Faz três meses que os preços da pecuária não param de crescer, e isso acontece em todas as categorias de animais – bois, fêmeas e reposição. Esta é a constatação do levantamento feito por pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, e divulgado na última quinta-feira, 14 de novembro.

Para se ter ideia, nesta data o preço médio da arroba no mercado paulista, uma referência para o País, estava em R$ 340. O indicador Cepea/B3 fechou a R$ 339,60, no dia 13, alta de 6,6% no mês.

Há exatos três meses, em 14 de agosto, esse valor estava em R$ 234,20, o que representa uma valorização de 45% no período.

O momento é favorável para todos os players da cadeia produtiva de carne bovina, desde as áreas de cria, recria e engorda, passando pela indústria e chegando ao consumidor final, dentro e fora do Brasil. Aliás, aí está um ponto crucial para a manutenção do cenário positivo: a demanda.

“O mercado interno responde por 70% do consumo e subiu com intensidade por conta do preço, em comparação ao ano passado e ao do frango”, afirmou o gerente da Consultoria Agro do Itaú BBA, Cesar Castro.

Houve também uma sinergia do preço convidativo da carne bovina nos últimos meses com os índices macroeconômicos do País.

“Segundo nossa equipe de macroeconomia, a taxa de desemprego deve ser de 6,9% ao final do ano e a renda do brasileiro está crescendo acima da inflação, o que representa maior poder de compra”, disse Castro.

A carne bovina, assim como os produtos lácteos, é um alimento altamente sensível à evolução do poder aquisitivo da população. Quando o poder de compra aumenta, o reflexo no consumo é imediato.

Tanto que o varejo já começou a se preparar com a formação de estoques para abastecer a demanda de dezembro, que sempre aumenta por conta tanto pelas festas quanto das férias.

Apetite estrangeiro

Os importadores também estão famintos pela carne bovina brasileira. As exportações dos frigoríficos, somando carne in natura e processada, cresceram 5% entre outubro e setembro deste ano, e 42% na comparação com outubro de 2023, conforme a Secex/MDIC.

Os pesquisadores do Cepea informam que, de janeiro a outubro de 2024, foram negociadas 2,397 milhões de toneladas, volume 29% maior do que o exportado em igual período de 2023. Em faturamento, essas exportações renderam mais de US$ 10,5 bilhões (a carne in natura representou 91% do total), 22,6% a mais do que nos dez primeiros meses de 2023.

Os chineses estão na linha de frente de toda essa negociação, pois compram cerca de 50% de toda a carne exportada pelo Brasil. Entre janeiro e outubro deste ano, a China importou mais de 1 milhão de toneladas de carne brasileira, 12% a mais do que em igual período de 2023, e pagou US$ 4,8 bilhões, conforme dados do Cepea.

O preço médio pago pelo gigante asiático nesses dez meses foi 9% menor do que o registrado entre janeiro e outubro do ano passado, no entanto, houve aumento de 4% do valor na comparação entre outubro e setembro.

A carne bovina brasileira também vem ganhando mercado em outros países, como os Estados Unidos, que dobraram as negociações com o Brasil do ano passado para cá; os países árabes, como Emirados Árabes Unidos e Arábia saudita; além de Turquia e Filipinas.

Ciclo pecuário

Cesar Castro afirma que este é um bom momento para toda a cadeia produtiva de carne bovina. “O humor da pecuária mudou muito nos últimos dois meses”, afirmou.

Segundo ele, o cenário otimista deve continuar nos próximos dois anos, mantendo a onda de melhoria do mercado, com evolução de preços. “Estamos muito otimistas com o cenário de exportações, até porque os Estados Unidos devem diminuir sua produção. Devemos continuar bem no mercado.”
Porém, a pecuária vive de ciclos, e é preciso se preparar para lidar com os fatores que influenciarão esse quadro daqui para frente. Hoje, está todo mundo com boa rentabilidade. “Os frigoríficos há mais tempo, enquanto os pecuaristas estão chegando agora nesse patamar”, disse Castro.

A virada do ciclo pecuário é o ponto de atenção. Agora, a elevação do preço do boi gordo naturalmente levou junto a cotação dos bezerros, que ainda tem espaço para valorização.

O preço médio em torno de R$ 2.500 pode evoluir – vale recordar que em abril de 2021 o pico do preço de bezerro chegou a R$ 3.800 (considerando valores atuais).

O problema é quando a cotação do bezerro segue em ascensão e o do boi gordo começa a cair, relação que gera significativo aumento do custo de produção.

Em fevereiro, mesmo com a retomada de muitos pastos, a produção de bezerros pode não ser proporcional a essa maior oferta de comida, pois ainda haverá impacto da redução do rebanho de fêmeas.

No caso do boi gordo, a alta de preços pode ser afetada, pois parte do salto que se vê agora na cotação vem da arroba da redução na formação de pastagens, devido à forte estiagem em muitas regiões do Brasil.

Em relação aos confinamentos, com a alta do preço do milho, todo mundo que vier na cadeia depois da fase de cria deverá ter um custo maior. Travar as negociações com um preço melhor no mercado futuro pode ser uma boa saída.

Para o especialista do Itaú BBA, ainda que a perspectiva para os próximos dois anos seja positiva, 2025 tende a ser um ano menos favorável do que 2024, porque agora está excelente. “É um movimento surpreendente, ninguém imaginava essa guinada sem parar desde setembro”, disse.

E 2026 será um pouco mais difícil do que 2025. As consequências dessa mudança de ritmo chegarão também ao consumidor final. “Por enquanto, a elevação dos preços está no atacado, não chegou tanto ao varejo. Mas tende a ir aumentando”, disse Castro.

Nessa época de festas de fim de ano, a elevação de preços pode ser absorvida pelos consumidores de maneira mais natural, até por toda a efervescência comercial. No entanto, em janeiro, quando vier a ressaca desse período e as contas tomarem o lugar das festividades, o consumo de carne bovina pode ser afetado.

“A relação de preços entre as diferentes proteínas já voltou ao patamar mais favorável à carne de frango. O período de carne bovina barata para o consumidor final já passou”, afirmou Castro.