Depois de pagar preços 20% mais altos na última safra, a soja convencional vai perder espaço nas lavouras brasileiras devido à queda nos tradicionais “prêmios" pagos por compradores internacionais pelo produto não transgênico.
"No mercado spot praticamente não há prêmio neste momento, os valores elevados da última safra acabaram afastando os clientes, o que fez os preços caírem ", afirmou César Borges, recentemente reeleito presidente do Instituto Soja Livre, que fomenta o mercado de não transgênicos desde 2017.
Borges é conselheiro e sócio da Caramuru Alimentos, uma das maiores tradings do Brasil e que tradicionalmente exporta também soja e derivados não transgênicos.
Para negociações futuras, ainda é possível encontrar prêmios de US$ 5 por saca acima dos preços da Bolsa de Chicago, mas os altos estoques seguem desestimulando os produtores a plantar a soja convencional na próxima safra.
O Instituto Soja Livre ainda não fechou uma estimativa em nível nacional, mas é fato que haverá uma redução, que poderia chegar a 30%.
O estado de Mato Grosso, que responde por quase 50% da produção nacional, vai reduzir de 491,6 mil hectares para 332,8 mil hectares a área plantada com soja convencional na safra 2023/2024, de acordo com o Imea, Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária.
"Se conseguíssemos repetir a mesma área da safra passada no Brasil, seria excelente, mas já sabemos que é praticamente impossível compensar em outros estados esta redução que haverá em Mato Grosso”, afirmou César Borges.
A produtividade da soja convencional fica abaixo da transgênica – são cerca de 4 sacas a menos por hectare, em Mato Grosso. O custo foi estimado pelo Imea como 3,8% maior, se comparado a soja geneticamente modificada.
"Mas esperamos um ganho de produtividade nesta safra, porque as pesquisas têm avançado bastante com as variedades convencionais", afirmou o dirigente.
Apesar das dificuldades, César Borges confia que a demanda internacional siga crescendo, especialmente na Ásia, em função das conversas com o Japão e diz que a indústria de biotecnologia depende da soja convencional para continuar avançando na transgênica.
Por outro lado, admite que "é um setor desarranjado, onde cliente reclama que preço subiu muito e produtor fica descontente com a falta de regularidade”.
Em maio deste ano, Borges participou do primeiro International Non-GMO Summit, em Frankfurt, na Alemanha, onde foram discutidos estes desafios.
O plano agora é promover uma nova edição do evento no Brasil, entre janeiro e fevereiro do ano que vem, possivelmente em Brasília.
Ao mesmo tempo, César Borges vem tentando se aproximar de integrantes do atual governo, como por exemplo, a Apex, em busca de maior para ampliar o mercado da soja convencional. “Ainda não fui recebido pelo ministro Fávaro (da Agricultura), mas estamos buscando este diálogo”, disse.
Negociações com o Japão
Representantes do Instituto Soja Livre e da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT estiveram reunidos com a Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA) este mês para encaminhar um acordo que viabilize o aumento das importações de soja brasileira não transgênica.
Estima-se que a demanda japonesa seja de cerca de 230 mil toneladas por ano, sendo que cerca de 80% atualmente são importados dos Estados Unidos.
A JICA já está negociando com o Ministério da Agricultura um acordo para financiar a conversão de áreas de pastagens em lavouras, com previsão de subsidiar 1 milhão de hectares, na primeira etapa. Este acordo ainda tem pendências, já que os japoneses não querem participar apenas como financiadores, mas também acompanhar o projeto do ponto de vista técnico.
"Mas na nossa conversa ficou claro que os japoneses estão interessados em reduzir a dependência da soja convencional norte-americana para comprar mais do Brasil e essa é uma negociação que pode avançar independentemente da parceria que está sendo costurada entre os governos”, afirmou ao AgFeed o gerente executivo do Instituto Soja Livre, Eduardo Vaz, que participou da reunião recente.
Vaz afirma que os japoneses sugerem que, no prazo de 10 anos, poderiam substituir 100% do que importam dos EUA pela soja não transgênica brasileira.
As exportações brasileiras de soja convencional atingiram na safra passada 2 milhões de toneladas, cerca de 20% a mais do que no ano anterior. Já a produção ficou próxima de 3 milhões de toneladas.
Um possível acordo com o Japão é importante porque atualmente 90% das exportações têm como destino a Europa. E alguns países europeus começam a comprar de novos players como a Índia, que é mais barata, “embora seja uma qualidade inferior à do Brasil", diz Vaz.