Quando a área plantada com milho segunda safra começou a crescer em taxas muito acima da média histórica, muitos passaram a afirmar que o milho “era a nova soja” – não apenas pela oferta, mas também pela demanda crescente, quando o Brasil começou a exportar para a China.
Se depender do empresário paranaense Willian Sawa, o País vai ver uma nova transformação, desta vez a partir do sorgo, que pode ser “o novo milho”. Ele criou em 2017 a Latina Seeds, empresa que hoje tem 70% do faturamento relacionado a venda de sementes de sorgo.
A empresa tem atuação no Brasil e Paraguai e já está exportando para outros países da América Latina, além da África. A sede fica em Foz do Iguaçu (PR).
O motivo do otimismo são as pesquisas que indicam alta competitividade do cereal para novos usos, não apenas para aqueles já conhecidos, como na ração animal.
Uma das promessas é a produção de etanol de sorgo pelas usinas que já produzem o biocombustível a partir do milho – que não param de crescer no Brasil, nos últimos anos. Gigantes do segmento, como Raízen e Inpasa, já desenvolvem projetos com o uso do grão.
Em entrevista ao AgFeed, Sawa, diretor executivo da Latina Seeds, comentou sobre um dos projetos que acompanhou de perto, da Cooperativa Pindorama, no estado de Alagoas.
Trata-se de uma usina flex, que já usava cana-de-açúcar e milho para fazer etanol, mas que desde dezembro do ano passado adaptou seus equipamentos e passou a produzir também o biocombustível a partir do sorgo.
A empresa do Nordeste disse que o objetivo era melhorar as margens do negócio, devido aos preços altos e as instabilidades do milho no mercado internacional, mas sem perder qualidade.
“Baseado no Padrão de Combustíveis Renováveis (RFS2), o grão de sorgo foi aprovado como matéria-prima alternativa para produção de etanol devido às suas práticas de cultivo sustentáveis e ao percentual favorável de evasão de emissões de gases de efeito estufa", informou a cooperativa ao detalhar o projeto.
Os especialistas também ressaltaram que o grão de sorgo é cultivado principalmente em solos semiáridos e áreas secas ao redor do mundo, onde a precipitação anual é menor que 900 mm. Em função de seu tempo relativamente curto de crescimento, o cereal é adequado para ser cultivado como segunda safra e também nos sistemas de rotação de cultura.
O grupo Inpasa, considerado o maior produtor de etanol de milho da América Latina, também dá sinais de estar aderindo à tendência. Em comunicado divulgado na internet, em novembro do ano passado, a empresa anunciou “estar recebendo sorgo da safra 2024 em Mato Grosso do Sul”. O recado era para que o produtor rural interessados entregasse o produto em julho de 2024 na unidade de Dourados.
A Inpasa anunciou investimentos de R$ 2,2 bilhões na nova fábrica de Sidrolândia-MS e, no seu comunicado, fala que o etanol de milho “passa a ser chamado etanol de cereais”. Na nova fábrica, o recebimento de sorgo vai ocorrer a partir de novembro deste ano, segundo o texto.
Novas aplicações do sorgo
A Latina Seeds foi uma das principais articuladoras na criação do chamado “Movimento Mais Sorgo”, em 2022, que hoje conta com o apoio da Embrapa e já teve divulgação internacional. O projeto foi apresentado na Conferência Mundial do Sorgo, em junho de 2023, na França.
“Agora estamos em processo final de contratos entre a Latina Seeds e a Embrapa para que seja aberto um edital. Vamos convocar a sociedade agrícola brasileira a fazer parte do movimento mais sorgo em prol do crescimento do uso dessa cultura”, afirmou Sawa.
O sorgo já é bastante conhecido como grão e como matéria-prima para ração ou silagem. Mas a partir destas iniciativas, a empresa conseguiu não apenas o apoio de quem está interessado em produzir etanol, mas também em outras aplicações.
“Estamos por viver um apagão energético no Brasil de fonte de madeira pra queimar, o cavaco que é usado na queima em caldeira, por isso já estamos trabalhando com um de nossos sorgos uma biomassa gigante, como opção para complementar o cavaco de madeira na queima”, alertou o diretor.
Sawa disse há um projeto em andamento com a Raízen, por meio de um cultivo de 200 hectares de sorgo, já realizado no ano passado e que vai ser repetido em 2024. “Outras empresas estão testando, como uma cooperativa em Mato Grosso do Sul, uma de calcário no Ceará, além de Goiás e Rio Grande do Norte”.
As apostas no sorgo não param por aí. O executivo conta que o movimento também vai estimular o consumo do sorgo na alimentação humana. “Ele não tem glúten, quem é celíaco pode consumir farinha de sorgo, é muito usada na África”, ressaltou.
