Nos últimos anos, uma das maiores fabricantes de equipamentos de irrigação no mundo, a Bauer, se acostumou a crescer dois dígitos no Brasil, com a procura crescente por tecnologias que ajudem a enfrentar as mudanças climáticas.

O aumento de 30% nas vendas em 2024, por exemplo, destoava dos resultados negativos que o setor de máquinas e equipamentos agrícolas vinha registrando.

Agora, porém, em tempos de juros bem mais elevados e crédito cada vez mais restrito, nem a Bauer escapou das dificuldades para viabilizar os investimentos nas fazendas brasileiras.

Em entrevista ao AgFeed, Luiz Alberto Roque, co-CEO da Bauer na América Latina, disse que a previsão esse ano é apenas “empatar” com as vendas de 2024.

O principal problema, ele explica, é a taxa de juros elevada, inclusive nas linhas do Plano Safra. Os investimentos em irrigação envolvem valores mais altos. Um pivô, por exemplo, de 100 hectares, custa em torno de R$ 1,2 milhão. Por isso, o crédito usado nesse tipo de compra é aquele de prazo mais longo para pagar.

“Nós tivemos esse ano um Plano Safra que saiu de uma taxa de 10,5%, no ano passado, para 12,5%. Então o aumento é muito expressivo. Quando se fala em 12,5% e você vai financiar isso em 10 anos, é realmente uma taxa bem alta. Hoje não é, mas em 10 anos é muito alta”, afirmou Roque.

Neste cenário, a Bauer foi buscar uma solução no mercado de capitais. A empresa está lançando um CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) no valor de R$ 100 milhões, em parceria com o Itaú BBA.

Segundo a empresa, esse é o primeiro CRA no País voltado exclusivamente à irrigação. “A gente decidiu fazer isso em conjunto com o Itaú, justamente para conseguir destravar muitos negócios, acelerar um pouco o mercado, que vem aí numa busca por um capital que consiga caber dentro do bolso”, explicou.

O diferencial desse produto é que se trata de um CRA em dólar. Se a operação fosse em reais, por meio de um FIDC, por exemplo, ferramenta que já vem sendo utilizada no setor de máquinas, Roque lembra que a taxa de juros seria sempre “CDI mais alguma coisa”, ou seja, acima de 15% ao ano.

“Ele é um CRA referenciado na moeda americana. Então, o cliente vai pagar por volta de 8,5% (ao ano) mais a variação cambial. O grande desafio nosso vai ser desmistificar operações em dólar”, admitiu.

Como argumento, a Bauer pretende lembrar especialmente aos produtores de soja de que a commodity já é dolarizada. “Com o incremento da safra de soja que a irrigação traz, ele consegue pagar as parcelas, basicamente já fazendo um auto hedge. Ele já fica, de certa forma, blindado com relação a variação cambial, porque o grão que ele está vendendo é precificado em dólar”.

Ao utilizar o financiamento via CRA da Bauer, para comprar um equipamento de irrigação, o cliente terá que pagar um sinal de 10% e, para o restante, terá um período de carência entre 1 ano e meio e 2 anos. O prazo total é de 4 anos.

“Com o período de carência, ele (cliente) vai conseguir performar pelo menos duas, três safras no equipamento, no pivô, onde nós vamos ter duas modalidades. Ele vai garantir através do veículo de uma CPR, onde é atrelada, ou a uma alienação fiduciária da terra ou do equipamento”, disse o co-CEO da empresa.

O fato de colocar o equipamento como garantia, segundo ele, também ajuda a abrir portas junto a clientes que plantam via arrendamentos. O ticket por CPF será de até R$ 8 milhões, acima de linhas tradicionais do Plano Safra para a irrigação, que hoje contemplam R$ 3,5 milhões.

Ao longo de 2025, a Bauer já vinha apostando nas operações de barter para vender seus equipamentos “em troca pelo grão”. A expectativa é que, agora, com a CPR financeira, no lugar da física, haja maior interesse e flexibilidade para os envolvidos.

O CRA não será uma oferta pública, ficará vinculado a um fundo do Itaú, em que o banco tem participação de 70% como investidor primário e a Bauer entra com 30%.

Segundo Luiz Roque, no ano passado, por exemplo, o setor conseguiu acessar só menos da metade do que foi anunciado no Plano Safra.

Ele acredita que o uso do mercado de capitais vai a ajudar a empresa a ter mais competitividade e já recuperar vendas nos dois últimos meses do ano, embora esse seja um período com foco na safrinha de milho. As vendas para a safra de soja são feitas antes do plantio, que já está começando esse mês.

“Aceleramos para finalizar tudo em setembro, justamente ligando o nosso último trimestre, que, historicamente, já é um trimestre mais fraco, porque existe a sazonalidade. O nosso trimestre mais forte é o terceiro”.

Um dos aspectos que também teria prejudicado o ano da Bauer, segundo Roque, foi o período de ajustes na rede de distribuidores, que deixou temporariamente algumas regiões sem atendimento.

Em julho, como mostrou o AgFeed, a Bauer fechou parceria com a Maqcampo, com sede em Brasília, que se tornou revendedora exclusiva da marca. Agora, a expectativa é expandir as vendas na região do Matopiba.

Com a nova parceria e a ferramenta do CRA, Luiz Roque está otimista para 2026. “Podemos voltar a imprimir um bom crescimento de novo na casa dos 15%, 20%. Essa é a perspectiva”.

Se tudo der certo, o plano é avançar com outros instrumentos financeiros via mercado de capitais ou mesmo expandir o CRA que que está sendo lançado agora, ele garante.

“Eu acredito muito que, a gente ajustando bem feito, o mercado de capitais vai ser a grande porta para financiar o nosso setor”.

Resumo

  • Bauer e Itaú BBA lançam CRA de R$ 100 milhões, primeiro do Brasil voltado à irrigação, com crédito em dólar e até 2 anos de carência.
  • Produtores terão financiamento a 8,5% ao ano + variação cambial, com CPR ou alienação fiduciária como garantia
  • Objetivo é destravar investimentos no agro, ampliar acesso ao crédito e recuperar crescimento em meio a juros altos no Plano Safra