Os produtores de soja estão se valendo da paciência – e do capital acumulado até agora - para conseguir maior lucratividade nas vendas da safra que já foi colhida e também da próxima que ainda nem foi plantada.
Com os preços em queda nos últimos meses, os níveis de comercialização da soja no Brasil estão em patamares historicamente baixos. Mas as contas a pagar devem reverter este cenário muito em breve, segundo analistas.
Um relatório da consultoria HedgePoint mostra que até o início de junho 57% da produção esperada para a safra 2022/2023 no Brasil já havia sido comercializada. O ritmo fica abaixo dos 66% registrados no mesmo mês da safra 2021/2022 e da média dos 5 anos anteriores, que é de 73%.
No caso da safra 2023/2024, que começa a ser plantada em setembro, as vendas antecipadas atingiram 8% da produção, ante 13% no mesmo período da safra anterior, e 18% na média de 5 anos.
Luiz Fernando Gutierrez Roque, analista sênior da consultoria Safras & Mercado, afirma que este patamar de comercialização da soja é um dos menores da história.
Mesmo assim, já é possível verificar uma leve aceleração nas vendas neste mês de junho. Em Mato Grosso, maior estado produtor de soja do Brasil, as vendas da safra 2022/2023 atingiram 72% neste início de junho, um avanço de mais de 6 pontos percentuais em relação a maio, ritmo mais acelerado do que no mês anterior. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira, 12 de junho, pelo Imea, Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária.
“Estamos vindo de duas safras em que o produtor conseguiu ótimas margens na venda da soja, chegando a 100% em alguns momentos. Por isso, estão capitalizados, e conseguem esperar mais por uma recuperação dos preços. Esta estratégia deu certo nos últimos anos, mas já está ficando difícil segurar mais”, diz Roque.
Esta dificuldade, segundo o analista, acontece porque o produtor tem contas a pagar, especialmente aquelas relacionadas à próxima safra. “Daqui a pouco já será necessário comprar insumos, por exemplo, para o início do plantio”, lembra Luiz Fernando, destacando que na safra anterior, a saca da soja chegou a valer até R$ 180, e neste ano, caiu para patamares próximos de R$ 110.
Ruan Sene, analista de mercado da startup Grão Direto, afirma que já é perceptível uma aceleração na comercialização. “Acredito que estes números vão avançar bastante daqui para a frente. O produtor esperava que os preços reagiriam em algum momento”.
O especialista da Grão Direto lembra que nos últimos anos, a pandemia e a deflagração da guerra entre Rússia e Ucrânia acabaram impulsionando os preços das commodities agrícolas em geral.
“Neste ano, apesar de ainda sentirmos os efeitos da guerra, há uma previsibilidade maior sobre a produção e a economia global. Isso vem pressionando os preços dos grãos”, afirma Sene.
Roque, da Safras & Mercado, também aponta a “esperança” na recuperação dos preços como um fator que mantém os índices atuais de vendas por parte dos produtores rurais em patamares historicamente baixos.
“Há uma expectativa no mercado que o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) reveja para baixo suas projeções de produção nos EUA no relatório de julho”, diz Roque, o que poderia trazer uma leve pressão de alta para a soja.
Ao mesmo tempo, ele aponta um fator que tem potencial de apagar os efeitos de uma eventual recuperação do preço da soja nos mercados internacionais para o produtor brasileiro. “É muito difícil de se projetar, mas já se fala em câmbio a R$ 4,80 no segundo semestre, ou menos. Longe do patamar de R$ 5 do começo do ano”, desta forma, o preço recebido pelo agricultor brasileiro em reais seguiria em queda.
Para a próxima safra, Roque acredita que teremos novo recorde de produção no Brasil. “A dúvida fica para o ritmo de crescimento da área de plantio. Isso vai depender do preço. Se as cotações da soja continuarem baixas, este ritmo de aumento da área deve ser menor”.