Com um pé no mercado imobiliário e outro nas lavouras, a BrasilAgro não ficou totalmente imune às oscilações vindas dos dois mundos onde circula ao mesmo tempo.
A companhia apresentou resultados mais fracos no fechamento do terceiro trimestre do ano-safra de 2025 (correspondente ao período entre os meses de janeiro e março passados), com um prejuízo líquido de R$ 1,093 milhão no período. Há um ano, no entanto, o resultado havia sido pior: prejuízo de R$ 30,1 milhões.
A BrasilAgro considera o mês de julho como referência para o início de um novo período fiscal, com término em junho do ano seguinte.
O Ebitda ajustado (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) ficou também negativo desta vez, em R$ 5 milhões, ante resultado positivo de R$ 5,6 milhões no terceiro trimestre do ano-safra 2024. A margem Ebitda ficou negativa em 2%, contra um resultado positivo em 4% no mesmo período do ano passado.
Já a receita líquida total cresceu 69%, passando de R$ 132 milhões no terceiro trimestre do ano-safra 2024 para R$ 224,9 milhões. Nos nove primeiros meses do ano-safra 2025, os ganhos foram de R$ 870,5 milhões, ante R$ 553,3 milhões em 2024.
O resultado negativo se explica, segundo Gustavo Lopez, diretor financeiro e de relações com investidores da companhia, em entrevista a jornalistas, pelos problemas de produtividade da soja – a BrasilAgro teve uma produção projetada de 216,1 mil toneladas, volume 14% abaixo do que havia sido estimado inicialmente.
A companhia registrou problemas climáticos que atrapalharam o momento da colheita, entre fevereiro e março, com a seca comprometendo a produtividade da oleaginosa nas lavouras localizadas na Bahia e o excesso de chuvas atrapalhando a qualidade em áreas de Mato Grosso – um problema que a BrasilAgro já havia relatado na divulgação dos resultados do segundo trimestre, em fevereiro.
A quantidade vendida foi até maior no período – 60,5 mil toneladas neste terceiro trimestre, contra 48 mil toneladas no mesmo período do ano anterior – mas a qualidade do produto final foi menor. Com isso, segundo Lopez, houve muito desconto na hora de comercializar o produto, derrubando a margem.
"A saca de soja está mais ou menos R$ 120 no mercado, mas vendemos a saca por cerca de R$ 90 porque ela não estava em boa qualidade", afirma o diretor financeiro da BrasilAgro. "Como a gente não tinha mais cana-de-açúcar para vender nesse trimestre, a soja destruiu um pouco o resultado", acrescentou Lopez.
André Guillaumon, CEO da companhia, atentou também para mudanças no comportamento de prêmios, que é a diferença do preço pago pela soja em um porto no Brasil em relação à referência internacional
Ele afirmou que os prêmios estavam positivos entre janeiro e fevereiro por conta do atraso da colheita e a expectativa era de que eles ficassem negativos entre março e abril, entre -20 e -30 pontos. “Março e abril já operou com +20, +30, ou seja, houve uma reversão importante”, disse.
A companhia continuou, então, com sua estratégia, que já é conhecida, de carregar estoques da soja que colheu para serem comercializados mais adiante – ainda que o CEO lembre que exista a possibilidade de mudanças na dinâmica de prêmio pelo excesso de oferta. "Estamos carregando R$ 150 milhões a mais de soja para o segundo semestre", disse Guillaumon.
Comercialização
Em contrapartida, aproveitando os bons preços do milho, a BrasilAgro acelerou as vendas do grão no período recente. “A gente tentou acelerar ao máximo o que a gente pode vender de milho nos últimos meses. Temos uma comercialização avançada, já na casa dos 60%, e tem ainda 40% que vamos entrar para comercializar assim que tivermos os indicativos de safrinha", afirmou Guillaumon.
A expectativa é de que o próximo e último trimestre do ano-safra traga resultados positivos. Depois de colher a soja, as principais culturas em desenvolvimento são o milho e o algodão.
“Tivemos um mês de abril bastante chuvoso de modo geral e isso beneficiou muito a safra e a safrinha, principalmente as safrinhas de algodão, soja e feijão”, disse Guillaumon.
Ainda que tenha havido uma queda de 34% na safra do algodão em relação ao que havia sido projetado anteriormente, passando de 31,1 mil toneladas para 20,5 mil toneladas, o executivo disse que a expectativa para esse cultivo é positiva.
“O algodão safrinha está se desenvolvendo bem em Mato Grosso. Temos feito um grande esforço para aumentar o percentual de algodão em relação aos demais cultivos irrigados e pivô, que também está vindo bem”, disse Guillaumon.
O CEO da BrasilAgro disse que houve frustração em apenas uma unidade, a Fazenda Chaparral, em Correntina (BA), especialmente no algodão de sequeiro, sob efeito de uma seca entre fevereiro e março que durou cerca de 35 dias na região. “Ainda assim, mantemos uma expectativa positiva para o cultivo como um todo e os resultados até agora têm sido satisfatórios”, disse Guillaumon.
Sobre a cana-de-açúcar, Guillaumon disse que a colheita já começou e que a expectativa de redução de produção no cultivo em geral deve sustentar os preços de açúcar, que vinham caindo nos últimos anos, e mantendo o etanol em preços “bastante interessantes”. A BrasilAgro projeta produzir 2,2 milhões de toneladas de cana, crescimento de 8% em relação à safra anterior.
Pressão de custos
A escalada da taxa Selic, que voltou a subir ao longo do último ano, chegando a 14,25%, foi um ponto de atenção mencionado pelo diretor financeiro da BrasilAgro, Gustavo Lopez.
"A gente trabalha com mais ou menos 30% do capital de giro com financiamento quando os juros estão mais ou menos em torno de 10%", explica Lopez, lembrando que a expectativa da empresa no passado era de que a Selic ficasse na faixa dos 9% entre 2025 e 2026.
Só que, ao comparar os primeiros nove meses do ano passado com o mesmo período deste ano, Lopez diz que o custo financeiro da companhia saltou de uma faixa de R$ 25 milhões a 30 milhões para R$ 45 milhões. “Esse efeito dos juros vai doer na margem. Vamos ter o desafio de continuar tendo a companhia pouco alavancada para tentar surfar um pouco melhor”, diz o diretor financeiro.
Uma das estratégias da companhia, segundo Guillaumon, é o controle de fluxo da caixa, especialmente nos estoques.
“Nossa primeira disciplina foi casar investimento ou despesa com receita. A gente usa muito a expressão ‘comprar da mão pra boca’. Com a logística de uma empresa desse tamanho, não consigo comprar em setembro um insumo para comprar em outubro. Mas podemos comprar em agosto, por exemplo”, afirma o executivo.
Outra estratégia, emendou Guillaumon, é ter uma postura mais agressiva nas estratégias de captação de working capital. "É aquela história: o banco vai emprestar pra nós um juro mais barato, e com garantias, ou vai tomar um risco num juro mais caro?”
Oportunidades no lado imobiliário
Se, por um lado, o aspecto financeiro desafia a BrasilAgro, por outro Guillaumon avalia que o momento atual mais restritivo gera oportunidades no lado imobiliário.
"O Brasil teve uma expansão agrícola forte nos últimos anos, feita em parte com capital próprio e em parte com endividamento", disse o presidente da BrasilAgro. "E nesse ponto do endividamento, acontece o que a gente sempre vem falando: 'É a hora de a onça beber água'. É a hora de empresas como a nossa, com a disciplina financeira que temos, se aproveitarem disso", emendou.
Guillaumon diz que há possibilidades na região agrícola do Matopiba, que abrange os estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Ele argumenta que esse é um caso de fronteira agrícola onde houve grande expansão nos últimos anos, acompanhada também de alavancagem.
“O produtor de Rondonópolis [cidade de Mato Grosso], por exemplo, alavancou muito pouco, porque não teve expansão nos últimos anos. Já o produtor do Maranhão e do Piauí teve expansão e esse cara se alavancou. Então, começa a aparecer oportunidade de estresse financeiro nessas regiões”, disse.
A BrasilAgro também busca oportunidades de compra e arrendamento de terras no Paraguai, para onde Guillaumon vai viajar no fim desta semana. A empresa já possui 58,7 mil hectares no país vizinho ao Brasil. "Estamos muito otimistas que ainda tem terras boas por lá", disse o presidente da BrasilAgro.
Ele salientou também que a BrasilAgro deve se direcionar, nos próximos anos, como uma empresa mais compradora do que vendedora – mas isso não quer dizer que deixe de vender totalmente fazendas.
“A Bahia, por exemplo, ainda tem uma liquidez corrente boa por altitude, por projeto de irrigação, por busca de novos cultivares. Eu diria que isso vai perdurar e vai continuar acontecendo. Não temos a mesma situação em Mato Grosso, por exemplo.”
Resumo
- BrasilAgro teve prejuízo líquido de R$ 1,09 milhão no terceiro trimestre do ano-safra 2025
- Companhia acelerou a venda de milho nos últimos meses e estocou soja para comercialização no segundo semestre, esperando margens melhores
- Alta da taxa Selic aumentou o custo financeiro da operação da companhia ao longo do último ano