Se um dos principais desafios dos agricultores é não ter controle sobre o clima, aprender a conviver com os efeitos climáticos torna-se essencial para a gestão do negócio.
Muitos produtores têm ido além, investindo em tecnologias que amenizam a dependência das chuvas e ainda tornam a atividade mais sustentável. O crescimento do uso de pivôs centrais para irrigação é prova disso. Levantamento realizado pela Embrapa mostra que há no Brasil 33.846 equipamentos instalados e cobrindo uma área de 2.200.960 hectares. Do ano passado para cá, houve um acréscimo de 140.842 hectares e 3.807 dispositivos. A tendência é que esse avanço continue.
Segundo o pesquisador da área de Agrometeorologia da Embrapa Milho e Sorgo, Daniel Guimarães, um dos responsáveis pelo estudo – também participou desse trabalho a pesquisadora da área de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto, Elena Charlotte Landa – a expansão da irrigação como um todo, na agricultura brasileira, deve-se à necessidade de o produtor ter mais segurança em relação a suas lavouras. Isso porque a demanda global por alimentos aumentou exponencialmente, e o custo da produção agrícola é cada vez mais alto.
“Se não adubar corretamente, há grandes perdas. Com as mudanças no clima e o inverno mais quente, pragas e doenças se proliferam mais rápido, o que exige sementes mais resistentes”, disse Guimarães. “Tudo isso demanda mais investimentos, e correr o risco de perder a produção por falta de chuva é muito prejudicial.”
Além disso, segundo o pesquisador, com a irrigação o agricultor controla melhor sua lavoura e consegue oferecer seus produtos quando está em falta e o mercado paga melhor, agregando valor à atividade.
“A agricultura brasileira é praticamente a única no mundo que trabalha com a maior parte em sequeiro. Quando há problemas climáticos, o produtor ganha pouco porque produz pouco. Quando o clima está bom, também ganha pouco porque há muito produto no mercado”, disse Guimarães.
A agricultura nacional tem 9,2 milhões de hectares irrigados, incluindo todos os sistemas. “É menos do que as áreas irrigadas de Irã e Paquistão, três vezes menor do que nos Estados Unidos e oito vezes menor do que se irriga na China e na Índia”, afirmou Guimarães, acrescentando que o Brasil tem de chegar a pelo menos 30 milhões de hectares irrigados. “E podemos fazer isso sem causar danos à natureza.”
É aí que entra o avanço dos sistemas de irrigação. O modelo por pivôs centrais, que hoje represente quase 24% do total das lavouras irrigadas, tem evoluído em precisão e transparência com agregação de tecnologia, e pode continuar ganhando espaço.
O consumo de água está entre os principais questionamentos sobre a sustentabilidade do agronegócio. A preocupação é legítima e, exatamente por isso, o setor tem se posicionado, com respostas amparadas por estudos e pesquisas que esclarecem o ciclo de utilização e recuperação dos recursos.
Com a evolução tecnológica, pivôs ganham em precisão, como já acontece na irrigação por gotejamento, garantindo que a água seja colocada exatamente onde é necessário e na quantidade certa.
Esse é um dos fatores que irrigam também o desempenho de fabricantes de pivôs. A Bauer Brasil, por exemplo, que está no país há 20 anos, tem acelerado sua expansão. “Nos últimos três anos, conseguimos crescer dez vezes”, afirmou o CEO da empresa, Rodrigo Parada. “Agora em 2024, mesmo com uma redução no mercado, conseguimos aumentar nosso faturamento em 25%.”
O executivo não revela dados financeiros, mas deixa clara a importância do segmento nos negócios da companhia, que além dos pivôs também atua com carreteis para irrigação, separadores de resíduos sólidos e energia solar.
“A irrigação representa 95% de nosso faturamento”, disse Parada. O também CEO da companhia, Luiz Roque – ele é responsável pelas áreas operacional, financeira e tecnológica, enquanto Parada responde pelos setores de vendas e marketing –, acrescenta que a Bauer tem se diferenciado pela oferta de soluções. “A gente não vende só o pivô, mas toda a gestão do projeto, a parte de construção civil e instalação”, afirmou.