Mercado em alta e a busca de um sócio
O cultivo de sorgo também é recomendado em momentos que a janela do milho segunda safra fica muito apertada – como ocorre este ano, ao mesmo tempo em que a rentabilidade do milho foi reduzida.
Neste cenário, combinado com as novas demandas da indústria, o cultivo no Brasil vem crescendo, segundo Sawa.
Ele explica que os dados do IBGE não batem com as estimativas do Movimento mais Sorgo porque o instituto só contabiliza o que é grão e passa por armazéns. O sorgo que vira silagem, que é usado como cultura de cobertura ou que é queimado nas caldeiras não entra na estatística.
O diretor da Latina Seeds diz que a safra 2023/2024 de sorgo deve contabilizar uma área plantada de 2,4 milhões de hectares. Para o próximo ciclo, ele estima que o total ultrapasse 3 milhões de hectares. Nesta conta estão as áreas de grão para os diferentes usos.
Ele explica que um dos desafios do Movimento Mais Sorgo é organizar a cadeia, aproximar os diferentes elos. “No Rio Grande do Sul, por exemplo, tem indústria de ração querendo o cereal, mas ainda não tem quem produz”.
Sawa disse que, no evento da França, o grupo se comprometeu a buscar uma área plantada de 5 milhões de hectares até 2026, quando haverá uma nova conferência global, desta vez no Texas, nos Estados Unidos.
Agora a Latina Seeds procura um investidor ou “um sócio”, como disse Sawa, para alavancar seu crescimento e dar conta desta demanda crescente.
Ele não revela o faturamento da empresa nem a produção total em sacas de semente. Apenas confirma que o crescimento “está em linha com o mercado, que avança entre 20% e 30% ao ano”.
“Estamos ganhando um espaço dentro do mercado nos posicionando como especialistas em sorgos, este é nosso grande reconhecimento”, afirmou.
O empresário diz que neste momento estão fazendo a estruturação final do portfólio e que “o próximo passo será fazer captação de recursos e buscar um sócio, que possa nos ajudar a crescer”. Alcançar uma produção superior a 300 mil sacas de sementes é algo factível para o empresário, mas ele prefere não revelar qual seria o investimento necessário para chegar neste tamanho.
A empresa tem foco em melhoramento genético, produção e distribuição de sementes. Possui híbridos próprios e também atua com parceiros. Além do sorgo, oferece também sementes de milho, um mercado que enfraqueceu este ano devido à menor área plantada. E pretende lançar em 2025 sementes de girassol, segundo Sawa.
Quando criou a empresa, viu principalmente a necessidade da pecuária em relação ao sorgo. Como, diferentemente do milho, no sorgo ainda não há biotecnologia de multinacionais, a tarefa era fazer o melhor desenvolvimento genético nas sementes deste cereal.
“Pouco se falava em trazer uma silagem de menor custo para a pecuária e maior adaptação a altas temperaturas, stress hídrico e tolerante a pragas”, diz.
O executivo garante que já consegue atender todo o Brasil, com vendas diretamente ao produtor e também aos distribuidores. E ressalta “um grande fluxo internacional”, com expectativa de aumentar as exportações.
Um dos destaques do portfólio é o chamado “sorgão gigante” que a Latina diz ter desenvolvido juntamente com um empresário boliviano.
Solução para pastagens degradadas
A Latina Seeds prepara mais uma novidade para 2024 que é o possível lançamento oficial do chamado “Sistema Diamantino”, que consiste no consórcio de sorgo com girassol para produzir silagem e melhorar a qualidade das pastagens.
Willian Sawa explicou que o uso do sorgo para renovar pastagens reduz muito o custo e vem sendo trabalhado em parceria com a Embrapa de Dourados.
Ele lembrou que no Centro-Oeste a temporada de inseminação das fêmeas, entre novembro e dezembro, muitas vezes tem a taxa de prenhez prejudicada em função do inverno seco, que oferece pouco pasto para os rebanhos.
“Estamos criando uma silagem altamente energética para estes animais, será quase como o Movimento Mais Sorgo, uma tendencia de mercado”, contou.
Para renovar pastagens, segundo o executivo, muitas vezes o retorno demora mais de 3 anos, já que é necessário adubar, aplicar sementes, até que haja a recuperação e os animais se beneficiem.
“No sistema diamantino é um retorno de 8 meses, porque colocamos, junto com o capim, o sorgão gigante, que logo em seguida é colhido, podendo virar silagem ou ser comercializado no mercado”, explicou.
Além disso, segundo ele, o produtor pode colocar mais animais por hectare na área, em função desse pasto rotacionado.
As pesquisas em campo começaram em 2021 e já houve a primeira colheita em 2022. Segundo Sawa, agora o projeto está em fase de validação junto à Embrapa de Dourados.
“Haverá uma colheita em março e no mês de agosto já completaremos dois anos de pesquisa, com todas as métricas agronômicas, por isso pretendemos lançar o sistema em setembro”, anunciou.