No apagar das luzes de 2022, Cosan, conglomerado controlado pelo empresário Rubens Ometto, e Itaú Unibanco, celebraram um acordo bilionário. Na ocasião, o banco fez um aporte de R$ 4,115 bilhões na Raízen, companhia com foco no setor sucroenergético e de distribuição de combustíveis, que tem a Cosan como sócia ao lado da Shell.

O investimento foi feito de forma indireta: a instituição adquiriu, na verdade, ações preferenciais da Cosan Nove, braço da Cosan através do qual Ometto detém 39% do capital e atua no bloco de controle da Raízen, então uma das suas principais apostas.

De lá para cá, o clima mudou na Cosan e na Raízen. Com altos índices de endividamento, as duas empresas passam por processos de encolhimento e redução da alavancagem - e já não estão tão atraentes aos olhos dos investidores.

Um dos maiores deles, o próprio Itaú Unibanco, acaba de reduzir pela metade sua exposição ao negócio. Em um comunicado publicado nesta terça-feira, 2 de abril, a Cosan anunciou que vez um cheque de R$ 2,169 bilhões para recomprar 50% ações preferenciais emitidas há pouco mais de dois anos pela Cosan Nove.

A operação foi anunciada em fato relevante divulgado tanto pela Cosan como pela Raízen.

“A companhia ressalta que a operação em questão não afeta os direitos políticos da Cosan, conforme estabelecido no acordo de acionistas firmado com a Shell, o qual permanece inalterado”, informa o texto.

Há pouco mais de um mês, o diretor presidente da Cosan, Marcelo Martins, deixou claro que havia uma “uma mudança de estratégia e clareza no movimento” da companhia “com redução gradual, constante, desejável no endividamento para chegar a zero”.

O executivo citou que a companhia e a Raízen terão de diminuir de tamanho com venda de ativos e que buscarão parceiros para diminuir a alavancagem.

Além da operação desta terça-feira, 1 de abril, a estratégia da Cosan passa pela redução nas dívidas, com a emissão de novos títulos e a recompra dos papéis emitidos no passado.

Em março, a Cosan informou ter iniciado um programa de aquisição de até R$ 2 bilhões em debêntures não conversíveis em ações emitidas em duas séries.

Operações em série

Com R$ 9,1 bilhões captados com a venda, em janeiro, de 4,05% em ações que tinha na Vale, a Cosan iniciou as operações de recompra de dívidas no Brasil e no exterior com três resgates antecipados de títulos naquele mês..

O primeiro foi o programa de resgate antecipado e voluntário de R$ 850 milhões de um total de R$ 2 bilhões em debêntures emitidas em julho de 2021.

A operação foi seguida pela recompra antecipada de US$ 392 milhões em bonds com vencimento em janeiro de 2027 e de US$ 900 milhões de senior notes emitidas para vencimento entre 2029 e 2031.

Após sofrer com a alta nos juros e com pagamento de dividendos para subsidiárias, a Cosan reportou prejuízo líquido de R$ 9,297 bilhões no quarto trimestre de 2024, entre outubro de dezembro de 2024, ante lucro de R$ 2,362 bilhões obtido no mesmo período de 2023.

O resultado no 4T24 trouxe impacto direto no resultado do ano, com prejuízo acumulado de R$ 9,424 bilhões, revertendo lucro de R$ 1,094 bilhão em 2023.

A dívida líquida da Cosan chegou a R$ 23,5 bilhões ao final do ano passado, ante R$ 22,9 bilhões no 4T23 e R$ 21,7 bilhões no terceiro trimestre de 2024..

Em conferência com analistas após os resultados, Marcelo Martins disse que é possível baixar “o máximo possível” o endividamento e “assumir compromisso de reduzir uns 30% nos próximos meses”, com a venda de um “pool de ativos que eventualmente vai nos permitir chegar nesse número”.

Raízen

Sem o caixa com as ações da Vale, na Raízen o esforço para reduzir o endividamento de R$ 38,59 bilhões registrado ao final de 2024 ainda é tímido.

O processo, até agora, se resumiu à recompra de títulos denominados 5,300% Notes, emitidos com vencimento em 2027, somando um total de US$ 342 milhões.

Em fevereiro, em conferência sobre o balanço do terceiro trimestre do ano-safra 2024/2025 (3T25), executivos da Raízen anunciaram um novo ciclo para a companhia, focado no congelamento de investimentos previstos para o etanol de segunda geração (E2G), na revisão do portfólio de ativos com desinvestimentos e na suspensão do pagamento de dividendos para acionistas.

A Raízen encerrou o período, em 31 de dezembro de 2024, com prejuízo líquido de R$ 2,57 bilhões, ante lucro de R$ 793 milhões no mesmo período de 2023/2024. A receita líquida foi de R$ 66,87 bilhões, alta de R$ 14,3%, e a dívida líquida da empresa, de R$ 38,59 bilhões, cresceu 22,5% em um ano, com a alavancagem saindo de 1,9 vez para 3 vezes.

À época, Rafael Bergman, CFO e diretor de relações com investidores da Raízen, deu detalhes sobre o rearranjo financeiro e operacional da empresa, a começar pelo prosseguimento da venda de ativos.

“Temos bons ativos no portfólio e vamos buscar um bom valor para eles em 2025 e 2026, que será no início da jornada”, disse.

Segundo Bergman, dos investimentos previstos em E2G, de 20 unidades produtoras de etanol celulósico até 2030, apenas quatro novas plantas estão garantidas.

Duas estão em processo de comissionamento - em Barra Bonita (SP) e Valparaíso (SP) - e devem entrar em operação em breve. Outras duas, em Morro Agudo (SP) e Andradina (SP), estão em processo de construção em diferentes estágios e devem consumir R$ 1,6 bilhão em capex.

“A gente reconhece que não é o momento de iniciar novos projetos. É o momento de digerir o portfólio e tomar decisões de desinvestimentos de ativos”, completou o CFO e diretor de relações com investidores da Raízen. “É um ciclo que não comporta dividendos e outras formas de distribuição para acionistas”.