Durante as últimas semanas, com a COP 30 de Belém surgindo no horizonte, uma série de iniciativas organizadas por instituições, universidades, empresas e lideranças do agronegócio acabou elevando o nível de discussão sobre o que o agro deve apresentar durante a conferência a ser realizada em novembro.
Até fevereiro, a mobilização do setor era tímida, restrita a poucas falas de lideranças ou estudiosos que alertavam para as oportunidades que se apresentariam. No caso da pecuária, até mesmo profissionais relacionados ao agro acabaram “comprando” a imagem negativa difundida pela competente máquina difusora de desinformações e conclusões falaciosas, embasadas em dados incompletos ou mal interpretados.
Por isso, até então, o cenário era assustador para quem acompanha o debate. A repetição intensa de propagandas negativas estava convencendo - até mesmo as pessoas treinadas - a negligenciar todos os avanços da pecuária brasileira.
A partir do início de março, essa aparente apatia foi dando espaço a uma mobilização proativa, focada na ciência especializada e nos casos de sucesso implementados a campo.
José Luiz Tejon, publicitário e referência no agro, tem insistido há anos que o setor precisa se mobilizar para mostrar ao mundo o que o país tem de bom em termos de produção.
Hoje, ao invés de tomar a frente no plano de comunicação, o agro tem apenas reagido aos ataques e desinformações que circulam em relação à produção.
Essa condição de estar sempre na defensiva reforça a recomendação do Tejon. É preciso haver uma mobilização para começar a pautar a discussão.
Profissionais oriundos da pecuária, dedicados a debates sobre sustentabilidade, parecem se intimidar diante do ambientalismo barulhento. Relutam em difundir as conquistas das últimas décadas, como se os avanços tivessem sido pequenos, incipientes. Ao se omitirem, acabam permitindo que prevaleçam as narrativas relacionando a pecuária ao atraso.
No entanto, os avanços não foram poucos. E o fechamento das estatísticas de 2024, um ano de recorde na pecuária, mostra um ganho ambiental ainda maior do que o mensurado até o ano anterior.
Com a produtividade da pecuária avançando 10,5% entre 2023 e 2024, o cálculo do efeito poupa terra, em relação à 1991, avançou 44% na comparação entre ambos os períodos.
O cálculo compara a produção de carne atual com a produtividade do período analisado. Se a produção total de carne bovina em 2024, estimada em 11,8 milhões de toneladas (formal + informal + consumo nas propriedades), fosse obtida com a produtividade de 1991, estimada em 21 kg de carcaça (carne com osso) por hectare, seriam necessários 562 milhões de hectares dedicados à pecuária.
Em 2024, a produtividade foi 250% superior à de 1991, o que permitiu garantir toda a oferta ocupando 160,5 milhões de hectares.
Foram poupados de desmatamento, portanto, 402 milhões de hectares.
Como o desempenho do último ano foi muito acima da média de anos anteriores, podemos refazer o cálculo considerando a média de 2021 a 2024 e a de 1991 a 1995. Nesse cenário, o efeito poupa terra é de 298 milhões de hectares. A produtividade dos últimos quatros anos foi, em média, 184% superior à dos primeiros anos da década de 1990.
O ambientalismo extremista não gosta desse cálculo, pois ofende suas narrativas. Uns dizem que o raciocínio é incorreto, mas nunca explicam as razões; outros citam números de pastagens que não condizem com o histórico censitário, assunto já tratado no artigo “A inverdade como método de imposição”, publicado em dezembro nesta coluna.
Por outro lado, o ambientalismo moderno visualiza as oportunidades e busca entender melhor os sistemas de produção. Vai lentamente se despindo das narrativas preconceituosas e abraçando soluções verdadeiramente revolucionárias.
O conceito é realmente difícil de entender, principalmente quando a produtividade média usada no cálculo do efeito poupa terra é comparada com os sistemas mais produtivos.
Entre os produtores pesquisados pelo Rally da Pecuária, os 5% mais produtivos atingem, em média, produtividade de 775 kg de carcaça por hectare ao ano. Com esse nível de eficiência, seria possível utilizar apenas 15 milhões de hectares para alcançar todo o recorde de produção observado em 2024.
Os números são grandes, assustadores e até difíceis de entender. Mas são reais e indicam caminhos que estão sendo trilhados pela pecuária de ponta.
Tem muita gente leiga, e influente, focada em descobrir e sugerir alternativas para a pecuária brasileira.
Estão atrasados, pois todo o caminho já foi identificado pela ciência especializada. E os produtores estão aplicando a campo, como permitem concluir os diversos estratos analisados no Rally da Pecuária.
