O mercado de fertilizantes não tem trégua. Desde a interrupção no fornecimento de algumas matérias-primas para a produção de adubos durante a pandemia, os agricultores de todo o mundo têm sido obrigados a conviver com a instabilidade de oferta e preços, que são cruciais na formação das margens de suas lavouras.

Neste ano, por exemplo, os produtores brasileiros vinham buscando nos chamados superfosfatados simples (SSP) uma alternativa mais em conta para substituir o MAP (adubo que fornece nitrogênio e fósforo para as plantas), que teve altas expressivas de cotação nos últimos meses.

Somente de janeiro a novembro de 2025, por exemplo, o Brasil importou cerca de 3 milhões de toneladas de SSP, cerca de 20% mais do que no mesmo período do ano passado, segundo dados da StoneX.

Mas uma decisão anunciada nesta terça-feira, 16 de dezembro, pela gigante americana Mosaic pode indicar que essa pode estar deixando de ser uma opção viável.

A filial brasileira da companhia informou que suspendeu temporariamente, a produção de SSP em duas de suas unidades no País – uma em Araxá (MG) e outra em Paranaguá (PR). E indicou que a razão dessa paralisação seria “adotar cautela em relação ao recente aumento nos preços do enxofre”.

A medida surpreendeu analistas que acompanham o mercado de fertilizantes, que passaram o dia tentando dimensionar seus impactos. Mas a sua explicação condiz com o que acontece no mercado global de um dos principais insumos para a produção dessa categoria de fertilizantes.

Há menos de uma semana, a Argus, uma das mais importantes empresas globais de análise do mercado de commodities, havia publicado um estudo em que “promovia” o enxofre de “um subproduto de baixa volatilidade do refino de petróleo e gás” para um componente de risco, com tendência altista, para as cadeias de produção de fertilizantes – e, consequentemente, para a agricultura global.

Segundo a Argus, os preços do enxofre têm sido pressionados pelo descompasso entre o ritmo de crescimento de demanda e a capacidade de ampliação de produção do enxofre. Com isso, somente este ano a cotação da tonelada do produto, que costumava variar entre US $ 80 e US$ 180, saltou para próximo da casa dos US$ 500 (preços FOB para Oriente Médio).

“O grande ponto do enxofre é que ele é um subproduto, que depende de ter uma maior capacidade de refino, que não cresce na mesma proporção que você cresce a demanda por fertilizantes, que cresce a indústria de metais e que cresce a indústria de baterias”, explica Gisele Augusto, analista de fertilizantes da Argus.

“Você não tem só a cadeia de fertilizantes consumindo esse produto, mas uma Indonésia, por exemplo, muito forte na indústria de metais também demandando muito enxofre, e também a China, que além de ter uma demanda muito grande para metais, usa muito para baterias de carros elétricos. Então, são três mercados que crescem em uma velocidade muito rápida”.

De outro lado, a da oferta, o baixo ritmo de investimentos no aumento da capacidade de refino de petróleo e problemas geopolíticos, como a guerra na Ucrânia, não apenas limitou o crescimento, como trouxe riscos de redução na disponibilidade do produto.

Assim, as chances de alívio nesse segmento são pequenas no curto prazo, “até que se encontre uma solução para esse descompasso”, avalia Gisele.

No caso específico brasileiro, a surpresa, de acordo com a analista, deveu-se ao fato de a Mosaic ter sido a primeira – e até agora a única – a tomar a medida. “O mercado, de maneira geral, em nenhum momento sinalizou que esperava uma parada de produção. Esperava-se o aumento dos preços no mercado interno, mas não uma parada de produção”, diz ela.

Gisele lembra também que a Mosaic, por sua origem, tem mais facilidade de trazer enxofre dos Estados Unidos, o que reduziria o risco geopolítico e tornaria a decisão também mais inesperada.

Os dados da Argus confirmam a tendência de crescimento de vendas de SSP nos últimos meses indicada pela StoneX. De agosto até outubro, a comercialização ultrapassou, segundo Gisele, um milhão de toneladas.

“Diante dos preços elevados do MAP, durante todo 2025 o brasileiro começou a olhar com mais atenção e mais cuidado para o custo-benefício do SSP”, afirma Tomás Pernías, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.

“Essa notícia certamente não é algo positivo para os compradores”, reforça ele, usando dados para explicar um possível reflexo de uma paralisação mais prolongada, caso aconteça, das fábricas da Mosaic.

Segundo ele, a capacidade das plantas com as linhas suspensas corresponde a praticamente 18% da capacidade produtiva doméstica de SSP no Brasil, o que, nas suas palavras, “não é algo trivial”.

“É uma quantidade importante de SSP que pode deixar de ser produzida caso a empresa realmente prossiga com essa estratégia”, avalia. “Supondo que nós teríamos que repor esse produto que deixaria de ser produzido, poderíamos estar falando até de um aumento de mais de 20% das nossas importações”.

A preocupação com a decisão da Mosaic existe, mas tem atenuantes pelo momento em que foi tomada. Segundo Pernías, “não estamos em alta temporada de compra de fosfatados, então o impacto nesse momento tende a ser um tanto limitado”.

“Nesse momento, o mercado brasileiro está muito mais concentrado e focado nas importações, consumo e estoque de nitrogenados, dada a aproximação da safrinha”, analisa.

Gisele Augusto, da Argus, lembra também que boa parte do aumento das vendas nos últimos meses foi impulsionada pelas encomendas antecipadas do SSP já para a safra 2026/2027.

“É produto que ainda não foi entregue no mercado. Então, o impacto acaba ficando um pouco mais cadenciado do que seria se a Mosaic não tivesse vendido nada ainda para essa safra ou se a gente estivesse falando de uma safra que está com compras atrasadas”.

Ainda assim, mesmo com uma retomada da produção pela multinacional americana, o alerta fica evidente em relação ao preço. Até quando a indústria de fertilizantes vai segurar repasses da alta do enxofre para os seus produtos é uma pergunta que vale muitos milhões.

Resumo

  • A Mosaic suspendeu temporariamente a produção de SSP em unidades de MG e PR, citando cautela diante da forte alta do enxofre, insumo-chave dos fosfatados
  • O preço do enxofre saltou para perto de US$ 500/t, pressionado por demanda crescente de fertilizantes, metais e baterias, e oferta limitada no refino
  • A paralisação afeta cerca de 18% da capacidade doméstica de SSP e pode elevar importações e preços, apesar do impacto imediato ser limitado pela sazonalidade