O avanço na área das inovações tecnológicas se intensificou a partir de 2019, com a aquisição da startup Irricontrol. Entre as vantagens adicionadas a partir dessa nova fase, estão o monitoramento e a automação.
Além de ligar e desligar o equipamento à distância, também é possível fazer todo o controle hídrico da fazenda, acompanhando cada gota d’água retirada da fonte, o nível de armazenamento da água, a quantidade de água usada pelos pivôs, entre outros pontos.
Os pivôs são equipados com pluviômetro, que mensuram o volume de chuva e gerenciam a irrigação de acordo com esse índice, compensando o que ainda faltar para as lavouras ou interrompendo o fornecimento hídrico se houver água suficiente. “Usar mais água, irrigar mais, não quer dizer necessariamente produzir mais. É preciso utilizar de forma correta”, disse Parada.
A Bauer atende projetos de 2 hectares até mais de 300 hectares, e o custo médio gira em torno de R$ 25 mil a R$ 30 mil por hectare. Sobre os mercados com maior potencial de expansão da irrigação por pivô, Parada diz sem titubear: “Matopiba”. Segundo o executivo, Bahia e Maranhão são os estados de apresentam potencial de crescimento mais imediato, enquanto no Piauí deve acontecer mais no médio e longo prazos. Assim como no Pará, que não faz parte do Matopiba.
Os resultados do estudo da Embrapa confirmam a visão do CEO da Bauer. De acordo com o acompanhamento, na comparação entre polos de irrigação, entre mesorregiões, o extremo oeste baiano passou a ser a localização com mais irrigação por pivô no Brasil, superando o noroeste mineiro. “Minas Gerais ainda é o estado mais irrigante. Mas com o avanço na região oeste, a Bahia já aparece em segundo lugar, à frente de Goiás”, afirmou Guimarães.
A expansão baiana deve-se em grande parte às condições topográficas, à disponibilidade do Aquífero Urucuia, ao armazenamento da água para irrigação em tanques de geomembrana e às facilidades de implantação dos empreendimentos. Esse cenário favorece o crescimento da produção de grãos na oeste da Bahia.
De acordo com a Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), na safra 2024/2025, o plantio da soja, principal cultura da região, deve crescer 7,5%, passando de 2,1 milhões de hectares, com produtividade média de 67 sacas por hectare. O milho tende a recuar 8,9%, somando 123 mil hectares, devido principalmente à queda de preços. Já o sorgo ganhou destaque no levantamento da Aiba, com expectativa de crescimento em 6,7% e área de plantio estimada em 160 mil hectares.
Ainda pesa sobre essas estimativas o desafio do clima, sobretudo a combinação de altas temperaturas com a irregularidade das chuvas, que tem impacto direto sobre o desenvolvimento das lavouras.
Entrando um pouco mais nos detalhes do estudo da Embrapa, São Desidério, na Bahia, está no topo da lista dos municípios com maior área irrigada por pivô, somando 91.687 hectares. Na sequência, aparecem os municípios mineiros de Paracatu (88.889 hectares) e Unaí (81.246 hectares); Cristalina, em Goiás (69.579 hectares; e fechando os top five está Barreiras, também na Bahia (60.9199 hectares).
Apesar de todo o avanço tecnológico no segmento de irrigação por pivôs, garantindo mais precisão e transparência em relação à utilização da água, ainda é enorme a preocupação com a preservação dos recursos hídricos.
“Temos 12% da água do mundo e os melhores aquíferos, embora estejam entrando em depressão”, disse Guimarães. “É preciso um conjunto de ações para equilibrar uso e abastecimento.”
Segundo o pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo, está em andamento outro estudo, este sobre os corpos de água do Brasil, levantamento que ajudará a planejar o uso integrado de atividades produtivas, elevando o nível de sustentabilidade do agronegócio.
“Se as represas de água para irrigação fossem utilizadas em conjunto com a produção de peixes, por exemplo, abasteceríamos muito melhor a demanda global de pescados”, afirmou.