em relação aos impostos retidos na fonte, a mudança deveria ser gradual ao longo do tempo, mas deve haver um cronograma em que o governo anuncie que a partir de, por exemplo, setembro, vou começar a reduzi-los em um ponto a cada três meses. O importante é que haja um cronograma", afirmou Poullier.

Para as safras futuras, produtores e analistas também esperam ganhos de produtividade caso haja maior facilidade para o lançamento de novas tecnologias no país, principalmente em sementes.

"A Argentina não tem a possibilidade que o Brasil tem de continuar aumentando sua área planada, aqui se escolhe ou soja ou milho para o verão, mas podemos aumentar a produtividade, desde que a rentabilidade da cultura seja boa, já que o produtor é muito propenso a adotar tecnologias que melhorem o rendimento da lavoura”, destacou.

A produtividade média da soja na Argentina é de 3200kg/hectare e no milho de cerca de 8.000kg/ha.

No caso do trigo, segundo a AZ Group "a colheita será modesta, mas também maior do que no ano passado, em função de problemas com seca e geada".

A estimativa é produzir em torno de 15 milhões de toneladas, ante uma expectativa inicial era de 20 milhões de toneladas. As exportações são estimadas em 8 milhões de toneladas.

"Acreditamos que o Brasil este ano vai comprar bem mais trigo argentino, já que houve excesso de chuvas na região Sul”, acrescentou o analista.