Indaiatuba (SP) - Enquanto a tempestade do mercado de máquinas não passa, a John Deere já vislumbra o mercado ensolarado, com uma atenção muito especial ao Brasil. A multinacional americana prevê que de 5 a 10 anos, o Brasil ultrapasse a Europa e se torne seu segundo maior mercado.
A perspectiva positiva é ancorada em projeções favoráveis ao agro brasileiro. A demanda pelo milho é impulsionada pelos mercados de biocombustíveis, como etanol e SAF, e, na soja, a perspectiva de conversão de áreas de pastagem pode aumentar em milhões de hectares o cultivo da oleaginosa por aqui.
Nos cálculos da fabricante, a área cultivada com grãos deve crescer 27% nos próximos 10 anos, o que deve aumentar a área agrícola de 10% para 13% de todo o território brasileiro. A John Deere estima que serão convertidos outros 50 milhões de acres, ou 20 milhões de hectares de terras degradadas em produtivas.
Para mostrar a animação com o País, a companhia fez, pela primeira vez desde 2014, seu encontro anual com investidores globais, o Investor Day, em terras nacionais.
Em Indaiatuba (SP), mais precisamente em seu centro de pesquisa e desenvolvimento inaugurado em 2024, a companhia reuniu sua direção global, incluindo o CEO, John May, e o CFO, Josh Jepsen, cerca de 40 investidores de todas as partes do mundo e poucos jornalistas.
May fez a fala inicial do Investor Day aos presentes. Ele chegou animado e esperava contagiar, com o sentimento, os investidores.
“A razão por estarmos aqui envolve nossa estratégia industrial, alocando capital em áreas que podemos destravar valor para os clientes. Pretendemos continuar a expansão na próxima década e espero que, ao final da apresentação, vocês cheguem à mesma conclusão que tenho: não existe ninguém mais bem posicionado que a John Deere para gerar um valor diferenciado na agricultura” resumiu.
Criada há 188 anos nos EUA, a empresa está no Brasil desde 1999, ou seja, está completando bodas de prata por aqui.
Em conversa com o AgFeed, o CFO global, Josh Jepsen, e o vice-presidente de Sistemas de Produção da John Deere para a América Latina, Cristiano Correia, explicaram o porquê de trazer o evento anual da empresa para o País, além de detalhar mais como pretendem crescer no Brasil.
Apesar de atuar na direção global, Jepsen já conhece o Brasil há muito tempo. Depois de entrar na John Deere como estagiário em 1999, virou auditor em 2001, e estima que viajou 12 vezes para cá em apenas três anos na época.
“Foi muito importante para entender o que é o agro no Brasil e foi assim que conheci Cristiano [Correia], por isso o meu sotaque gaúcho”, brincou, falando um ótimo português, sem nenhum “gauchês”, mas que ainda entrega o sotaque de estrangeiro.
“Nosso último investor day no Brasil foi em 2014. O agro era diferente, e as vendas eram a metade dos patamares atuais. E por que fazer esse evento aqui? Existe uma oportunidade enorme para o Brasil no agro, que está cada vez mais importante na nossa estratégia”, disse.
Segundo Correia, as oportunidades para crescimento no Brasil são variadas, tanto em culturas quanto em regiões e até em porte do produtor. Ele cita que o País tem características que são próximas ao visto na Europa e também nos Estados Unidos.
“No Sul do Brasil temos propriedades menores, além de culturas de alto valor agregado, similares à Europa. No Cerrado, vemos um mercado mais parecido, do ponto de vista de máquinas, com o meio oeste americano”, explica.
Nos últimos cinco anos, a empresa investiu R$ 3,3 bilhões no País. A sede do Investor Day, o centro de inovação de Indaiatuba, por exemplo, custou R$ 180 milhões. O último grande investimento da empresa anunciado por aqui foi a expansão da fábrica de Catalão (GO), de cerca de R$ 700 milhões.
Cristiano Correia cita boas oportunidades em culturas já consagradas na operação da John Deere por aqui, como milho, soja, cana, algodão e também citou hortifruti e pecuária. “É difícil falar uma só, é como escolher o filho preferido”.
Além do aspecto mais básico da operação, que é vender tratores e colheitadeiras para as concessionárias, a John Deere quer aumentar as vendas de tecnologias separadas de máquinas, sejam para retrofit (atualizações) ou para conectar máquinas de outras marcas.
Josh Jepsen cita que a demanda por automação é a maior dos produtores. “Eles demandam conectividade e uma máquina capaz de tomar decisões. O cliente quer essa tecnologia, e ele consegue tanto via uma máquina nova quanto pelo kit de agricultura de precisão”, disse.
“Queremos mais market share. Seja das máquinas que já existem e que queremos seguir crescendo em hectares, mas também com mais tecnologia John Deere”, resumiu o CFO.
Nos cálculos da empresa, o mercado de máquinas conectadas deve crescer 2,5 vezes até 2030, atingindo 200 mil máquinas. Na parceria com a Starlink, a John Deere citou que nos últimos seis meses foram vendidas cerca de 4 mil unidades do JD Link Boost, seu sistema via satélite que conecta a equipamentos novos e já existentes, que coleta dados das máquinas em tempo real e os transmite para a nuvem.
A companhia ainda citou que hoje existem 27 milhões de hectares conectados em seu Operation Center, o software de gestão de fazendas da empresa. A meta é crescer para 40 milhões de hectares nos próximos anos.
A ideia de trazer estrangeiros de diversos países para o Brasil também tem um viés educativo. Na visão de Jepsen, uma coisa é ver o balanço e entender que o Brasil é representativo na operação e saber que o país é um grande exportador de commodities, outra é colocar o pé no barro e conhecer a operação in loco.
A programação dos investidores inclui, além do Investor Day, visitas a clientes próximos de Indaiatuba.
Questionados se essa “apresentação” do agro brasileiro para os investidores estrangeiros tem objetivo de facilitar novos investimentos no País nos próximos anos, os executivos não entraram em detalhes, mas disseram que “seguirão investindo no mercado”.
Enquanto esse futuro de avanço não chega, o último balanço mostrou pelo menos um cenário melhor no Brasil do que em outros países. A John Deere projeta que a comercialização fique estável na América do Sul e na Ásia. Nos EUA e Canadá, a projeção é de cair 30%, e na Europa, 6% em 2025.
O lucro líquido da companhia recuou 24% no segundo trimestre fiscal do ano 2025, passando de US$ 2,3 bilhões há um ano para US$ 1,8 bilhão. A receita com vendas também caiu 18%, passando de US$ 13,6 bilhões para US$ 11,1 bilhões.
Resumo
- John Deere realiza Investor Day no Brasil pela primeira vez desde 2014, reunindo direção global e 40 investidores em Indaiatuba (SP)
- Empresa vê potencial para o Brasil se tornar seu segundo maior mercado global em até 10 anos, ultrapassando a Europa
- Multinacional projeta crescimento de 2,5 vezes no número de máquinas conectadas até 2030, chegando a 200 mil unidades no País