Profissionais de outras áreas sempre serão bem-vindos na discussão sobre problemas e soluções para a pecuária. Mas precisam ter a disposição em conhecer o que já está sendo feito. Tem sido comum, em artigos publicados e conferências realizadas nos grandes centros, a descrição de uma pecuária que não corresponde à realidade.
Embora exista uma grande quantidade de produtores operando com técnicas da década de 1970 ou 1980, as fazendas modernas e mais produtivas respondem por cerca de 80% da carne que chega às prateleiras.
Os responsáveis por essa pecuária lotam eventos relacionados à reprodução, nutrição, manejo de pastagens, saúde e bem-estar animal, melhoramento genético, gestão, sistematização etc. E o nível técnico discutido nos congressos surpreenderia aqueles que hoje ocupam púlpitos para dizer que a pecuária brasileira precisa de transformação.
Estão totalmente errados. O desafio é a inclusão e não a transformação. Essa está em execução há décadas.
A necessidade de focar a discussão em pontos mais técnicos e embasados sobre a pecuária atenderia objetivos muito maiores do que o simples esclarecimento. É uma questão humanitária.
O ex-ministro Roberto Rodrigues, autoridade incontestável no agro, tem associado frequentemente os avanços do campo com a garantia da paz. Não é exagero.
A tecnologia desenvolvida no Brasil poderia ser exportada e implementada em diversas outras regiões do mundo tropical. Em alguns lugares com impactos menores, tendo em vista os desafios relacionados à topografia e disponibilidade de água; em outros lugares com possibilidade de implementar em grande escala, a exemplo da África Subsaariana.
Qual seria o impacto global de transformar uma região dessa em um novo cerrado brasileiro? Qual seria o resultado em qualidade de vida, geração de riquezas, disponibilidade de alimentos e redução de conflitos que sempre andam de mãos dadas com a miséria?
Grande parte das soluções dos maiores problemas do mundo estão a campo aqui no Brasil. Foram geradas pela ciência especializada e implementadas com a coragem do empresariado brasileiro. Basta replicar!
Mas para isso é preciso que os grandes influenciadores da agenda ambiental tenham a humildade de entender o que está sendo falado. Enquanto todo esse avanço revolucionário ocorre no campo, o ambientalismo atrasado prepara novas narrativas.
A moda do momento é se apresentar como orientador disposto a salvar o empresariado rural do que estão chamando de “agro suicídio”.
Associam o desmatamento ilegal a uma suposta política de expansão do agronegócio. É mais uma inovação dos mesmos criadores do termo pejorativo “ogro agro”, das cartas conjuntas denunciando a falta ciência na produção agropecuária e outras pechas sempre colocadas na mesa quando os argumentos não se garantem tecnicamente.
Há também os que buscam estudos na literatura de clima temperado para sugerir soluções para problemas já mitigados na agropecuária moderna brasileira. Não entenderam que a dinâmica da agropecuária tropical é muito diferente da temperada.
No ambiente tropical, não há produção economicamente viável sem investimentos na melhoria da qualidade do solo. Há décadas, os produtores modernos do Brasil vêm se adaptando aos objetivos técnicos que agora estão sendo classificados como agropecuária regenerativa.
Ironicamente, por desconhecimento da realidade das operações agrícolas e da dinâmica do uso de insumos, há sugestões apresentadas em estudos fora de contexto, cujos resultados trariam a queda na produtividade e aumento no uso de combustíveis fósseis na produção. É um contrassenso diante do tema em discussão.
O sucesso da posição do Brasil na COP 30 vai depender de como os assuntos serão tratados. O país tem a oportunidade de mostrar ao mundo que domina tecnologias para resolver problemas que vão além dos desafios das emissões de gases indesejáveis. Temos a tecnologia para resolver a fome, reduzir conflitos, enfraquecer ditaduras e gerar riquezas. E não se trata de promessas, visto que já está em execução.
Assim como aconteceu há alguns anos no agro, o ambientalismo precisa se desprender daquela mentalidade arcaica, combativa. É preciso separar aqueles realmente focados em soluções dos que estão conduzindo agendas caça níquel ou autopromocionais. O ambientalismo precisa começar a evoluir, assim como o agro vem fazendo.
A COP 30, no meio da Amazônia, é uma grande oportunidade para mostrar ao mundo o que o Brasil fez.
Lembra do cálculo do efeito poupa terra na pecuária? Se o mesmo raciocínio for feito somando todas as atividades de produção vegetal e animal - incluindo proteínas, grãos, energia, florestas plantadas, fruticultura, horticultura, café etc. - precisaríamos hoje de 936 milhões de hectares para alcançar a produção de 2024, caso continuássemos usando os mesmos pacotes tecnológicos do início dos anos 1990.
A área total do país soma 851 milhões de hectares!!
Não deixa de ser uma mensagem sensacional para quem está habituado com o sensacionalismo.
Maurício Palma Nogueira, engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária