A recuperação judicial do grupo Montesanto Tavares, uma das maiores exportadoras de café do País, voltou a andar na Justiça.

Em uma decisão publicada nesta quarta-feira, 8 de outubro de 2025, o juiz Murilo Silvio de Abreu, da 2ª Vara Empresarial de Belo Horizonte, determinou que o processo siga adiante, mesmo sem uma definição sobre a inclusão dos adiantamentos sobre contratos de câmbio (ACCs).

Esse é o principal ponto de conflito entre a empresa e os bancos credores dentro do processo de pouco mais de R$ 2 bilhões em dívidas.

Na prática, o juiz mandou os administradores judiciais, Paoli e Balbino & Barros Sociedades de Advogados e a Credibilita Administração Judicial a publicar o edital que abre prazo para os credores confirmarem ou contestarem os valores devidos. Essa etapa estava parada desde agosto, quando a discussão sobre os ACCs travou o caso.

Essas operações, comuns entre exportadores, são uma espécie de empréstimo antecipado em dólar feito pelos bancos, que depois é quitado com o recebimento das exportações. Normalmente esses créditos ficam fora da recuperação judicial, mas no caso da Montesanto Tavares o imbróglio se dá pois há dúvidas se parte deles perdeu o vínculo com exportações reais — o que poderia torná-los dívidas comuns.

Na Montesanto Tavares, a confusão com os ACCs começou ainda em 2021, quando uma quebra na safra de café impediu muitos produtores de entregar o produto que já havia sido “vendido” para exportação. Para honrar esses contratos, as tradings do grupo — Atlântica e Cafebras — precisaram comprar café no mercado à vista, a preços muito mais altos.

Como o caixa não era suficiente, a empresa recorreu aos próprios ACCs, que são operações em dólar normalmente usadas para financiar exportações já contratadas. Só que, ao invés de utilizar o crédito para embarques futuros, o dinheiro foi usado para recomprar o café e cobrir os contratos não entregues.

Na visão dos bancos, esses adiantamentos continuam sendo dívidas ligadas às exportações e, portanto, não deveriam entrar na recuperação judicial. Já a Montesanto Tavares argumenta que parte desses ACCs perdeu o vínculo com as operações de venda ao exterior, já que o café original nunca foi embarcado, e que, portanto, deveriam ser tratados como dívidas comuns.

De acordo com o exposto no pedido de RJ, esses compromissos com derivativos pelas tradings do grupo eram de R$ 50 milhões em maio de 2024, ou 74% da receita a receber com café embarcado. Mas saltaram para R$ 470 milhões em novembro de 2024, ou 158% da receita com o café embarcado. O desequilíbrio levou o grupo a recorrer à Justiça em fevereiro deste ano.

A Justiça de Minas já havia permitido, de forma provisória, que esses valores fossem incluídos na RJ, o que provocou reações dos bancos. O Banco do Brasil é o principal credor, com R$ 742 milhões da dívida, seguido por Santander, Bradesco, BTG Pactual, Itaú, Banco do Nordeste, Banco Pine e pela trading Cargill.

Em agosto, o juiz pediu um laudo técnico para avaliar o caso, mas diante da falta de consenso, decidiu agora seguir com o processo enquanto o impasse é analisado.

O juiz reconheceu que o conflito entre credores e empresa se agravou e tornou inviável uma solução consensual. “Diante da escalada (desnecessária) do conflito nos presentes autos, no tocante aos ACCs, é preciso pontuar e decidir o que segue”, escreveu o magistrado.

Segundo o despacho, a intenção do juiz foi resolver o litígio dos ACCs a partir de uma “Constatação Técnica Aprofundada”, citando um “respeito ao contraditório e à ampla defesa dos credores, de forma equilibrada e amistosa, para evitar que o processo se arrastasse desnecessariamente”.

Como o impasse sobre os ACCs vinha travando o andamento do processo desde agosto, o juiz decidiu que não poderia mais deixar a recuperação parada e precisava avançar com as próximas etapas.

Mas, como o próprio magistrado observou, “infelizmente, isto acabou não sendo possível”. Mesmo com o laudo técnico, nenhum acordo aconteceu, e o juiz ainda disse ser preciso que “os autos dessa RJ prossigam”.

Agora, o grupo entra na fase de verificação de créditos, quando os credores conferem ou contestam os valores declarados pela empresa. Em seguida, o processo seguirá para a assembleia geral de credores, que votará o plano de reestruturação. Outras questões pendentes, como o pedido de consolidação do grupo, serão analisadas posteriormente.

 

Resumo

  • Justiça determina retomada da recuperação judicial da Montesanto Tavares, mesmo sem definição sobre inclusão de R$ 470 milhões em ACCs na reestruturação de dívidas.
  • mpasse com bancos sobre adiantamentos em dólar travava o processo desde agosto; Banco do Brasil lidera lista de credores com R$ 742 milhões.
  • Próximas etapas incluem verificação de créditos pelos credores e assembleia para votação do plano de reestruturação do grupo de café.